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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Avivamento em atos dos apostolos (4)



A Igreja em Antioquia 11:19-30 
Atividades de Paulo e Barnabé



Esta seção parece dar prosseguimento ao trecho de Atos 8:4, porquanto temos aqui a reiteração da declaração que a igreja foi dispersa, em face das perseguições que começavam a ficar mais severas. O autor sagrado, mui provavelmente, se alicerçou em alguma fonte informativa da igreja cristã de Antioquia e ele teria interrompido para falar-nos sobre a conversão de Saulo de Tarso (baseado em uma fonte informativa paulina), bem como sobre as atividades de Simão Pedro, que deram inicio, oficialmente, à igreja cristã gentílica, narrativas essas quase certamente fundamentadas em uma fonte informativa derivada de Jerusalém-Cesaréia. (Ver At 8:5 - 11:18).

O livro de Atos, a partir deste ponto, começa a expandir a narrativa sobre as várias atividades que constituíram a missão da igreja cristã entre os gentios, através das quais o cristianismo se tornou instituição verdadeiramente universal, para jamais retornar ao provincialismo do judaísmo. Da mesma forma que as atividades do apóstolo Pedro foram aprovadas pela igreja-mãe, em Jerusalém, embora houvesse ainda alguma oposição, assim também, na presente seção, a missão da igreja de Antioquia, entre os gentios, foi abençoada por Barnabé. Presumivelmente, pois, também foi afirmada pela igreja de Jerusalém, visto que Barnabé era representante da mesma. O autor sagrado, por conseguinte, esforça-se aqui por mostrar-nos que a igreja cristã dera um passo avante em unidade, e não de modo faccioso, dividido.

A história de Cornélio e seus familiares, bem como dos primórdios da igreja cristã em Cesaréia, foi apresentada de maneira dramática; mas, neste ponto, os inícios igualmente importantes do cristianismo, em Antioquia, são expostos como fatos consumados.

Paulo já estava agindo, levantando congregações cristãs na Síria e na Cilícia (ver Gl 1:21), tendo sido o verdadeiro originador da missão cristã entre os gentios, embora o livro de Atos não nos dê essa impressão, posto que a história de Cornélio e Pedro representa o início oficial da missão evangelizadora entre os povos gentílicos, provavelmente porque foi através desse incidente que a igreja-mãe, em Jerusalém, deu sanção oficial à mesma. Ou talvez tenha ocorrido simplesmente que Lucas não estava informado sobre os muitos anos de labor de Paulo, na Síria e na Cilícia, antes desse incidente em Cesaréia.

O inicio da igreja cristã de Antioquia não se deveu aos esforços de Paulo, mas antes, de algum irmão cujo nome não é dado, que fora forçado a fugir de Jerusalém, o qual, tendo chegado à região de Antioquia mui naturalmente continuou falando a respeito do Senhor Jesus, não tendo seguido a norma de falar exclusivamente aos judeus (ver o vs. 19). O vigésimo versículo não deixa perfeitamente claro se esses discípulos, cujo nome não nos é dado, eram judeus helenistas, de Jerusalém, que haviam sido forçados a fugir por causa das perseguições, ou eram nativos de Chipre e Cirene, provavelmente judeus helenistas que haviam estabelecido ali residência permanente. Esta última possibilidade parece mais provável.

A passagem de Atos 13:1 parece indicar, de forma bem definida, que se tratava de judeus cristãos, residentes permanentes em áreas ocupadas por gentios, aqueles que foram os responsáveis pela evangelização de Antioquia e redondezas. Por conseguinte, o apóstolo Paulo não foi o único fundador do cristianismo gentílico; a despeito do que, o grande espaço que Lucas dedica a ele, nessa história, demonstra, acima de qualquer dúvida, que Paulo era considerado a força mais poderosa do evangelismo entre os gentios. Não se há de duvidar que importante parte das atividades do apóstolo Paulo, em alguns territórios, se alicerçava em igrejas cristãs já fundadas, não sendo um trabalho inteiramente pioneiro.

11:19  Aqueles, pois, que foram dispersos pela tributação suscitado por causa de Estêvão, passaram até a Fenícia, Chipre e Antioquia, não anunciando a ninguém a palavra, senão somente aos judeus,

Neste ponto tem continuação a narrativa interrompida no trecho de Atos 8:4, a fim de que fossem feitas as inserções do material concernente à conversão de Saulo de Tarso e do material concernente ao início oficial da missão cristã entre os gentios, por parte de Simão Pedro. (Ver a lição 10).

Fenícia. 

O território que ficava nas costas orientais do mar Mediterrâneo, e cobria cerca de duzentos e quarenta quilômetros entre os rios Litani e Arvade (modernamente Líbano Latáquia do Sul). Esse lugar é mencionado exclusivamente no N.T. como lugar de refúgio para os cristãos perseguidos, os quais fugiram de Jerusalém por causa da perseguição que rebentou logo após o assassínio de Estêvão (ver At 11:19). Foi também o território através do qual passaram Paulo e Silas, em sua jornada de Samaria a Antioquia. (Ver At 15:3). Posteriormente, o apóstolo Paulo aportou na costa da Fenícia, perto de Tiro, em sua viagem a Jerusalém. (Ver At 21:2,3). Nos tempos do Senhor Jesus, a Fenícia era reputada como a região costeira em redor de Tiro e Sidom. (Ver Mt 15:21 e Lc 6:17). E os habitantes da região, que incluíam gregos, eram considerados «sírios-fenícios» (ver Mc 7:26).

