O tríplice propósito da profecia
Artigo Mauricio Berwald
Dons espirituais: [Do lat. donum + spirituale] dádiva,
presente relativo ao espírito. Recurso extraordinário que o Senhor Jesus deixou
a disposição da igreja.
A profecia, em si mesma, é uma revelação divina, pois trata-se de um oráculo
vindo da parte de Deus. Quem profetiza está falando em nome do Senhor e,
portanto, transmitindo ao povo a vontade divina. Os dons espirituais são para a
edificação, exortação, consolação e santificação da Igreja.
OS DONS
ESPIRITUAIS
A situação em Corinto. Ao falar sobre os
dons espirituais em 1 Coríntios 12 a 14, o apóstolo Paulo não introduz nenhum
ensino novo na Igreja; a manifestação dos dons já era bem comum no meio do povo
de Deus. Mas, posto que ocorresse abuso na prática dos dons espirituais, devido
à inexperiência daquela igreja, que ainda enfrentava problemas de altivez
espiritual (4.7,18) e dissensão (11.18), entre outros, o apóstolo foi
constrangido e inspirado pelo Espírito a escrever aos irmãos coríntios, para
que tais distorções fossem corrigidas.
Paulo trouxe um ensino muito importante sobre o assunto, esclarecendo as
manifestações sobrenaturais do Espírito Santo. Ele conscientiza a igreja que
todos os que receberam dons espirituais do Senhor podem e devem administrá-los
com sabedoria, prudência e humildade.
Conceito (vv.4-6). Estamos diante de
um assunto de extrema relevância para a edificação da Igreja e, por essa razão,
ninguém deve desconhecer o tema ou sentir-se como os coríntios — ignorantes
(12.1). A expressão grega que aparece em 1 Coríntios 14.1 é traduzida como “as
coisas espirituais” e, no versículo 4, o apóstolo Paulo chama de charisma — dom — ou de ministério, no versículo
5, e de operação, no versículo 6. Isso revela a diversidade dessas
manifestações, todavia, sempre mostrando que a fonte é uma só: Deus, o Pai, o
Filho e o Espírito Santo, que formam a Santíssima Trindade (12.4-6). As
manifestações dos dons não devem ser usadas para ostentação, como vinha
acontecendo em Corinto, pois “a manifestação do Espírito é dada a cada um para
o que for útil” (12.7).
A lista dos dons e uma ilustração. Os versículos da Leitura Bíblica em Classe mencionam nove dons: palavra da
sabedoria, palavra da ciência, fé, dons de curar, operação de maravilhas,
profecia, discernimento de espíritos, variedade de línguas e interpretação de
línguas. Havendo intérprete, as línguas podem até ser uma forma de manifestação
profética, cf. 14.5. Outros dons aparecem no versículo 28 e em Romanos 12.6-8.
Em seguida, a Bíblia ressalta que o Espírito opera segundo a sua vontade
na distribuição desses dons (12.11). Ainda nesse mesmo capítulo (vv.12-27), o
apóstolo ilustra o uso desses dons na Igreja, comparando a sua boa e ordeira
utilização ao corpo humano, no qual cada membro tem uma função diferente e, mesmo
assim, um depende do outro, sendo todos igualmente importantes. Na Igreja, que
é o corpo de Cristo — “vós sois o corpo de Cristo e seus membros em particular”
(v.27) —, não deveria ser diferente. O capítulo 12 encerra-se, ensinando aos
crentes a buscarem os “melhores dons”. Nesse momento, Paulo introduz o tema do
capítulo seguinte, o amor, que ele chama de “caminho mais excelente”
(12.31).
A IMPORTÂNCIA
DO AMOR
A relação entre a caridade e os dons (14.1). A maneira como Paulo escreve parece indicar que havia em Corinto uma
competitividade na busca e utilização dos dons espirituais entre os crentes
desta igreja (12.29,30). O capítulo 14 inteiro trata de dois deles: línguas e
profecia. Em torno de ambos, havia muita indisciplina no culto.
Os coríntios tinham de entender que é Deus quem concede os dons, e cada um
desses tem a sua importância no Corpo de Cristo. Portanto, eles não tinham de
que se gloriar. Paulo, entretanto, incentiva os crentes a buscar os dons
espirituais: “Segui a caridade e procurai com zelo os dons espirituais, mas
principalmente o de profetizar” (14.1). A busca pelos dons, porém, deve ser
feita com amor, não tendo como motivação a disputa; tudo tem de ser feito com
decência e ordem.
