Cirilo de Alexandria
Artigo Mauricio Berwald
Fonte Wikipédia.
Cirilo de Alexandria (ca. 375 ou 378 — 444) foi o Patriarca de Alexandria
quando a cidade estava no auge de sua influência e poder no Império Romano. Um
dos Padres gregos, Cirilo escreveu extensivamente e foi protagonista nas
controvérsias cristológicas do final do século IV e do século V. Foi uma figura
central no Primeiro Concílio de Éfeso, em 431, que levou à deposição do
patriarca Nestório de Constantinopla. Ele é listado entre os Pais e os Doutores
da Igreja, e, por sua reputação no mundo cristão, é conhecido como "Pilar
da Fé" e "Selo de Todos os Pais". Entretanto, os bispos
nestorianos no Segundo Concílio de Éfeso o declararam herético, rotulando-o
como um "monstro, nascido e criado para a destruição da Igreja".
Biografia
Cirilo nasceu por volta de 375 ou 378 em uma vila chamada
"Didusja"[3] (em copta) e "Teodósio" (em grego), segundo
João de Nikiu, provavelmente a moderna El-Mahalla El-Kubra ou nas proximidades.
Porém autores posteriores, especialmente gregos, apontam Alexandria como sua
cidade natal, o que várias fontes modernas corroboram.] Sua mãe seria natural
de Mênfis e passou algum tempo em conventos em Alexandria antes de se casar.
Educação
Em 385 Teófilo assumiu a posição de Patriarca de Alexandria.Ele era tio
de Cirilo[nt 1] e cuidou da educação de seu sobrinho em Alexandria. Cirilo
recebeu uma educação clássica e teológica provavelmente estudando gramática
entre os doze e quatorze anos de idade (390-392), retórica e humanidades dos
quinze aos vinte e, por fim, teologia e estudos bíblicos entre 398 e 402.
Provavelmente entrou em contato com os autores que influenciariam sua exegese
nesse último período. Entre suas leituras, se destacam Atanásio, Orígenes,
Clemente de Alexandria, Basílio de Cesareia,[8] Eusébio de Cesareia, Dídimo, o
Cego e até mesmo João Crisóstomo, a quem viria a citar extensivamente apesar do
Sínodo do Carvalho, que o depôs. Outra influência relevante foi Isidoro de
Pelúsio, importante líder nos círculos monásticos do Egito, dezoito anos mais
velho que Cirilo. Embora a relação entre os dois ainda precise ser clarificada,
Isidoro escrevia-lhe frequentemente, geralmente em um tom crítico de
surpreendente franqueza para um clérigo provincial, embora não houvesse sinal
de ressentimento entre os dois. Por isso, cogita-se que Isidoro seria um
conselheiro respeitado por Cirilo e talvez tenha sido mentor do futuro
patriarca.
Se Cirilo foi a mesma pessoa citada por Isidoro, então ele viveu um tempo
como monge.[7] Segundo Gibbon, Cirilo teria passado cinco anos de sua juventude
nos mosteiros da Nítria até Teófilo chamá-lo à cidade.[8] Uma carta de Isidoro
em que ele reclama do excesso de "interesses mundanos" de Cirilo,
contrários ao ideal da busca da solidão, também é utilizada para sustentar essa
tese. Entretanto, não é certo que Cirilo tenha passado pela vida monástica. O
fato de nunca mencionar este suposto fato ao escrever para monges egípcios, já
como arcebispo em Alexandria, é considerado surpreendente (um argumentum e
silentio). Severo de Antioquia tinha dúvidas sobre essa tradição enquanto Ibn
al Muqaffa a defende, mas cita Serapião, o Sábio, como mentor de Cirilo ao
invés de Isidoro, mas é considerado uma fonte pouco confiável. McGuckin cogita
que, afinal, Cirilo tenha passado algum tempo em mosteiros como parte de sua
educação para a vida eclesiástica, dada a importância dessas instituições para
o cristianismo egípcio à época.
Início da carreira eclesiástica e Sínodo do Carvalho
Em 403, com aproximadamente vinte e cinco anos, Cirilo terminou seus
estudos e foi ordenado leitor da igreja alexandrina ao lado de seu tio
patriarca. A partir daí, ascendeu a cargos eclesiásticos mais altos, mas
provavelmente já estava ligado às esferas superiores da Igreja de Alexandria
desde o começo da carreira. McGuckin lembra que, à época do Concílio de Éfeso,
Nestório havia ocupado o trono em Constantinopla por apenas um ano enquanto
Cirilo já teria vinte e cinco anos de contato e experiência com a política da
Igreja no nível mais alto, o que pode ter sido decisivo para o resultado do
concílio.
