Chegamos
agora a dois capítulos de espanto excepcional. Tendo examinado os instigadores
da horrível iniquidade da terra, passamos agora ao juízo terrível das taças.
Castigos severos e finais estão prestes a ser infligidos em sucessão aguda e
rápida. Assim como o pecado alcançou seu clímax com o homem da iniquidade como
já vimos em ebdareiabranca, também agora os juízos de Deus hão de cair do
Deus do juízo sobre uma terra culpada. Nos capítulos que agora examinamos temos
detalhes concernentes aos juízos de Deus que precedem seu grande dia de ira.
Como veremos, o derramar da sétima taça completa a ira de Deus.
O preparo (15:1-8).
1. Vi no céu outro sinal grande e admirável,
sete anjos tendo os sete últimos flagelos, pois com estes se consumou a cólera
de Deus. A
palavra traduzida “sinal” significa milagre ou aparição maravilhosa, como
em 12:1,3. Com o simbolismo das sete trombetas João retratou uma série de
castigos divinos, na forma de pragas e tormentos, para acordar a humanidade
para a verdadeira realidade de Deus. Esta série agora alcança seu clímax; com
os flagelos das sete taças, Deus terá derramado totalmente sua cólera no
contexto particular das pragas que antecipam o julgamento final. O
significado destas palavras não é que a ira de Deus acabou; a besta, o falso
profeta e todos os que persistirem na maldade ainda serão lançados no lago de
fogo, na manifestação derradeira da cólera de Deus contra o pecado. Temos de
tomar estas palavras em seu contexto escatológico particular: a cólera de Deus
durante a grande tribulação é uma tentativa de fazer com que os adoradores da
besta se inclinem diante da soberania de Deus.
2. Vi como que um mar de vidro, mesclado de fogo, e
os vencedores da besta, da sua imagem e do número do seu nome. Instantes antes das
últimas pragas João tem uma visão proléptica dos que venceram a besta. Estes
são os santos-mártires mortos pela besta por sua perseverança sob perseguição,
sua obediência firme aos mandamentos de Deus e sua fé em Jesus (14:12). Eles
venceram a besta por meio do seu martírio, pois nem na morte eles negaram o
nome de Jesus. Recusaram adorar a besta, inclinar-se diante da sua imagem
(13:15), e receber o número do seu nome. Apesar de a besta tê-los morto, foram
eles que a venceram, permanecendo fiéis a Jesus; frustraram o propósito dela.
Temos de presumir que a perseguição dos santos pela besta
continua durante o período dos sete flagelos.
Não há
razão suficientemente forte para não interpretarmos o mar de vidro como sendo
aquele que estava diante do trono de Deus (4:6). O pensamento central deste
simbolismo é que estes vencedores da besta estão diante do trono, na presença
de Deus. A besta pensou que os venceria matando-os; mas sua morte somente os
transportou da terra para o céu. A vitória final foi deles. O mar de
vidro mesclado com fogo provavelmente é um símbolo de que este período é de
julgamento dos que vivem na terra; pode também se referir à perseguição
sangrenta pela qual os vencedores passaram. As harpas de Deus que eles tinham
em suas mãos são outro símbolo da sua vitória. Harpas expressam louvor e
adoração a Deus (5:8; 14:2); os vencedores expressam sua alegria pela vitória
cantando hinos de louvor.
3. E entoavam o cântico de Moisés, servo de Deus, e
o cântico do Cordeiro. Os
exegetas estão discutindo se isto quer dizer que eles estão cantando dois
cânticos ou somente um. Gramaticalmente parece que eles estão cantando dois: um
de Moisés e outro do Cordeiro. Pelo contexto a ideia é que os vencedores cantam
um hino de triunfo, que tanto os santos do Antigo Testamento como os do Novo
sabiam cantar, porque todos cantam da libertação pelo mesmo Deus. Talvez o
cântico de Moisés seja o da libertação do Êxodo, quando os israelitas louvaram
a Deus por tê-los tirado do Egito. O cântico do Cordeiro, no contexto, não é um
hino de salvação pessoal; é um hino pela libertação do ódio e da hostilidade
da besta. Da mesma maneira como Deus libertou Israel do Egito, mesmo
derramando pragas sobre os egípcios, ele também libertou os santos de adorar a
besta, derramando seus juízos sobre os que a adoram.