A nulidade dos dons sem caridade. Os dons espirituais devem ser buscados com zelo e colocados em prática com
amor. Profetizar, ou exibir qualquer das manifestações do Espírito Santo sem a
prática do amor em nada resulta, afirma o apóstolo em 1 Coríntios 13.1-3.
A perenidade do amor. O amor é mais importante
que os dons espirituais, pois ele nos acompanhará até mesmo no céu, ao passo
que os dons espirituais são transitórios (13.8-10,13). Eles cessarão com o fim
das atividades da Igreja de Cristo na terra.
O DOM DE PROFECIA
(14.3)
1. Edificação. Todas as profecias
devem ser devidamente julgadas à luz da Bíblia, a fim de que não venham causar
confusão à igreja nem abalar a fé dos mais fracos. Há certos grupos que, sem o
conhecimento do pastor, reúnem-se em casas e põem-se a profetizar segundo o seu
bel prazer, com o intuito de manipular a fé dos imprudentes. Não podemos
esquecer-nos de que um dos principais objetivos da profecia é a edificação dos
fiéis.
Exortação. A palavra original
aqui para “exortação” é paraklēsis,
de onde procede o substantivo parákletos — “defensor, advogado, intercessor,
auxiliador, consolador, conselheiro” — que Jesus empregou para referir-se ao
Espírito Santo (Jo 14.16,26; 15.26; 16.7). O referido termo também é empregado
para o próprio Cristo e traduzido por “advogado” (1 Jo 2.1). Todos esses
significados revelam a missão da profecia, pois o Espírito inspira o profeta a
animar, despertar, alertar e falar palavras de encorajamento tanto à Igreja
como a alguém em particular.
3. Consolação. A consolação pelo
Espírito fortalece a fé, produz nova expectativa, renova a esperança e elimina
os temores. Isso ajuda no fortalecimento e edificação da Igreja. Esse tríplice
propósito do dom de profecia demonstra porque o apóstolo insiste e incentiva os
crentes a buscarem essa dádiva celestial.
Problemas no exercício do dom de profecia na igreja são recorrentes;
existem desde os dias apostólicos. Isso, no entanto, não é motivo para se
desprezar a manifestação do Espírito Santo. O apóstolo Paulo, que lidou com
tais problemas, nunca deixou de incentivar a busca do referido dom. Por
conseguinte, não devemos desprezar as profecias (1 Ts 5.20). Que o Senhor nos
abençoe e conceda-nos graça para vivermos nos domínios inefáveis do Espírito.
Contudo, que todas as coisas sejam feitas “com decência e ordem”, segundo a
doutrina bíblica (1 Co 14.39,40).
“O problema que Paulo precisou lidar era o abuso das línguas sem
interpretação. Ele sabia que o Espírito quer usar a manifestação dos dons para
edificar a assembléia local espiritualmente e em número. Assim, ele contrasta
as línguas não interpretadas com a profecia. Quando as línguas não são
interpretadas, só Deus as entende. Nesse sentido aquele que fala em línguas
‘não fala aos homens, se não a Deus’. (Por conseguinte, ninguém na congregação
entende o que é dito ou aprende algo.) Ainda que o espírito humano seja
suscetível ao Espírito de Deus, e o que fala em línguas esteja sendo edificado,
tudo o que é dito permanece em ‘mistérios’ (verdades secretas, verdades do
evangelho; cf. 1 Co 2.7-10; Rm 16.25).Por outro lado, a profecia está na língua
que as pessoas entendem e apresenta uma mensagem espontânea, dada pelo
Espírito, que as edifica (as fortalece espiritualmente, desenvolve e confirma a
fé), as exorta (despertando-as e ajudando-as a avançar em fidelidade e amor) e
as consola (alegra, aviva e produz esperança e expectativa)”.
(notas HORTON, S. I & II Coríntios: Os problemas da Igreja e suas
soluções. RJ: 1.ed. CPAD,
2003, pp.130-1)
O amor na vida cristã
“V22. Mas o fruto do Espírito é amor, alegria, paz, paciência,
amabilidade, bondade, fidelidade. É notável a formulação desta frase em relação
ao versículo 19. A mudança de ‘obras’ para ‘fruto’ é importante porque remove a
ênfase do esforço humano. É significativo que Paulo use o singular ‘fruto’ e
não o plural ‘frutos’.
Encabeçando a lista está ágape que aparece sempre ao final dos catálogos
das virtudes e manifesta deste modo como princípio e fundamento de todas as
demais virtudes. Este amor foi derramado em nossos corações com o Espírito
Santo e se manifesta na fé enquanto amor ‘meu’. Ele dirige-se a Deus (Rm 8.28;
1 Co 2.9), a Cristo e ao próximo (Rm 13.8,10; Gl 5.13,14). O amor de Cristo
Jesus está dentro dos nossos corações, tendo sido derramado pelo Espírito Santo
que atua como força vital divina que funde todos os carismas, é invariável e
permanente”
(notas SOARES, G. Comentário
de Gálatas. 1.ed. RJ: CPAD,
2009, p.134).