No mesmo ano, Cirilo acompanhou Teófilo ao Sínodo do Carvalho, realizado
em Calcedônia, e que resultou na deposição de São João Crisóstomo do
Patriarcado de Constantinopla Teófilo teve um papel central na deposição,
um posicionamento que causou atrito com Roma, que exigia a reabilitação de
João, e abalou as relações entre as duas sés até os primeiros anos do
patriarcado de Cirilo.
Durante o patriarcado do tio, Cirilo apoiou a deposição de João
Crisóstomo e, no início de seu patriarcado, rejeitou a restauração do nome de
Crisóstomo nas comemorações em Constantinopla e Antioquia. Entretanto, desde
por volta de 417, o patriarca alexandrino começou uma longa e diplomática
reabilitação de João, abandonando aos poucos a posição de Teófilo e adotando a
sua própria, reduzindo o desconforto da Cúria Romana. Crisóstomo foi
posteriormente muito citado nos sermões de Cirilo, que o considerava um exemplo
de ortodoxia. Não se sabe, porém, se esta reabilitação levou à restauração do
nome de João aos dípticos da igreja alexandrina. Tampouco conhecemos com
certeza com que intensidade Cirilo respeitava João: enquanto João de Nikiu
afirma que o patriarca o considerava um "professor" e restaurou sua
honra com "grande alegria", Nestório afirma que Cirilo venerava as
relíquias de João Crisóstomo relutantemente. McGuckin cogita que a resposta
está entre esses extremos.
Início do Patriarcado de Alexandria
Teófilo faleceu em 15 de outubro de 412. O patriarcado foi disputado,
então, entre Cirilo e o arcediago Timóteo, que era, segundo McGuckin, o
favorito de Constantinopla Da disputa, evoluiu um tumulto, resultado do
conflito entre os defensores de cada um dos candidatos.] Embora Timóteo tivesse
o apoio de Abundâncio, o comandante das tropas romanas no Egito, Cirilo venceu:
foi feito patriarca em 18 de outubro, três dias depois da morte de Teófilo, com
o apoio do povo.
À época, o patriarcado de Alexandria já era poderoso, uma ascensão que
remontava à época de Atanásio e devia muito ao controle que tinha sobre as
hordas de monges armados chamados parabolani. O patriarca conseguia impor-se
ante a corte imperial e seu poder rivalizava até com o do prefeito da cidade.
Assim, o novo patriarca passou a exercer mais funções que seu antecessor, assumindo
a administração de questões seculares e outras que estavam sob a autoridade do
prefeito civil. Segundo Gibbon, liderados por Cirilo, os parabolani controlavam
os programas de caridade e os prefeitos egípcios temiam sua influência.[2] À
época, Alexandria, habitada por judeus, pagãos e cristãos, era conhecida pela
instabilidade e, segundo Sócrates de Constantinopla, nenhuma outra cidade era
mais propensa a tumultos, sempre violentos.
Expulsão dos Novacianos
Cirilo fechou as comunidades dos novacianos e tomou seus objetos sacros.
Os novacianos eram a seita dos seguidores do antipapa Novaciano que
separaram-se da Igreja basicamente porque acreditavam que os cristãos que
apostataram durante a perseguição de Décio (os lapsi) não podiam ser perdoados
e nem readmitidos. Entretanto, suas práticas condiziam com a dos cristãos em
quase todos os demais aspectos, e Gibbon os descreve como "os mais
inocentes e inofensivos dos sectários".] Segundo Sócrates, o bispo
novaciano Teopempto teve também suas posses confiscadas.
Conflito com Orestes e a comunidade judaica
A comunidade judaica de Alexandria era grande - Gibbon cita 40 000
pessoas[2] na época de Cirilo - e tradicional. Presentes na cidade desde sua
fundação sete séculos antes, eram bem sucedidos e protegidos pela lei secular.
Sócrates Escolástico conta que, durante uma deliberação sobre alguma
festividade dos judeus, eles acusaram um monge Hierax, um exaltado seguidor de
Cirilo, de incitar tumulto entre os presentes. Orestes, o prefeito, que invejava
o poder dos bispos, aproveitou para prendê-lo, torturá-lo e assassiná-lo em
público. Cirilo se encontrou com os principais líderes judeus e os ameaçou.