Nos tempos do A.T., esse território era denominado, pelos hebreus, «Canaã» (ver Is 23:11). A palavra «cananeu» significa comerciante, e mui provavelmente esse foi o nome que os habitantes do lugar aplicaram a si mesmos. (Ver Gn 10:15). A origem dessas populações tão dadas às coisas do mar é extremamente obscura; mas sabemos, com base nos escritos de Heródoto (1.1. 11.89), que eles ali chegaram provenientes da área do golfo persa, através do mar Vermelho e primeiramente erigiram a cidade de Sidom. As principais cidades desse território eram Trípolis, Biblis, Sidom, Tiro e Berito. A área é fértil, a começar pelas terras altas no sopé do monte Líbano e descendo lentamente para o mar. Ocupava um lugar muito cobiçado para o comércio, desde os tempos mais remotos que se conhecem. Diz Plínio (L. 5, cap. 12) que a Fenícia se tornara famosa pela invenção das letras, das constelações e das artes navais e da guerra.

O território era conhecido por sua religião idolatra, o que foi condenado por Elias (ver I Rs 18-19) e por Isaías (ver Is 65:11). A arqueologia, quando do descobrimento dos textos de Ras Shamra, demonstrou que ali imperava o politeísmo, bem como uma mitologia natural centralizada ao redor de Baal, que também era conhecido pelo nome de Moloque (que significa «rei»), do deus-sol Sapis e deQuesepe, uma divindade pertencente ao submundo. Cultos surgidos posteriormente misturaram diversas ideias pertencentes a outras culturas, mas, de maneira geral, a área era estritamente pagã. Foi em um lugar assim, pois, que agora chegava o cristianismo.

Chipre.

 Trata-se da terceira maior ilha do mar Mediterrâneo, com 238 quilômetros de comprimento e 24 a 64 quilômetros de largura.Ali nasceu Barnabé. A história registrada menciona Chipre desde 1500 A.C. Diversos povos, entre os quais os egípcios, os fenícios, os gregos e os romanos, nela habitaram em estágios vários de sua história. Os missionários cristãos nela penetraram, pela primeira vez, através de uma de suas mais excelentes cidades portuárias, Salamina. Ainda existe um grande aqueduto nesse local, o qual era suficiente para suprir de água uma cidade com cerca de cem mil habitantes. Ali medrava grande população judaica, nos dias de Paulo, o que fica demonstrado pelo fato de haver bom número de sinagogas na cidade. O cristianismo lançou ali raízes firmes. Acredita-se que Barnabé foi martirizado na ilha de Chipre, em Salamina. Quando do concilio de Nicéia (325 D.C.), três bispos vieram de Chipre como representantes das igrejas dali, o que nos mostra até que ponto o cristianismo já se desenvolvera na ilha. Chipre parece nunca ter sido densamente povoada, pois Plínio alistou apenas quinze centros populacio­nais.

Antioquia. 

Essa cidade, localizada às margens do rio Orontes, foi o berço das missões cristãs. Era conhecida como Antioquia da Síria, a fim de ser distinguida de Antioquia da Pisídia. (Ver At 13:14). Antioquia da Síria foi fundada em cerca de 300 a.C. e cresceu a ponto de contar com numerosa população nos tempos de Paulo, incluindo muitos judeus, os quais, desde tempos remotos haviam obtido o direito de cidadania. Durante o período das guerras dos Macabeus, muitas famílias judaicas se estabeleceram em Antioquia. Na época de Paulo, era a terceira maior cidade do império romano, perdendo em importância numérica apenas para Roma e Alexandria. Os romanos fizeram-na capital da província romana da Síria.

Paulo começou e terminou ali a sua segunda viagem missionária.

 Não sabemos exatamente quão grande era a cidade nos dias de Paulo, mas, à base da informação dada por Crisóstomo, deve ter contado com uma população de cerca de oitocentos mil habitantes, em 300d.C. A atual Antikiyeh assinala o local da cidade antiga, mas é comparativamente pequena, cobrindo apenas pequena parte da área original. As escavações arqueológicas têm descoberto numerosas ruínas do passado, algumas das quais anteriores à era cristã. O circo, um dos maiores dos tempos romanos, a acrópole, numerosos banhos, vilas e cemitérios romanos, têm sido descobertos. Belos pisos de mosaico, que datam do período apostólico até o século VI D.C., também têm sido descobertos. O Caronion (busto de Caron, deus grego mitológico, que transportava as almas para o outro lado do rio Estige), de cerca de 170 A.C, com cinco metros e pouco de altura, entalhado em uma penedia de pedra calcária, a nordeste da cidade, continua visível, embora bastante estragada pelas intempéries. Nos dias de Paulo certamente ainda era um marco notável. Mais de uma vintena de edifícios cristãos tem sido ali descoberta, embora nenhuma dessas construções date dos dias apostólicos. O famoso Cálice de Antioquia foi descoberto ali por alguns trabalhadores que cavavam um poço, em 1910. No início foi declarado pertencente à última parte do século I D.C, e alguns chegaram a imaginar que fosse o cálice original em que Cristo serviu a Ceia. Há nele gravadas efígies que representam Cristo e os apóstolos. A maioria das autoridades concorda que se trata de um produto da primitiva arte cristã, datando entre os séculos II e VI de nossa era.