A missão profética da Igreja
Missão: [do lat. missio] Transmissão
consciente e planejada das Boas Novas.
No período do Antigo Testamento, a voz de Deus na terra era manifesta
através dos profetas, sendo a nação de Israel o seu receptáculo. Em o Novo
Testamento, o Senhor continua a falar com e por meio de seus mensageiros. Essa
percepção indica-nos que a missão profética da Igreja consiste em levar o
evangelho de Jesus Cristo a todos os povos, pois é através desta que Deus ainda
fala.
A PERSEGUIÇÃO
Os primórdios da igreja em uma cidade. A missão da Igreja é proclamar de modo persistente e incessante a obra
redentora do Calvário a todos os povos. Jesus disse: “[...] e ser-me-eis
testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até os confins
da terra” (At 1.8). Entretanto, apesar dessa ordem e de já haver recebido o
Espírito Santo no Pentecostes, a Igreja permaneceu limitada a Jerusalém, pelo
menos até ao martírio de Estevão.
A dispersão dos discípulos (v.4). Após a morte de Estevão (primeiro mártir da Igreja), houve “uma grande
perseguição contra a igreja que estava em Jerusalém” (8.1), de tal modo que os
crentes tiveram que se dispersar. Os que “andavam dispersos iam por toda parte
anunciando a palavra” (v.4).
A expressão “por toda parte” incluía regiões como a Fenícia, Chipre e
Antioquia, muito além dos termos de Israel (At 11.19). Isso indica que a
determinação do Mestre começou a ser cumprida segundo os termos da Grande
Comissão. Certamente Deus permitiu tal perseguição com o intuito de retirar os
discípulos do seu comodismo e inércia.
Deus pode tornar o mal em bem. Assim como a diáspora judaica serviu para propagar o judaísmo, a dispersão
dos discípulos contribuiu para uma ampla e contínua disseminação do evangelho.
Como afirma a Palavra de Deus: “[...] todas as coisas contribuem juntamente
para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8.28).
OS
SAMARITANOS
A ordem de Jesus derruba barreiras étnicas. Após a sua ressurreição dentre os mortos, o Senhor Jesus Cristo mandou
seus discípulos pregar o evangelho em todas as partes, inclusive em Samaria (At
1.8).
Samaria (v.5). Inicialmente,
tratava-se do monte de Israel que Onri, pai do rei Acabe, comprara de Semer, de
onde vem o nome “Samaria” ou “Samária” (1 Rs 16.24). No período romano, a
cidade era conhecida pelo nome de Sebaste (venerável), nome dado por Herodes, o
Grande. A mistura étnico-religiosa dos moradores da região começou a se dar a
partir de 722 a.C, quando os assírios levaram as dez tribos do Norte para o
cativeiro (2 Rs 17.26,29,33).
Judeus e samaritanos. A animosidade no
relacionamento entre judeus e samaritanos nos dias de Jesus era algo muito
marcante (Lc 9.52,53; Jo 4.9). No entanto, o motivo para as desavenças era mais
uma questão religiosa (Jo 4.20) do que política, pois, na verdade, ambos
tiveram uma origem comum. Apesar desse clima tenso, Jesus amava-os, e seu
encontro com a mulher samaritana resultou na conversão de toda aquela aldeia
para o Reino de Deus (Jo 4.39-42).
O EVANGELHO
EM SAMARIA
“Descendo Filipe à cidade de Samaria, lhes pregava a Cristo” (v.5). Filipe era um dos sete homens escolhidos para servir como diácono. Não
demorou muito para que ele tornasse pública a sua vocação de evangelista (At
21.8). Seu companheiro Estevão, também um dos sete (At 6.5), fora assassinado,
sucedendo-se uma perseguição feroz liderada por Saulo (8.3). Naquela ocasião,
Filipe obedeceu ao ensino de Jesus Cristo, seguindo para outra cidade (Mt
10.23), a saber: Samaria.
A presença divina (vv.6,7). Os milagres que os discípulos realizavam em nome de Jesus evidenciavam a
presença de Deus entre os crentes. Não há como fugir: religião sem o
sobrenatural é mera filosofia. O próprio ministério de Jesus era baseado na
trilogia: pregação, ensino e milagres (Mt 4.23). Ele conferiu essa autoridade à
sua Igreja (Mt 10.7,8), e reiterou essa verdade diversas vezes em Atos
(8.15,17-19,39) e também em Marcos 16.17-20.