O hino
não fala de redenção espiritual, mas exalta os poderosos feitos de Deus. Isto
forçosamente inclui os meios que Deus usa para manifestar sua cólera contra os
que perseguiram os santos. O hino está quase totalmente expresso em linguagem
do Antigo Testamento, porque Deus é o Deus que liberta o seu povo. Suas obras
são grandes e admiráveis (veja Sl 92:5; 111:2; 139:14). Ele é o Senhor Deus,
Todo-poderoso, à luz de quem os poderes da besta têm limites. Seus caminhos,
mesmo permitindo que os santos sofram, são justos e verdadeiros. Ele é realmente
o Rei das nações. A versão “Rei dos santos” (ARC), é de um texto grego
mais recente e não tem muito apoio. Outra versão possível é “Rei dos séculos”
(IBB). Neste tempo de grande tribulação, quando parece que a besta tem poder
ilimitado para executar seus propósitos demoníacos contra os homens e
perseguir os santos — na hora mais escura da história da humanidade, quando
parece mesmo que Satanás é o deus deste século (2 Co 4:4), os mártires
cantam um hino de louvor a Deus, reconhecendo que ele é o Deus vivo e
verdadeiro. Eles exaltam o nome de Deus porque, ao contrário de evidências
externas, ele é de fato o Rei, de todas as nações e todas as épocas, inclusive
durante o tempo de martírio. Este hino é uma das expressões de fé mais comoventes
de toda a literatura bíblica.
4. Quem não temerá e não glorificará o teu nome, ó
Senhor? pois só tu és santo; por isso todas as nações virão e
adorarão diante de ti, porque os teus atos de justiça se fizeram manifestos. Fora do contexto estas
palavras podem ser interpretadas no sentido de salvação de todas as nações. Nas
cartas de Paulo também há trechos correspondentes que soam a salvação
universal, tirados do contexto. É plano de Deus “fazer convergir nele todas as
coisas” (Ef 1:10). “Para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos
céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é
Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2:10-11). E “por meio dele reconciliasse
consigo mesmo todas as coisas que sobre a terra, quer nos céus” (Cl 1:20).
Afirmações como estas, porém, devem ser compreendidas dentro do plano bíblico.
A Bíblia está sempre olhando no futuro para um dia em que Deus reinará na
terra, cercado somente pelos que têm seu prazer em adorá-lo. “Todas as nações
que fizeste virão, prostrar-se-ão diante de ti, Senhor, e
glorificarão o teu nome” (Sl 86:9). “Irão muitas nações, e dirão: Vinde, e
subamos ao monte do Senhor, e à casa do Deus de Jacó. ...Ele julgará entre os
povos” (Is 2:3-4; cf. 66:23). “Desde o nascente do sol até ao poente é grande
entre as nações o meu nome” (Ml 1:11). É esta a meta do Apocalipse:
estabelecer uma cidade onde todas as nações encontrarão cura (22:2). Isto
não significa salvação universal: somente que o Reino de Deus será constituído
de uma união de pessoas de todas as nações, que alegremente se entregam para
adorar e cultuar a Deus.
É digno
de nota que os mártires não cantam de si mesmos nem de como venceram a besta:
eles estão ocupados totalmente com a soberania, além disto não há
nenhum vestígio de vingança pessoal contra os inimigos que são atingidos pelo
castigo divino.
Os atos
de justiça que se fizeram manifestos são as sentenças judiciais de Deus em
relação às nações, de misericórdia ou de condenação. Para Babilônia e seus
habitantes que adoram a besta elas significam ira de Deus; mas as pessoas
reconhecerão que “verdadeiros e justos são os teus juízos” (16:7).
5. Depois destas coisas olhei, e abriu-se no céu o
santuário do tabernáculo do testemunho. As sete últimas pragas estão por começar, e são
retratadas pelo esvaziar de sete taças que estão na mão de sete anjos que vêm
da presença de Deus. O santuário de Deus já apareceu algumas vezes no
Apocalipse. João viu, em uma visão proléptica, o santuário de Deus no céu
aberto, com a arca da aliança (11:19). Isto foi para lembrá-lo da fidelidade
de Deus às promessas de sua aliança. Aqui a fidelidade de Deus também exige o
julgamento do mal.