Antioquia sobre o Orontes era sede do legado imperial da província romana da Síria e Cilícia, e aparecia como a capital do oriente. Josefo, o historiador judeu do tempo dos apóstolos, diz-nos que era a terceira maior cidade do império romano, perdendo em importância somente para Roma e Alexandria. A grande maioria da população era síria, embora houvesse numerosa colônia judaica. Sua cultura era tipicamente greco-helenista. Seu porto era Selêucia (At l3:4), a qual era reputada cidade comercial e centro marítimo. Não muito distante dali ficava Dafné, quartel-general do culto de Apolo e Artêmisa, culto esse que se tornou famoso por sua degradação. Isso era tanto verdade que Juvenal, ao queixar-se da degradação moral que invadia Roma, disse que «...o Orontes sírio desaguou no Tibre» (Sátiras III. 62). O centro da igreja cristã passou de Jerusalém, seu berço original, para Antioquia da Síria, seu centro gentílico, pois a igreja cristã, cada vez mais, se foi tornando uma instituição gentílica. A tradição associa o apóstolo Pedro a essa cidade, considerando-o primeiro de seus bispos. Nomes ilustres posteriores, associados a essa cidade, foram Inácio João Crisóstomo,ambos chamados bispos de Antioquia. Crisóstomo foi grande escritor de comentários bíblicos e exerceu notável influência sobre o desenvolvimento doutrinário da igreja cristã.

A cidade de Antioquia foi fundada por Seleuco Nicator, um dos generais de Alexandre, em 300 A.C, que lhe deu nome em honra a seu pai, Antíoco.

 Antíoco havia devastado e poluído a cidade de Jerusalém, mas os seus sucessores, de conformidade com o que diz Josefo («Guerras dos Judeus» 1.7, cap. 3, seção 3), foram mais liberais, tendo criado uma boa atmosfera para o desenvolvimento do judaísmo naquele lugar; e isso teria atraído a muitos judeus, até que, finalmente, Antioquia se tornou grande centro da erudição judaica, bem como cidade onde havia numerosa colônia judaica. (Ver Talmude Hieros. Kiddishin, foi. 64.4). Com base nessa circunstância, o caminho ficou preparado para a entrada e o crescimento do cristianismo em Antioquia.

«...não anunciando a ninguém a palavra, senão somente aos judeus...» «...tão pouco compreendida foi a comissão de Cristo, para que se pregasse o evangelho a todas as nações, embora ela fosse tão clara; ou então assim foi ordenado pela providência divina, que embora devesse primeiramente ser pregado o evangelho a eles, isso perdurasse por pouco tempo apenas...» (John Gill, in loc). Tal tipo de atividade era apenas de esperar-se da parte de quem abandonara Jerusalém, porquanto o incidente de Cesaréia, que envolveu o apóstolo Pedro e a família de Cornélio, que assinalou o início da missão cristã entre os gentios, ainda não se tornara suficientemente conhecido ao redor.

11:20  Havia, porém, entre eles alguns cíprios e cirenenses, os quais, entrando em Antioquia, falaram também aos gregos, anunciando o Senhor Jesus.

«...Cirene...» Trata-se de um porto no norte da África, fundado pelos dórios, rico em várias mercadorias, como trigo, lã e tâmaras. Tornou-se parte integrante do império ptolemaico no século III A.C. Em cerca de 96 A.C. foi doado a Roma, tendo-se tornado província romana em 74 A.C. Josefo, tomando por empréstimo uma informação de Estrabão, diz-nos que a colônia judaica era ali encorajada e que a população judaica foi crescendo até constituir um dos quatro principais grupos étnicos da cidade. (Ver Antiq. xiv. 7.2). Simão, que levou a cruz do Senhor Jesus, era nativo desse lugar, segundo lemos em Mc 15:21 e seus paralelos, nos demais evangelhos. Houvesse representantes dessa cidade na multidão no dia de Pentecoste (ver At 2:10), e, evidentemente, em Jerusalém, antigos habitantes deCirene tinham a sua própria sinagoga (ver At 6:9).

«...falavam também aos gregos...» 

Talvez não tenham sabido acerca da obra de Paulo na Síria e na Cilícia e nem acerca das atividades de Pedro em Cesaréia, mas sentiam o mesmo impulso evangelístico, que os proibia falar exclusivamente aos judeus. O entendimento que possuíam sobre o caráter universal da mensagem de Cristo, sobre o fato de que não havia mais distinções entre judeus e gentios, e sobre a verdade de que as leis cerimoniais haviam sido abolidas na igreja cristã, talvez ainda fosse muito fraco; mas o amor de Cristo os compelia a não limitarem a sua mensagem. Pode-se observar o trecho de At 13:1, onde Lúcio de Cirene é mencionado juntamente com Barnabé, que era de Chipre, como um dos líderes da igreja cristã de Antioquia. Lúcio, pois, mui provavelmente, foi um dos homens que assim pregou, conforme está registrado aqui. Barnabé, conhecendo pessoalmente o lugar, foi posteriormente comissionado para investigar os acontecimentos dali e confirmar os resultados. (Ver os vss. 22 e ss.).

11:21  E a mão do Senhor era com eles, e grande número creu e se converteu ao Senhor.

Pregavam ao Senhor Jesus, ou talvez «Jesus como Senhor» (ver o vs. 20), conforme a frase pode ser interpretada; pois o evangelho, que pregavam, na realidade anuncia a todos os homens o senhorio de Cristo, sendo ele o alvo de toda a existência, o ponto central em torno do qual gira o plano do evangelho (ver Ef 1:10), e a imagem em que os remidos estão sendo transformados, sempre crescendo na obediência a ele, ou seja, participando de sua natureza moral, que os transforma em seres que compartilham de sua própria essência.

