Chegamos
agora a três séries de julgamentos: os Sete Selos (caps.
6—7), as Sete Trombetas (caps. 8—11) e as Sete Taças (caps.
15—16). A escola de interpretação histórico-contínua (historicista), encontra nisso um retrato de sucessivos
ciclos de julgamentos durante essa época. Provavelmente, uma melhor perspectiva
seria entendê-los como ciclos concêntricos de julgamento, descrevendo
basicamente a mesma coisa, mas com figuras simbólicas diferentes. Como sempre,
o número sete indica inteireza. É importante observar que o sétimo selo
desemboca nas sete trombetas e a sétima trombeta desemboca nas sete taças.
Assim, as três séries estão intimamente ligadas umas às outras.
Os sete
selos têm sido chamados de “Cenário da História de Sofrimento”. Arrepiamo-nos
ao pensar nos julgamentos que sobrevirão a este mundo farto de pecado.
O Primeiro
Selo: Conquista (6.1,2)
Quando o
Cordeiro abriu o primeiro selo do rolo, João ouviu como em voz de trovão (1). Essa
era a voz alta de um dos quatro animais (“criaturas
viventes”).
Os
primeiros quatro rolos formam uma série. Cada um é introduzido por um chamado
em alta voz de uma das quatro criaturas viventes, seguido do aparecimento de um
cavalo e um cavaleiro. Uma sugestão definida então é dada quanto ao que ele
simboliza.
Vem e
vê deveria
ser apenas “Vem!”. As palavras E vê não estão no
melhor texto grego, aqui ou nos versículos 3, 5 e 7. Alguns escribas
evidentemente entenderam isso como um chamado a João para vir e ver o que iria
acontecer. Fausset comenta: “É mais provável que seja o clamor
dos redimidos ao seu Redentor: “Vem liberta a criatura em agonia da
escravidão da corrupção”. O sentido correto provavelmente é o
que Simcox apresenta: “O sentido completo da frase é que cada uma das
criaturas viventes, alternadamente, convoca um dos quatro cavaleiros”.
A
abertura do primeiro selo revela um cavalo branco; e o que estava assentado
sobre ele tinha um arco; e foi-lhe dada uma coroa, e saiu vitorioso e para
vencer (2).
Num
primeiro momento, o significado disso parece óbvio: o cavaleiro do cavalo branco
é Cristo (cf. 19.11-16). Esse é o ponto de vista de Lange. Ele escreve: “O
triunfo isolado de Cristo, como apresentado aqui, tem se prolongado através do
Triunfo da Igreja; ele aparece como uma formação de hostes vitoriosas em
cavalos brancos”. Fausset concorda com isso. O mesmo ocorre
com Lenski, que identifica o cavaleiro como a Palavra de Deus e
acrescenta: “O portador, o cavalo, é branco, que é a cor de santidade e do
céu”.
Mas o
contexto parece não permitir essa interpretação. Swete diz: “Uma
visão do Cristo vitorioso seria inapropriada na abertura de uma série que
simboliza derramamento de sangue, fome e pestilência. Em vez disso, temos aqui
a figura de um militarismo triunfante”. Semelhantemente, Love diz: “Por isso,
uma vez que guerra, fome e morte são resultados de uma conquista, o ‘branco’
aqui deve ser a vitória, não de pureza, mas de uma conquista egoísta e
luxuriosa”. Erdman apresenta um ponto de vista um pouco diferente: “O
primeiro representa os períodos de paz concedidos, na providência de Deus, sob
o Império Romano, e a ser repetido diversas vezes na história do mundo”. Foi a conquista
romana que trouxe paz.
O Segundo Selo: Guerra (6.3,4)
Dessa vez
o cavalo é vermelho (4). O significado disso é claramente
indicado pelo que segue. O cavaleiro do cavalo vermelho recebeu poder
para que tirasse a paz da terra e que se matassem uns aos outros; e
foi-lhe dada uma grande espada — simbolizando uma grande destruição.
Claramente, o vermelho representa um imenso derramamento de
sangue.