Nasce a igreja dos samaritanos (v.12), e os apóstolos Pedro e João
dão sequência ao trabalho (vv.14,15).
O tema central do evangelho é Jesus
Cristo. E Filipe foi fiel a isso, pois “pregava acerca do Reino de Deus e do
nome de Jesus Cristo” (v.12). Como a mensagem genuinamente evangelística e
cristocêntrica resulta em bênçãos divinas e conversões, havia muita alegria na
cidade (v.8). A pregação de Filipe era acompanhada de cura e libertação, por
isso, atraiu toda a população de Samaria. Muitos se converteram ao evangelho e,
como aconteceu em Jerusalém no Dia de Pentecostes, foi realizado um batismo em
água, que marcou o início da igreja naquela localidade.
Ora, a pregação da Palavra e a “colheita de almas”, se não forem seguidas
pelo ensino da Palavra (Mc 16.15; Mt 28.19,20), produzem crentes anêmicos.
Portanto, quando a igreja de Jerusalém tomou conhecimento da evangelização de
Samaria, enviou de imediato Pedro e João para discipular os novos irmãos. O
mesmo João que desejava fazer cair fogo do céu para consumi-los (Lc 9.54), é um
dos enviados para ajudá-los (At 8.14). A ajuda foi fundamental, uma vez que,
além de encorajar os novos convertidos com o ensino da Palavra, os apóstolos
foram usados por Deus para levar os irmãos a receberem o batismo no Espírito
Santo: “[...] tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito
Santo” (At 8.15,17).
A missão da Igreja é levar as boas-novas de salvação e, justamente, por
essa razão, o evangelho contempla todas as etnias; desconhece fronteiras. Onde
quer que ele chega, os preconceitos são removidos e o Espírito Santo começa a
operar. O Senhor Jesus eliminou as barreiras entre judeus e samaritanos e entre
judeus e gentios. A Bíblia classifica a humanidade em três grupos de povos: os
judeus, os gentios e a Igreja (1 Co 10.32,33). Temos o grande privilégio de
fazer parte do último, porém, temos o dever de anunciar aos demais a Palavra do
Senhor. Cumpramos, pois, integralmente, a missão profética da Igreja de
Cristo.
“Tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito Santo
(8.15).
Lucas acrescenta uma nota de explicação porque este é um evento
extraordinário, e não um padrão do século I ou de hoje. Eles oraram e impuseram
as mãos sobre eles ‘porque sobre nenhum deles [o Espírito Santo] havia ainda
descido’ (8.16,17). Por que aqui, e somente aqui, a oração e a imposição de
mãos estão associadas com a descida do Espírito Santo sobre os crentes em
Jesus?
Devemos nos lembrar de que a hostilidade profundamente enraizada e a
competição religiosa haviam existido entre os judeus e os samaritanos durante
muitas gerações. Ao dar o Espírito Santo por intermédio de Pedro e João, o
Senhor deixou claro (1) que a igreja era uma só, e (2) que os apóstolos eram
seus líderes autorizados. Sem esta evidência de unidade e autoridade, os
samaritanos poderiam perfeitamente bem ter iniciado um movimento dissidente. E
sem ela, os cristãos judeus poderiam não estar dispostos a aceitar os
samaritanos como membros, juntamente com eles, do Corpo de Cristo”.
(notas RICHARDS,
O. L. Comentário Histórico-Cultural
do Novo Testamento. RJ: CPAD,
2007, p.262)
O Ministério da Igreja
“A Igreja é o estandarte da reconciliação entre a humanidade e Deus, e dos
seres humanos entre si. [...] O ministério à Igreja inclui o compartilhar da
vida divina. Só temos a dinâmica daquela vida à medida que permanecermos nEle e
continuarmos repassando a sua vida uns aos outros dentro do Corpo. Esse
processo de edificação é descrito por Paulo como relacionamentos de mútua
confiança: pertencermos uns aos outros, precisamos uns dos outros, afetamos uns
aos outros (Ef 4.13-16). Essa mútua confiança inclui abnegação para ajudarmos a
suprir as necessidades uns dos outros. Não somos um clube social, mas sim, um
exército que exige mútua cooperação e solicitude ao enfrentarmos o mundo,
negarmos a carne e resistirmos ao diabo”.
(notas HORTON, S. M. (ed). Teologia Sistemática: Uma Perspectiva Pentecostal.
RJ: 12.ed. CPAD, 2009, pp.600-1).
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PAZ DO SENHOR
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