Eles, por sua vez, organizaram um ataque aos cristãos: saíram em uma noite
pelas ruas anunciando um suposto incêndio em uma igreja. À medida que os
cristãos saíam para salvar o edifício, os judeus os assassinavam. Contudo,
Gibbon cogita que a morte dos cristãos possa ter sido acidental, mas, seja como
for, sabe-se que cristãos foram mortos por judeus.
Cirilo respondeu aos ataques indo às sinagogas acompanhado por uma
multidão e prendendo os judeus à força. Pegos de surpresa, não puderam se
defender e acabaram expulsos da cidade. As sinagogas foram demolidas e os bens
dos judeus, saqueados. Vários historiadores afirmam que praticamente todos
foram expulsos da cidade, enquanto que outros consideram a afirmação exagerada.
Orestes não gostou do resultado, pois a perdeu de uma grande parte da
população sob seu comando e, além disso, os judeus eram protegidos pelas leis.
Ele comunicou o ocorrido ao imperador Teodósio, mas Élia Pulquéria, a
imperatriz-regente, era profundamente cristã e implantou uma comissão de
inquérito para avaliar a situação. Cirilo escreveu-lhe também, afirmando
que a expulsão dos judeus fora um ato para proteger os cristãos.
Em 416, Edésio, o investigador enviado por Constantinopla, concluiu que
os parabolani eram uma ameaça à segurança pública. Como consequência,
limitou-se o número deles a quinhentos; além disto, o grupo passaria a estar
subordinado ao prefeito e não mais ao patriarca. A nova legislação ainda
admoestava o bispo a manter-se distante da política: "apraz Nossa
Clemência [o imperador] que os clérigos não devam ter nada em comum com
questões públicas ou temas pertinentes ao senado municipal." Entretanto,
dois anos depois, haveria uma notável restauração do poder de Cirilo: o número
de parabolani subiu para 600 e eles foram novamente colocados sob direção do
patriarca.
Ataque a Orestes
Apesar disso, as reclamações do prefeito, afirma Gibbon, descontentaram
alguns monges nitrianos. Quando a carruagem de Orestes passava pelas ruas da
cidade, cerca de quinhentos deles atacaram-na, acusando o prefeito de
paganismo. A maioria dos guardas do prefeito fugiu e, apesar de Orestes afirmar
que era cristão batizado, acabou ferido por uma pedrada na cabeça.
A população alexandrina dispersou os monges e Amônio, o monge que lançara
a pedra, foi capturado. Como punição, foi torturado publicamente até à morte.
Cirilo tomou o corpo do torturado, levou-o a uma igreja e mandou listá-lo entre
os mártires, intitulando-o Thaumasius. Segundo Sócrates, este ato
foi malvisto, mesmo entre os cristãos: Amônio teria morrido não por não
renunciar a fé, mas sim por um crime comum. Ele afirma ainda que Cirilo estava
consciente disso e deixou o episódio cair no esquecimento.
Assassinato de Hipátia
Hipátia, segundo uma gravura tradicionalmente usada para representá-la.Na
época, morava em Alexandria a filósofa chamada Hipátia. Pagã e neoplatonista,
era considerada muito sábia e virtuosa, mesmo pelos cristãos. Entretanto,
corriam boatos de que ela prevenia Orestes, seu amigo, contra Cirilo. Assim, na
quaresma de 415 (ou 416), uma multidão, incitada por um leitor chamado Pedro,
tomou-a de sua carruagem, arrastou-a até uma igreja e a assassinou,
desmembrando-a e queimando seu corpo. Gibbon afirma que os seus assassinos
foram salvos através do pagamento de um suborno.
A relação de Cirilo com o ocorrido é controversa. Sócrates e Gibbon afirmam
que sua morte trouxe opróbrio para a Igreja de Alexandria e seu patriarca, mas
não mencionam envolvimento de Cirilo. Damáscio, por sua vez, atribui
explicitamente o assassinato ao patriarca, que teria inveja de Hipátia; a
Enciclopédia Católica, porém, lembra que Damáscio escreveu muito depois do fato
e afirma que ele repudiava os cristãos. Vários autores tendem a atribuir culpa
ou responsabilidade indireta ao patriarca: ele teria incitado as multidões com
seus discursos, mesmo não dando ordens explícitas. Segundo Mangasarian, Cirilo
não gostava da popularidade de Hipátia. "Acreditava que ela estava
competindo com o cristianismo, levando para longe de Cristo homenagens que
pertenciam a ele (...) Ela estaria roubando de Deus os seus direitos e devia cair.