O Terceiro Selo: Fome (6.5,6)
O
terceiro cavalo era preto (5). O cavaleiro tinha em suas
mãos uma balança. O simbolismo disso é imediatamente
explicado: Uma medida de trigo por um dinheiro; e três medidas de
cevada por um dinheiro (6). A medida era pouco mais
de um litro, que era “a média diária de consumo de um trabalhador”. Um dinheiro era
um denarius, que, pelo que tudo
indica, representava o salário de um dia (Mt 20.2). Isso significava que o
preço da fome era tão alto que levaria tudo que um homem ganhasse só para
alimentar a si próprio, se comesse trigo. Por outro lado, ele poderia comprar três
quartos de cevada — a comida das pessoas pobres — e ter o suficiente para uma
família pequena.
À
proclamação de preço é acrescentada uma admoestação: e não danifiques o
azeite e o vinho. Esse seria o azeite de oliva e suco de uva
fermentado. Swete observa: “Trigo e cevada, óleo e vinho, formavam a
dieta básica da Palestina e da Ásia Menor”.
O
significado provável dessa advertência é explicado por Charles. Ele escreve:
“Devido à falta de cereais e à superabundância de vinho, Domiciano emitiu um
édito [...] que nenhuma vinha nova deveria ser plantada na Itália, e que a
metade das vinhas nas províncias deveria ser destruída”.
Mas Suetônio registra o fato que o decreto imperial causou um
alvoroço tão grande nas cidades asiáticas que ele precisou ser revogado. Em vez
disso, foi imposto um castigo para aqueles que deixassem de cultivar as suas
vinhas! Charles acha que João está aqui registrando um protesto contra essa
atitude egoísta: “Consequentemente, ele prediz uma época difícil, em que os
homens terão azeite e vinho em abundância, mas sofrerão da falta de pão”. É
possível que o decreto de Domiciano tenha sido o motivo das palavras aqui.
O Quarto Selo: Morte (6.7,8)
Agora
aparece um cavalo amarelo (8). A palavra grega é chloros, que significa um “verde descorado”. Swete comenta: “encontramos
essa palavra na Ilíada de Homero (vii. 464) para
“pálido de medo”. Swete comenta: “O cavalo ‘descorado’ ou ‘pálido’ é
um símbolo de Terror, e seu cavaleiro uma personificação da Morte [...] com
quem segue — quer no mesmo ou num outro cavalo ou a pé, o autor não para de
dizer ou mesmo de pensar — em seu companheiro inseparável, o Hades”.
Mas havia
um limite para o estrago do ceifeiro severo, a Morte, e o celeiro avarento,
O Hades. Eles têm poder para destruir a quarta parte da
terra. O tempo do julgamento final ainda não havia chegado.
Os dois
algozes matam usando quatro métodos: espada [...] fome [...] peste [...]
(a palavra grega evidentemente significa “peste” ou “pestilência” aqui e com
frequência na LXX) [...] feras da terra. Há uma referência
óbvia a Ezequiel 14.21: “Porque assim diz o Senhor JEOVÁ: Quanto mais, se eu
enviar os meus quatro maus juízos, a espada, e a fome, e as nocivas alimárias,
e a peste”. Os termos gregos são os mesmos nas duas passagens, em que apenas a
ordem dos dois últimos é invertida. Feras selvagens multiplicam-se e tornam-se
mais ferozes em tempos de fome e pestilência.
A visão
dos quatro cavaleiros em abrir os primeiros quatro selos encontra um paralelo
impressionante em Zacarias 6.1-3. Ali o profeta vê quatro carros puxados por
cavalos que eram respectivamente vermelhos, pretos, brancos e grisalhos e
fortes. Aqui um dos cavalos é branco, os outros vermelho, preto e verde
pálido, respectivamente. Como Swete observa: “O Apocalipse toma
emprestado somente o símbolo dos cavalos e suas cores e em vez de colocar os
cavalos em cangas diante dos carros ele coloca um cavaleiro em cada um deles em
quem o interesse da visão é centrado”.
Qual é a
aplicação desses primeiros quatro selos? Representando a interpretação preterista, Swete encontra aqui o militarismo e a
obsessão pela conquista que era característica do Império Romano daquela época,
repetida com frequência na história desde então.
Típico
daqueles que defendem a interpretação historicista, Barnes entra em mais detalhes.