Por causa dessa mensagem, «...a mão do Senhor estava com eles...», o que quer dizer que o poder e a presença de Deus se manifestavam entre eles. Ora, isso é «teísmo», em contraste com o «deísmo». O teísmo ensina que Deus não somente criou todas as coisas, mas igualmente se faz presente em sua criação, recompensando e punindo aos homens, tendo ou não comunhão com eles. O deísmo, por sua vez, ensina que apesar de talvez existir uma força superior, esse poder, que pode ser pessoal ou não, abandonou de vez a sua criação, e nada acontece, de positivo ou de negativo, por motivo da ação de sua vontade. Esse «deus» deísta nem pune e nem galardoa aos homens.

A expressão «...mão do Senhor...» é uma expressão hebraica comum para dar a ideia da assistência de Deus aos homens, fortalecendo-os em sua vida. (Ver Êx 9:3 e Is 59:1). Podem-se ver outros usos dessa expressão nos trechos de Lc 1:66; At 4:28,30 e 13:11. Deve-se observar que a palavra «...Senhor...» torna-se aqui, uma alusão ao Senhor, pois ele é quem é o «Senhor» dos crentes, para quem todos eles se voltam. Voltar-se para Deus ou para o Senhor, pois, significa expressar arrependimento e propósito de vida, centralizados na mensagem do evangelho, o que, naturalmente, conduz os homens a Deus. Essa expressão também é empregada em outros trechos bíblicos. (Ver At 14:15; 15:3,19; 26:18,20 e I Ts 1:9).

«Sem essa influência acompanhadora, nem mesmo um apóstolo poderia fazer grande bem; e poderiam homens inferiores esperar serem capazes de convencer e de converter os pecadores, sem a mesma?» (Adam Clarke, in loc.),

«A 'mão', conforme se sabe bem, significa poder e força. Portanto, o que Lucas queria dizer é que Deus testificava com a sua ajuda presente, sobre o fato de que os gentios estavam sendo chamados juntamente com os judeus, através de sua orientação, para que se tornassem participantes da graça de Cristo». (Calvino, in loc).

«Através de manifestações visíveis que não podiam ser postas em dúvida, o Senhor mostrou que era com sua aprovação que deveriam prosseguir nessa predica...aos gentios». (Alford, in loc).

11:22  Chegou a noticia destas coisas aos ouvidos da igreja em Jerusalém; e enviaram Barnabé a Antioquia;

A igreja-mãe, em Jerusalém, atuava como uma espécie de diretora do movimento cristão inteiro, até esse ponto da narrativa, embora assim não tenha continuado a ser, após a destruição de Jerusalém, em 70 D.C., quando parece que Antioquia da Síria e Éfeso se tornaram os novos centros eclesiásticos principais, apesar de não terem jamais exercido aquela autoridade moral que evidentemente residira em Jerusalém. Lembremo-nos que os apóstolos habitavam em Jerusalém, tendo sido comissionados a coordenar a expansão do ministério cristão. Os apóstolos, pois, sentiam-se responsáveis por todo o avanço e o desenvolvimento da igreja, e ansiavam para que isso fosse feito conforme era mister, de maneira aprovada pelo Senhor.

O problema legalista havia causado consternação na igreja-mãe; e essa quiçá tenha sido uma das razões pelas quais os apóstolos viram ser necessário enviar Barnabé a Antioquia, a fim de que inspecionasse o trabalho que ali vinha sendo feito. Essa inspeção e o relatório subsequente seriam então considerados pelos oficiais da igreja de Jerusalém, e o selo resultante de aprovação da obra então a «oficializaria». Lembremo-nos que Pedro esteve em Samaria (oitavo capítulo do livro de Atos) a fim de realizar missão semelhante. Parece que todas as variegadas expressões da igreja cristã estavam sujeitas a uma aprovação apostólica direta ou indireta. Essa foi anatureza da missão de Barnabé, que lhe foi dada pelos apóstolos. Barnabé não figurava entre os doze apóstolos, mas, quanto à atividade e ao poder, parece ter excedido a maioria deles; e, a despeito da falta de designação oficial de um deles, parece ter funcionado na igreja primitiva como apóstolo. Foi a ele, pois, que se confiou essa missão. E foi uma escolha apropriada, de qualquer maneira, posto ter sido um judeu helenista, que compreendia o tipo de ministério levado a efeito fora de Jerusalém e em territórios gentílicos, melhor do que um apóstolo típico. O poder da influência de Barnabé, e a importância da obra em Antioquia, embora apresentados de forma um tanto casual aqui, eram evidentes pelo fato de que, através de sua liderança e labores em Antioquia é que resultará a transferência do centro da igreja de Jerusalém para Antioquia.

Barnabé parece ter exercido considerável influência sobre Paulo, e desde o princípio tiveram várias associações, tendo viajado juntos em jornadas missionárias. Paulo não demorou, entretanto, a ultrapassar a Barnabé em poder e autoridade, pois ele era, verdadeiramente, o apóstolo dos gentios. No entanto, Barnabé participou da formação de Paulo, pois é com frequência que um personagem de menor envergadura se mostra importantíssimo na formação de um homem verdadeiramente grande. Barnabé, tal como Pedro e a maioria dos oficiais da igreja de Jerusalém, tinha seus preconceitos judaicos pois era um «levita» (At 4:36), estando, presumivelmente, intimamente associado à corrente principal do pensamen­to judaico; mas foi capaz, a exemplo de Paulo e Pedro, de desligar-se desses preconceitos, tendo-se feito poderoso ministro do evangelho entre os gentios. Contudo, à semelhança de Pedro, em ocasião posterior, fez algumas concessões desnecessárias às pressões dos judaizantes, e, temporariamente pelo menos, negou o seu conhecimento recém-adquirido sobre como Deus não faz acepção de pessoas. Por causa desse retrocesso, tanto Barnabé como Pedro foram severamente criticados por Paulo. (Ver Gl 2:13).