Tal foi o raciocínio de Cirilo, que a Igreja canonizou." [nt 3] Outros
afirmam, porém, que as multidões agiram por iniciativa própria e que Cirilo não
tinha controle da situação. De qualquer forma, o episódio ficou associado a
Cirilo.
Também há algumas dúvidas sobre as motivações. McGuckin cogita que o
crime teria sido resultado de uma tentativa de conversão forçada. Algumas
pesquisas modernas creem que o episódio resultou do conflito de duas facções
cristãs: uma mais moderada, ao lado de Orestes, e outra mais rígida, seguidora
de Cirilo.Depois do conflito, diz Sócrates, Cirilo tentou reconciliar-se com
Orestes, escrevendo-lhe e enviando mensageiros, sem sucesso.
Polêmica com
Nestório e Concílio de Éfeso
Entre 427 e 428, Nestório, um monge nativo de Germanícia que vivia em
Antioquia, foi nomeado patriarca de Constantinopla. Seguindo a tradição da
escola teológica síria, Nestório se opunha ao uso do termo Theotokos (em grego,
"mãe de Deus") para se referir à Virgem Maria. Cirilo, porém, defendia
e incentivava o uso do termo como consequência natural da natureza única de
Cristo defendida pela tradição alexandrina; assim, em 429, ele escreveu uma
carta pascal apoiando o uso do título. Os patriarcas trocaram correspondências
em um tom relativamente moderado até que Nestório enviou seus sermões ao Papa
Celestino I pedindo sua opinião, mas não obteve resposta. Posteriormente,
Cirilo também escreveu ao papa solicitando que ele referendasse a sua opinião
em decreto.
O papa decidiu a favor de Cirilo e delegou ao patriarca alexandrino a
autoridade para depor Nestório e impor um prazo de dez dias para que ele
demonstrasse arrependimento e realizasse sua penitência. Cirilo escreveu a
Nestório em tom pouco conciliatório repassando-lhe estas exigências. Além
disso, ele acrescentou à carta doze anátemas que o patriarca bizantino deveria
confirmar. Estes anátemas, acrescentados por conta própria por Cirilo, seriam a
fonte de grande polêmica nos anos seguintes.
O imperador Teodósio II e as igrejas do oriente resistiram ao veredito
papal e o imperador convocou um concílio ecumênico em 431, a ser realizado em
Éfeso. Nestório chegou à cidade logo após a Páscoa enquanto Cirilo, acompanhado
de uma grande comitiva, chegou por volta do Pentecostes. Já aliado a Mênon, o
bispo de Éfeso, Cirilo fechou as portas de todas as igrejas da cidade a
Nestório e colocou a população da cidade contra ele.
Enquanto isso, João de Antioquia e os enviados do papa, que determinariam
se Nestório poderia ou não participar no Concílio, se atrasaram. Cirilo temia
que João estaria do lado de Nestório e que estivesse tentando ganhar tempo para
seu adversário. Assim, no dia 22 de junho, antes da chegada dos emissários
papais e dos bispos do oriente, Cirilo abriu os trabalhos do concílio na posição
de presidente e representante papal (embora não tivesse sido comissionado para
tal), a despeito do pedido de sessenta e oito bispos e de Candidiano, o
representante imperial, para que aguardasse. Esses bispos e o representante do
imperador acabaram excluídos do concílio. Cirilo também mandou quatro bispos
para convocar Nestório, mas o patriarca de Constantinopla não os recebeu.
Sem a participação dos sessenta e oito bispos, expulsos, dos bispos do
oriente que ainda não haviam chegado, de Nestório e de Candidiano, o concílio
foi unânime: as cartas de Cirilo foram declaradas compatíveis com o Credo e com
a doutrina dos Pais da Igreja. Houve uma condenação unânime, sem discussão e
uniforme até mesmo no estilo, a Nestório, que deveria ser deposto e excomungado.
Entretanto, em 26 ou 27 de junho, João e sua comitiva de bispos chegaram a
Éfeso. Depois de se reunirem com Candidiano, ele e os demais bispos do oriente
declararam outro concílio, que condenaria Cirilo e Mênon por apolinarianismo e
anomoeanismo através de outros doze anátemas. Em resposta, Cirilo e Mênon
depuseram também João de Antioquia.
Enquanto isso, o caos irrompeu em Éfeso. Mênon fechou as igrejas aos
bispos orientais e colocou guardas na catedral da cidade, que Candidiano tentou
tomar com o apoio das tropas imperiais, sem sucesso. O conflito entre os
partidários de Cirilo e de Nestório chegou às raias da violência física.