O primeiro selo representa um período de prosperidade e conquista com uma
duração de cerca de 90 anos depois que o Apocalipse foi escrito (i.e, até
180 d.C.). Baseando-se em grande parte no livro Decline and Fali ofthe Roman
Empire (Declínio e Queda do Império
Romano) de E. Gibbon, Barnes descreve esse período com grandes detalhes. O
segundo selo representa os 92 anos após o assassinato de Commodus em
193 d.C., quando não menos de 32 imperadores e 27 pretendentes mantiveram
o império em um estado de guerra civil constante. O terceiro selo simboliza um
período de impostos opressivos e restrições severas à liberdade do povo.
Barnes aplica o quarto selo ao período que vai de 248 até 268d.C., quando a
espada, a fome e as pestes, de acordo com Gibbon, causaram a morte da
metade da população do império.
A
interpretação futurista entende que esses selos
se referem a julgamentos terríveis sobre a humanidade no fim dessa era. Por
exemplo, Kuyper diz que “o que está sendo apresentado aqui precede o
final imediato de todas as coisas, a vinda do Anticristo e o retorno do
Senhor”.
O Quinto
Selo: Martírio (6.9-11)
A
abertura do quinto selo revelou debaixo do altar as
almas dos que foram mortos por amor da palavra de Deus e por amor do testemunho
que deram (9). Não há aqui criaturas viventes nem uma voz
clamando: “Vem”. O significado dessa mudança é observado por Swete: “Com
o quinto selo, a Igreja vem a luz, em relação à sua perseguição e
sofrimento [...] A quebra do quinto selo interpreta a época da perseguição e
mostra sua relação com o plano divino na história”. Não precisa de muita
imaginação para constatar que isso poderia se aplicar igualmente à perseguição
romana aos cristãos (preterista), às várias perseguições de verdadeiros crentes
ao longo da era da Igreja, especialmente pela igreja católica romana
(historicista), e também aos mártires da Grande Tribulação no final desta era
(futurista). Concordar com uma dessas teorias não excluiria sua verdade em
relação às outras. A posição sensata aparentemente é aceitar todas as
interpretações dessa passagem como válidas e significativas.
Debaixo
do altar é talvez
uma referência ao fato de que o sangue da oferta pelo pecado deveria ser
derramado “à base do altar do holocausto” (Lv 4.7). “O altar em estudo aqui é
o correlativo do Altar do Holocausto, e as vítimas que foram oferecidas sobre
ele são os membros mortos como mártires da Igreja, que seguiram seu
Cabeça no exemplo da sua morte sacrificial”.
A
linguagem da última parte desse versículo é semelhante à linguagem em 1.9, que
encontra eco novamente em 12.11, 17; 19.10; 20.4. A repetição de por (dia, por causa de) sugere duas causas do martírio.
Essas testemunhas fiéis eram mortas por causa da sua confissão no único e
verdadeiro Deus, em contraste com o politeísmo e adoração ao imperador daqueles
dias, e do seu testemunho de Jesus como o único Senhor e Salvador. O Martírio de Policarpo relata que pouco antes
desse venerável bispo ser morto em 156 d.C., ele foi impelido pelo pro
cônsul romano a salvar a sua vida ao fazer duas coisas: 1) “Jure pelo nome de
César [...] e diga: ‘Fora com aqueles que negam os deuses”; 2) Desonre a
Cristo”. A resposta de Policarpo tem sido citada com frequência: “Oitenta e
seis anos o servi e Ele nunca me tratou injustamente. Como posso agora
blasfemar contra meu Rei que me salvou?”.
Há muitas
advertências na Palavra de Deus de que o martírio pela fé vai novamente se
tornar comum no fim dos tempos. Precisamos orar pelo mesmo espírito de coragem
que foi mostrado pelos antigos mártires da Igreja.
As almas
debaixo do altar clamavam (aoristo, somente uma vez) com
grande voz, dizendo: Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e
vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra (10). Dominador não
é o termo comum kyrios, masdespotes (cf. déspota). Esse é um título para Deus na
Septuaginta e duas vezes no Novo Testamento (Lc 2.10; At 4.24). Ele também é
usado para Cristo duas vezes (2 Pe 2.1; Jd 4). Aqui não está
claro se o termo é empregado para Deus ou para Cristo. As palavrasverdadeiro
e santo são usadas para Cristo em 3.7.