A igreja-mãe de Jerusalém agia como coordenadora e inspetora da obra inteira do cristianismo. Alguns intérpretes têm considerado a questão da necessidade de inspeção por parte dos apóstolos, direta ou indireta, sobre a obra entre os gentios, pensando que isso teria sido um tema «artificial» de Lucas, isto é, contradito por tudo quanto se sabe acerca da autoridade apostólica, acerca de como se expandiu a igreja, antes da destruição de Jerusalém. O poder da igreja-mãe, entretanto, era perfeitamente real, embora a autoridade dos apóstolos em nada se assemelhasse à autoridade dos «bispos», como se vê hoje em dia. Pois os apóstolos agiam muito mais como uma força orientadora, aconselhadora. O trecho de Gl 2:11-13 e os decretos apostólicos, do décimo quinto capítulo do livro de Atos, deixam claro que a igreja de Jerusalém realmente reivindicava possuir autoridade sobre as igrejas de outras regiões, incluindo a Síria e a Cilícia.

«Realmente não há nenhuma dificuldade em supormos que Barnabé, que já era figura proeminente da igreja de Jerusalém, tenha sido enviado para investigar as atividades de seus compatriotas cipriotas». (G.H.C. Macgregor, in loc).

A seleção de Barnabé, para levar a efeito essa obra, mostra-nos bem claramente que a igreja de Jerusalém não queria usar de severidade, mas antes, de gentileza e de cautela, para com os labores cristãos entre os gentios.

11:23  o qual, quando chegou e viu a graça de Deus, se alegrou, e exortava a todos a perseverarem no Senhor com firmeza de coração;

«A astuciosa voluntariedade de Satanás é bem conhecida. Por isso, assim que ele percebe alguma porta aberta para o evangelho, esforça-se, por todos os meios, por corromper ali o que é sincero... Barnabé foi enviado a fim de fazer os crentes avançarem nos princípios da fé, para colocar em ordem certas coisas, para dar alguma forma ao edifício que fora iniciado, a fim de que houvesse um estado ordeiro na igreja».

«...Barnabé nada queria se não a glória de Cristo. Pois, ao dizer que viu a graça de Deus e que os exortou a avançarem, depreendemos que haviam sido bem ensinados 'aqueles crentes'. O regozijo foi um testemunho de sincera piedade. A ambição sempre se mostrará invejosa e maliciosa; e é por isso que muitos buscam ser louvados ao reprovarem a outros, posto que almejam mais a própria glória do que a glória de Cristo. Porém, os servos fiéis de Cristo devem regozijar-se (a exemplo de Barnabé) ao virem o progresso do evangelho, sem importar através de quem Deus queira que o seu nome se torne conhecido». (Calvino, in loc).

Importância do ensino cristão. Uma das importantes lições que nos dá este versículo é que, inerente ao tipo de ministério que Barnabé efetuou ali, havia a preocupação de instruir. Não se contentou ele em deixá-los onde os encontrara. A aura do reavivamento sempre diminui, e então chega a importante obra do ensino e do arraigamento, ou seja, da instrução sobre «todas as coisas» que o Senhor Jesus ensinara, para serem praticadas. É deveras estranho que alguns ministros do evangelho pensem ser tão importante e urgente a pregação do evangelho simples, mas, infelizmente, sem jamais mencionarem a questão da transformação do crente segundo a imagem do Senhor, quando isso é o coração mesmo do evangelho, sendo uma verdade de alcance muito maior do que já pudemos imaginar, por mais que refletíssemos, ignorando, dessa maneira, o ministério do ensino.

A salvação não consiste meramente em alguém vir a crer e fazer publicamente uma declaração de fé. Mas consiste em tudo quanto acontece a essa pessoa, até que ela chegue ao nível da perfeição que há em Cristo Jesus.

Barnabé, entretanto, ensinou que aqueles convertidos precisavam apegar-se à mensagem com «...firmeza de coração...» «O pregador vira a graça de Deus, e se regozijara com ela; mas sabia, conforme o sabem todos os verdadeiros mestres, que é possível à vontade de um indivíduo frustrar essa graça, pelo que a cooperação do crente, manifesta em uma resolução deliberada e firme, é necessária para que a boa obra seja levada a bom termo». (E.H. Plumptre, in loc).

11:24  porque era homem de bem, e cheio do Espirito Santo e de fé. E muita gente se uniu ao Senhor.

Deve-se observar, nesta altura do comentário, que as propriedades especiais de bondade, possuídas por Barnabé, bem como o seu excelente caráter cristão, são atribuídos ao ministério do Espírito Santo, tal como fora a eloquência de Estêvão. (Ver At 6:10). Neste ponto aprendemos o que já sabíamos, isto é, que em qualquer coisa em que um homem se pareça com Cristo, é porque o seu «alterego», o Espírito Santo, está operando em seu íntimo, produzindo os diversos aspectos do fruto do Espírito Santo, de acordo com a lista de suas virtudes, em Gl 5:22,23. Essas são as virtudes positivas da natureza moral de Cristo, a qual todos os crentes finalmente possuirão em sua perfeição, porque a perfeição moral, que as Escrituras nos ordenam possuirmos (ver Mt 5:48), não consiste em mera ausência do pecado. Pelo contrário, é uma participação ativa e positiva em todas as facetas da natureza de Cristo - o seu amor, a sua compaixão, a sua bondade, a sua longanimidade, a sua graça, a sua alegria, a sua paz, etc. Somente o Espírito de Deus pode assim transformar um homem, de modo a vir ele a participar, plena e verdadeiramente, dessas virtudes. O desígnio de Deus é que, eventualmente, todos os crentes venham a participar da completa imagem de Cristo, quando as suas virtudes tornar-se-ão verdadeiramente completas em cada crente. O processo será eterno.