Este
versículo mistura duas referências históricas: a tenda do testemunho, no
deserto, e o templo que mais tarde foi construído em Jerusalém. O tabernáculo
no deserto era chamado de “tabernáculo do testemunho” (Êx 38:21; Nm
10:11, 17:7; At 7:44). Ele se tornou modelo para o templo, quando este foi
construído em Jerusalém, e o templo, por sua vez, foi usado como modelo para a
habitação de Deus no céu.
6. E os sete anjos que tinham os sete flagelos
saíram do santuário, vestidos de linho puro e resplandecente, e cingidos ao
peito com cintas de ouro. Geralmente
João não descreve a aparência dos muitos anjos que aparecem em seu drama
escatológico. A vestimenta destes anjos tem o objetivo de destacar o esplendor
destes seres celestiais. Não há razão para pensar que as cintas de ouro indicam
funções sacerdotais.
7. Então um dos quatro seres viventes deu aos sete
anjos sete taças de ouro, cheias de cólera de Deus. Os quatro seres viventes
estavam perto do trono de Deus (4:6); isto é a maneira simbólica de dizer que
os sete flagelos estavam integralmente autorizados por Deus. Taça era um prato
raso usado para beber e derramar libações. A mesma palavra é usada para as
taças de ouro cheias de incenso, que são as orações dos santos, nas mãos dos
vinte e quatro anciãos (5:8). Pode haver aqui uma alusão deliberada às taças
que contêm o incenso da oração. As orações dos santos têm a função de trazer
sobre o mundo a manifestação derradeira da justiça e da ira de Deus. A ênfase
na eternidade de Deus — aquele que vive pelos séculos dos séculos — lembra que,
apesar de parecer que o mal domina os acontecimentos da história humana, Deus é
eterno e ninguém pode se interpor aos seus planos, nem mesmo a maldade satânica
e demoníaca.
8. O santuário se encheu de fumaça, procedente
da glória de Deus e do seu poder, e ninguém podia penetrar no santuário,
enquanto não se cumprissem os sete flagelos dos sete anjos. No Antigo Testamento
quando Deus se manifestava aos homens ele costumava aparecer em uma glória tal
que ninguém podia ficar de pé diante dele. “Moisés não podia entrar na tenda da
congregação, porque a nuvem permanecia sobre ela, e a glória do Senhor enchia o
tabernáculo” (Êx 40:35). Os sacerdotes não conseguiram entrar no templo de
Salomão quando este foi dedicado, porque a glória da presença divina enchia a
casa (1 Rs 8:10). Quando Isaías teve a visão de Deus no templo, cercado de
serafins, os fundamentos da construção tremeram à voz divina e o Santuário se
encheu de fumaça (Is 6:4). Ezequiel caiu sobre sua face quando teve a visão do
templo cheio da glória do Senhor (Ez 44:4). A ênfase não é tanto sobre a
impossibilidade de se aproximar de Deus, mas sobre sua majestade e sua glória,
em comparação com tudo que é humano e mundano.
Há certas
semelhanças entre as pragas trazidas pelas sete taças e as trazidas pelas sete
trombetas, e ambas as séries têm semelhanças com as pragas do Egito. As
pragas das sete taças, no entanto, são bem mais intensas e devastadoras. As
pragas das primeiras quatro trombetas atingem primeiramente o ambiente do homem
e não tanto a este próprio, mas o primeiro flagelo atinge os homens
diretamente. Temos de ver estas pragas no contexto da luta titânica entre o
Reino de Deus e o reino de Satanás, retratada com traços tão vívidos no
capítulo 12. Estas pragas não são a expressão da ira divina contra o pecado em
geral, mas são o castigo por más ações individuais. A ira de Deus é
derramada sobre aquele que quer frustrar o plano divino para o mundo — a besta
— e sobre os que são leais a ela.
Entre os
primeiros seis selos e o sétimo houve um interlúdio, e também entre as seis
primeiras trombetas e a sétima. Nesta terceira série não há interrupção; o
sétimo flagelo é a destruição de Babilônia, que veremos na próxima lição — a
capital do império do Anticristo. O que o sétimo flagelo anuncia é descrito em
detalhes nos dois capítulos seguintes. Estes flagelos são a resposta de Deus ao
último e maior esforço de Satanás para derrubar o governo divino.(notas Comentario Normam R.Champlin, do apocalipse).
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