O clamor
por vingança tem causado uma certa consternação nos cristãos atuais.
Mas Swete nota que “a santidade e verdade do Supremo Mestre requer o
castigo de um mundo responsável pelas suas mortes. As palavras somente afirmam
o princípio da retribuição divina, que proíbe o exercício da vingança
pessoal”.
Para cada
mártir foi dada uma veste branca (stole, sing.) simbolizando pureza e vitória. Essa
palavra grega é encontrada outra vez em 7.9, 13-14. O termo representa uma
roupa longa que era um tipo de um símbolo de status. Essas vítimas do martírio eram, na verdade,
vencedores. Foi-lhes dito que repousassem ainda um pouco de tempo, até
que também se completasse o número de seusconservos e seus irmãos que
haviam de ser mortos como eles foram. Sua espera será um repouso e
será por um período curto. Quando os propósitos de Deus estiverem completos,
virá o fim.
O Sexto Selo: O Fim
dos Tempos (6.12-17)
O
primeiro sinal do fim que pode ser observado é um grande tremor de
terra (12). Esse aspecto provavelmente é um eco de Ageu 2.6-7 (LXX):
“Porque assim diz o SENHOR dos Exércitos: Ainda uma vez, daqui a pouco, e
farei tremer os céus, e a terra, e o mar, e a terra seca; e farei tremer todas
as nações”. A última frase sugere que a referência não é somente a um
terremoto físico, mas também a revoluções raciais, políticas e sociais. É
interessante observar que terremoto é seismos e
“farei tremer” é seiso.
Outros
terrores são indicados: e o sol tornou-se negro como saco de cilício, e
a lua tornou-se como sangue. Essa citação é semelhante à de Joel 2.31:
“O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que venha o grande e
terrível dia do SENHOR”.
Outros
fenômenos são observados: E as estrelas do céu caíram sobre a terra,
como quando a figueira lança de si os seus figos verdes, abalada por um vento
forte (13). A linguagem é a de Isaías 34.4: “E todo o exército dos
céus se gastará [...] e todo o seu exército cairá como cai a folha da
vide e como cai o figo da figueira”.
A
sentença que omitimos dessa citação de Isaías: “e os céus se enrolarão como um
livro” é similar à próxima frase de Apocalipse: E o céu retirou-se como
um livro que se enrola (14). O autor acrescenta a seguinte
predição: e todos os montes e ilhas foram removidos do seu lugar. Sempre
haverá uma discussão se essa linguagem deve ser entendida literal ou
figuradamente. Mas por que não as duas formas? Como no caso de 2 Pedro
3.10-12, a idade atômica abriu os nossos olhos para o fato de que uma linguagem
tão severa, há muito tempo taxada como uma expressão poética de uma imaginação
fértil, pode se cumprir com uma exatidão horrível.
Nessa
visão terrível dos últimos dias, João viu homens de todas as camadas da sociedade
(são mencionadas sete classes), de reis a escravos, se esconderem nas
cavernas e nas rochas das montanhas (15). Eles diziam aos
montes e aos rochedos para que caíssem sobre eles (cf. Os 10.8) e os
escondessem do rosto daquele que está assentado sobre o trono e da ira
do Cordeiro (16). Que paradoxo impressionante: a ira do
Cordeiro! Alguém disse que a ira de Deus é o amor de Deus represado
pela desobediência do homem, até que seja emanado no julgamento justo.
O motivo
de procurar se esconder é claro: porque é vindo o grande Dia
da sua ira; e quem poderá subsistir? (17). Já ocorreram muitos dias do
julgamento de Deus sobre o pecado e homens pecaminosos. Mas o grande
Dia da sua ira — uma combinação de “o dia do Senhor” (Jl 2.11, 31. Zc
1.14) e o “dia da ira do Senhor” (Sf 1.15,18; 2.3) — ainda está por vir.
Excederá em muito qualquer coisa de que se tem notícia.
(fonte comentario biblico Normam r. Champlin)
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