«Ele é santo porque o Espírito de Santidade habita nele: não conta apenas com algumas visitas ou retiradas transitórias do Espírito; mas este reside em sua alma e enche o seu coração. O Espírito Santo é a luz do entendimento; é a 'discriminação' do juízo. É o propósito fixo e a 'determinação' da 'vontade' reta. É a 'pureza', seu amor, alegria, paz, gentileza, bondade, mansidão, controle próprio e fidelidade em suas afeições e paixões. Em suma, era o controle soberano sobre o seu coração; governa todas as paixões e é o motivo e o princípio de toda a ação justa. Ele é cheio de fé. Implicitamente dava crédito a seu Senhor: sabia que ele não pode mentir que a sua palavra não falha jamais; esperava não somente o cumprimento de todas as promessas, mas também todo grau de ajuda, de luz, de vida e deconsolo, que Deus, em qualquer ocasião, julgasse ser necessário para a sua igreja. Orava pela bênção divina e confiava que não estava orando em vão. Sua fé jamais fracassou, porque se apegava no Deus que não pode mudar. Contemplai ainda, pregadores do evangelho!um ministro original de Cristo. Emulai a sua piedade, a sua fé e a sua utilidade». (Adam Clarke, in loc).

A menção do importante papel desempenhado por Barnabé, na igreja cristã primitiva, é feita por Clemente, em sua obra RedactorAntijudaicus, pág. 109, onde se percebe como a sua reputação perdurou além de sua vida terrena, tendo sido famoso mesmo em séculos posteriores, inteiramente à parte dos registros do N.T.

Barnabé era «...homem bom...», no sentido de possuir «coração amplo», «mente liberal», «generosidade», e não meramente como quem obedecia a certo conjunto de regras. Ele se avantajava acima do estreito sectarismo judaico, de sua santidade meramente legalista. Não era apenas «justo», conforme eram considerados os estritos observadores da lei mosaica, mas era «bom» na manifestação pessoal e fervorosa das graças espirituais. «Sua benevolência impedia-o, eficazmente, de censurar qualquer coisa que fosse nova ou estranha entre aqueles pregadores aos gentios. levando-o a regozijar-se no sucesso deles». (Gloag, in loc).

«...muita gente...» Uma grande multidão foi acrescentada à igreja cristã, evidentemente para indicar esse aumento, além da menção do vigésimo primeiro versículo, como resultado direto da presença e do ministério de Barnabé. Esse tipo de ministério florescente e harmonizador, despido de inveja, gradualmente foi fazendo de Antioquia o grande centro do cristianismo. A glória da igreja cristã de Jerusalém foi diminuindo, pois a sua estrela já se apagava. Mas a estrela da graça de Deus subia sobre Antioquia, e ali o Espírito de Deus tomou residência. Que tantas pessoas tenham sido adicionadas à igreja, não é para admirar, posto contarem com ministros como aqueles, ouvindo elas o evangelho de Cristo, pregado e recebido pelo poder do Espírito Santo.

11:25  Partiu, pois, Barnabé para Tarso, em busca de Saulo;

Paulo chega a Antioquia; vss. 25 e 26: Desde a sua conversão Paulo estivera atarefado nas regiões da Síria e Cilícia, e não se há de duvidar que se mostrara ativo especialmente ao redor de sua cidade natal de Tarso, pregando o evangelho e estabelecendo igrejas. Por conseguinte, foi ele o verdadeiro pioneiro da igreja cristã entre os gentios, e o seu ministério marcou o início real da missão cristã entre os povos gentílicos, embora, «oficialmente» falando, segundo está registrado por Lucas em seu livro de Atos, essa distinção tenha sido conferida a Pedro, em sua atividade em Cesaréia, junto à família de Cornélio.

Desde sua conversão, até sua chegada em Antioquia, cerca de catorze anos se tinham passado na vida de Paulo, pois diz ele que fora«...para as regiões da Síria e da Cilícia» (Gl 1:21). E então, apos catorze anos, ele visitou novamente Jerusalém. A maior parte desse tempo ele passou, mui provavelmente, em Tarso, para o qual lugar, segundo diz Lucas, ele foi imediatamente, depois de sua primeira visita a Jerusalém. (Ver At 9:30). Em Atos 15:41 encontramos a menção à igreja na Síria e na Cilícia, que já estava estabelecida quando Paulo e Silas ali chegaram, embora não nos seja dito como tal igreja fora iniciada. Por conseguinte, parece que a narrativa do livro de Atos deixa em branco um período de catorze anos no ministério do apóstolo Paulo. Esse hiato se reveste de alguma importância, posto que foi então que realmente se estabeleceu a missão de evangelização cristã entre os gentios.

Essa omissão, da parte de Lucas, tem deixado os intérpretes perplexos, embora a maioria usualmente resolva que é melhor seguirmos a informação que nos é dada pelas epístolas paulinas, e não os informes do livro de Atos, havendo algumas diferenças nesses relatos. Alguns estudiosos têm conjeturado que os «catorze» anos de Gl 2:1 deveriam ser «quatro» anos, e que algum erro primitivo foi feito aqui, ou pelo próprio Paulo ou por algum escriba primitivo. Contudo, nenhum manuscrito contem o número quatro, pelo que também esse tipo de interpretação se alicerça inteiramente em conjeturas. Seja como for, apesar da suposição de que seriam «quatro anos» para fazer á Omissão de Lucas tornar-se cronologicamente menor, materialmente falando, isso não faz diferença alguma, porquanto Lucas continuaria não nos fornecendo qualquer informe sobre o ministério de Paulo durante esse tempo —ou quatro ou catorze anos. E assim, permanece de pé a principal dificuldade.