Teodósio, que buscava o acordo entre as partes, por argumentação ou por
intimidação, concedeu amplos poderes a seus representantes efésios e chegou a
promover um concílio alternativo, nos arredores da cidade, com alguns
representantes de cada facção.
Entretanto, os orientais não
cediam aos argumentos e os ocidentais, em maior número e com apoio papal,
rejeitavam a reconciliação.[2] Após três tumultuados meses, Teodósio dissolve o
concílio e ameaçou destituir Cirilo, João e Mênon. Depois de algum tempo sob
custódia, Cirilo e João retornam a suas dioceses e o imperador finalmente
adotou a posição de Cirilo: Nestório foi deposto e exilado, primeiro em
Antioquia, depois em Petra e posteriormente no Grande Oásis do Egito.
Em 432, morreu o papa Celestino I e seu sucessor, Sisto III, corroborou o
resultado do concílio presidido por Cirilo. Depois de alguma resistência, ele
convenceu João de Antioquia a se reconciliar com o patriarca alexandrino. Após
o concílio, Cirilo escreveu ainda vários tratados, cartas e sermões. Foi
patriarca alexandrino por trinta e dois anos e reinou até a sua morte em 9 ou
27 de junho 444.
Obra
Cirilo foi um arcebispo erudito e um escritor prolífico. Nos primeiros
anos da sua vida ativa na Igreja, escreveu exegeses diversas, entre elas um
"Comentários sobre o Antigo Testamento",[30] um
"Thesaurus", um "Discurso contra Arianos", um "Comentário
sobre o Evangelho de João"[31] e os "Diálogos sobre a Trindade".
Embora seja hoje lembrado pelo seu papel no Concílio de Éfeso e pelos eventos
tumultuosos de seu patriarcado, é lícito crer que Cirilo imaginava que seus
comentários bíblicos seriam seu legado mais relevante.[32] Em 429 as
controvérsias cristológicas aumentaram sua produção literária a ponto de seus
adversários não conseguirem acompanhar. Seus escritos fazem frequentemente
alusão às doutrinas dos demais Padres da Igreja.
Por sua luta em defesa do título de "Theotokos"[33] (Mãe de
Deus), durante o Concílio de Éfeso (431), a Liturgia da Palavra, a leitura
recomendada pela Igreja Católica para a comemoração de Cirilo é exatamente uma
defesa do título.Abundam no estilo da prosa de Cirilo as construções incomuns e peculiaridades
dos textos produzidos em Alexandria. Sua preferência por formas arcaicas áticas
é notável, assim como as frases longas e intrincadas, com várias orações
subordinadas e construções complicadas. Por isso, até seu estilo literário é
controverso. Por vezes descrito como uma variedade poética de prosa, este
estilo é considerado por muitos complexo, verboso e desagradável para o leitor
moderno. Robert Wilken afirma que ele é "prolixo e túrgido, uma infeliz
sinergia de grandiloquência e afetação"; L. R. Wickham diz que há, nos
textos de Cirilo, "toda a feiura erudita do Albert Memorial ou dos móveis
do Segundo Império." O próprio Nestório classificou o texto de Cirilo como
pomposo e difícil de ler. McGuckin, porém, tende a ser mais benévolo — enquanto
reconhece que a prosa do patriarca é densa e difícil, sugere que esta
dificuldade não deriva somente do estilo, mas também das sutilezas dos
argumentos.
Para Cirilo, tal afetação provavelmente apresentava-se como sinal de
erudição e prestígio; de fato, após o cristianismo tornar-se a religião oficial
do Império Romano, seus autores passaram a adotar menos o idioma vernáculo
(como o koiné era, no Novo Testamento), adotando cada vez mais formas antigas,
especialmente áticas.[34] O resultado foi uma prosa por vezes distanciada dos
significados que queria transmitir e um tanto artificial.
Comemorações
A Igreja Ortodoxa e as igrejas orientais celebram seu dia em 9 de junho e
novamente, junto com o Atanásio de Alexandria, em 18 de janeiro. A Igreja
Católica não o comemora no calendário tridentino; sua celebração foi adicionada
apenas em 1882, sendo 9 de fevereiro o seu dia. Aqueles que usam calendários
anteriores à revisão de 1969 ainda observam este dia, mas a revisão atribuiu ao
santo o dia 27 de junho, tradicionalmente o dia de sua morte. A mesma data foi
escolhida para o calendário luterano. Em 9 de abril de 1944, por ocasião do 15º
centenário da morte de São Cirilo, o Papa Pio XII promulgou a encíclica
Orientalis Ecclesiae.
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