A fim de ser preenchido esse período de catorze anos, alguns estudiosos sugerem que a—a longa lista—sofrimentos, pelos quais Paulopassou, segundo o registro de II Co 11:23-27, deve ser encaixada dentro desse período, pelo menos parcialmente. Mas isso, infelizmente, tem de permanecer dentro das interpretações especulativas. Não sabemos dizer por que Lucas omitiu esse período do ministério de Paulo; mas o mais provável é que ele simplesmente não tenha contado com qualquer informe histórico a respeito. Por qual motivo ele não conversara com Paulo, acerca desse período, ao formular suas anotações, também não sabemos dizê-lo, posto que, como companheiro de viagens daquele apóstolo, teria tido fácil acesso a esse material informativo. Alguns talvez encarem isso como prova que Lucas não foi o autor dessa narrativa histórica, e isso deve ser considerado como um problema sério. Entretanto, os pontos em favor da autoria de Lucas em muito contrabalançam essa objeção.

A omissão acerca desse importante período da vida de Paulo, na história do livro de Atos, pode ter uma implicação positiva, ou seja, que Lucas não fabricou suas narrativas, meramente pelo uso de certas epístolas paulinas; antes, se utilizou de outras fontes informativas, ainda que estas fossem incompletas, em certos casos. Por exemplo, a simples leitura do primeiro capítulo da epístola aos Gálatas poderia ter levado Lucas a inventar muitas histórias sobre o ministério «siro-ciliciano» de Paulo. Ao invés disso, no livro de Atos, o primeiro ministério significativo de Paulo é a sua primeira viagem «missionária», e At 13:1-14:28. A verdade é que Lucas, valendo-se dos informes de que dispunha, relatou histórias verídicas, e, embora não completas, pelo menos têm o mérito de cativar a nossa confiança.

Weiss, seguindo essa linha de raciocínio, apresenta a seguinte observação: «...um fenômeno da mais elevada importância, em conexão com a origem das narrativas do livro de Atos. Se porventura fossem fictícias, talvez baseadas na epístola de Gálatas, certamente encontraríamos algumas histórias sobre esse período». (Ver History of Primitive Christianity, Macmillan and Co., Nova Iorque, I, pág.205).

Embora não possuamos a mais leve informação sobre como Paulo se manteve ocupado durante esse período, pelo menos sabemos que o seu trabalho foi significativo, e que, ao lançar-se em sua primeira viagem «missionária», já era um missionário veterano. «Não podemos insistir demasiadamente sobre o fato de que o real desenvolvimento de Paulo, tanto como cristão quanto como teólogo, já estava completo nesse período que é tão obscuro para nos, e que, em suas epístolas estamos tratando com um homem plenamente amadurecido». (Ibid., I, pág. 206).

Os dois estiveram juntos em Antioquia pelo espaço de um ano (ver o próximo versículo). Sobre esse tempo o próprio Paulo nada diz, provavelmente porque no primeiro e no segundo capítulos de sua epístola aos Gálatas ele se tenha preocupado mais em narrar os seus contatos com os demais apóstolos, o que dizia respeito à sua afirmação que ele não obteve sua doutrina em consulta com eles, mas antes, independentemente, tendo-a recebido diretamente do Senhor Jesus; por isso mesmo, qualquer menção do fato de que estivera trabalhando com Barnabé seria incidental para o seu propósito. Com base em Gl 2:11-13 ficamos sabendo que quatro anos mais tarde Paulo e Barnabé estavam novamente trabalhando juntos em Antioquia, cidade à qual retornaram depois de terem completado a primeira viagem missionária (ver At 14:26). Por quanto tempo Paulo e Barnabé labutaram em Antioquia, antes de se lançarem em sua primeira jornada missionária, não sabemos precisar; mas a circunstância de que ambos esses ministros estiveram ali por algum tempo, produziu o fenômeno de grande desenvolvimento daquela igreja cristã do mundo gentílico, em que Antioquia foi elevada à posição de nova capital da igreja de Cristo.

«A primeira coisa que Barnabé fez, quando chegou a Antioquia, foi lembrar-se de Paulo. Sabia que precisava de ajuda, se tivesse de aproveitar ao máximo as oportunidades que a cidade de Antioquia oferecia à igreja cristã». (Theodore P. Ferris, in loc).

«Barnabé mui provavelmente sabia que Saulo era vaso escolhido por Deus (ver At 9:15) para o trabalho entre os gentios. Naturalmente que sabia do trabalho efetuado por Saulo entre os helenistas de Jerusalém (ver At 9:29), bem como já recebera notícias de sua obra na Cilícia e na Síria. E, assim sendo, foi a Tarso ao perceber que precisava de ajuda. 'Não tinha ele coisa alguma daquela baixeza que não pode tolerar a presença de um possível rival' (Furneaux). Barnabé reconhecia suas próprias limitações e sabia onde se encontrava o homem do destino, para aquela crise, o homem que já recebera o selo aprovador de Deus. O momento e o homem certo se encontraram, quando Barnabé trouxe Saulo para Antioquia. A porta estava aberta, e o homem estava preparado, muito mais do que quando o Senhor Jesus o chamara na estrada de Damasco. Os anos passados na Cilícia e na Síria não haviam sido em vão, pois ele não estivera indolente... Deus sempre tem um homem preparado para qualquer grande emergência em seu reino. O convite feito por Barnabé foi simplesmente a repetição do chamamento de Cristo. Por isso Saulo atendeu ao mesmo». (Robertson, in loc).

11:26  e, tendo-o achado, o levou para Antioquia. E durante um ano inteiro reuniram-se naquela igreja e instruíram muita gente; e em Antioquia os discípulos pela primeira vez foram chamados cristãos.

CRISTÃOS: grego, «christianós», seguidores de Cristo.

A cunhagem desse vocábulo—cristão—segue a ordem de termos como «herodianos» (ver Mt 22:16; no grego, «herodianoi», isto é, seguidores de Herodes) ou «cesarianos» (seguidores de César). Deissman, em sua obra Light from the Ancient East, pág. 377, dá exemplos do genitivo kaisaros, que também significa «pertencente a César», tal como o adjetivo comum «cesariano».

A palavra «...chamados...» (no grego, «chrematisai») denota «obter o nome». O termo «cristão» (no grego, «christianous») se compõe da palavra grega que significa «Messias» ou «Cristo» (ungido), mais a terminação latina usual que significa «partidário de». Por conseguinte, em Antioquia, alguém inventou uma nova palavra, que agora é usada entre nós há quase vinte séculos. Não é muito provável que os judeus tenham cunhado o termo, pois jamais teriam elevado a nova seita aplicando-lhe qualquer forma ou derivado da palavra hebraica «messiah» (ungido). Também é perfeitamente evidente que os próprios discípulos de Cristo não inventaram essa designação. O mais provável é que tenha sido criação dos gentios de Antioquia, familiarizados como estavam tanto com o latim como com o grego, sabendo que os discípulos de Jesus chamavam-no pelo título de «Cristo». Usaram tal palavra, pois, e latinizaram-na um tanto, a fim de dar-lhe o sentido de «partidários de», «seguidores de», «aderentes de» Cristo. Os judeus costumavam chamar os cristãos pelo apelido de «nazarenos», o que, para eles, era termo depreciativo, porquanto Nazaré era uma aldeia de ínfima significação. Nada de bom se esperava que procedesse dali (ver Jo 1:46), quanto menos a maior de todas as figuras humanas, o próprio Messias... Assim, pois, os judeus usavam esse apelido por derrisão, sarcasticamente. Os próprios crentes se chamavam de aprendizes (discípulos) ou «seguidores» de Cristo.

Existem três empregos diferentes dessa palavra, nas páginas do N.T. a fim de indicar os seguidores de Cristo. O primeiro emprego é o que aqui encontramos, utilizado pelos gentios hostis, a fim de designarem os seguidores da nova religião. Em At 26:28 encontramos o segundo emprego, evidentemente como termo depreciativo, usado por Agripa. E a passagem de I Pe 4:16 emprega essa palavra, referindo-se à comunidade cristã. Mui provavelmente, quando essa epístola petrina foi escrita, os crentes já usavam livremente a designação cristãos para indicarem a si mesmos, embora a perseguição de que Pedro fala, contra os cristãos, provavelmente subentende que Roma perseguia os «cristãos» como indivíduos desprezíveis, usando a palavra em sentido pejorativo. Pedro, pois, escreveu que se alguém viesse a sofrer como «...cristão...», não deveria encarar com alarme tal perseguição, pois isso era, na realidade, sinal de que estava sendo elevadamente favorecido pelo Senhor. Pois, por essa altura primitiva de sua história, era motivo de ufania para os crentes o fato de serem chamados «cristãos».

Portanto, foi em Antioquia que esse honroso título de «cristão» passou a ser usado para designar os crentes em Jesus. O famoso Inácio foi bispo de Antioquia, e mais tarde sofreu martírio em Roma. E em Antioquia João Crisóstomo pregava seus poderosíssimos sermões, tendo escrito os seus notáveis comentários naquela cidade. Antioquia, pois, se tornou famosa dentro da tradição cristã, tendo servido de capital do movimento cristão quando se apagou a estrela de Jerusalém.

Como curiosidade histórica, é possível que muitos pagãos tenham chamado os crentes de «crestãos», e não de «cristãos», não estando bem familiarizados com o conceito hebreu de «Cristo» ou «Messias», mas antes, confundindo essa palavra com termo similar, «chrestus»,que é nome próprio até hoje bastante comum na Grécia e significa «bom». Alguns pagãos provavelmente pensavam que os discípulos eram os «bons» («chrestianos») e não «cristãos» ou «seguidores de Cristo». Esse parece ter sido o ponto de vista de Suetônio (historiador romano), quando disse que os judeus haviam feito perturbações em Roma, sob a «instigação de Cresto» (ver Cláudio, 25). Ver também Tertuliano, Apologia, cap. 3, que exibe esse uso do termo).

«Cristão, por conseguinte, é a mais elevada designação que um ser humano qualquer pode ter à face da terra; e recebê-la da parte de Deus, como prece que sucedeu, torna-a um título gloriosíssimo!» (Adam Clarke, in loc).

Nos escritos dos pais da igreja cristã há diversos usos primitivos desse vocábulo, o que mostra como tal título veio a tornar-se, desde quase o princípio, uma designação honrosa, ainda que originalmente tivesse sido palavra cunhada pelos pagãos de Antioquia. (Ver Inácio, Epístolas, Rm 3:3; Mgn. iv; Ef 11:2; Mart. Plvc. x e xii: 1,2). Nos escritos de Gregório (Naz. Orat. iv (sobre Jul. 1 86, par. 114), ficamos sabendo que os judeus costumavam fazer objeção a esse nome como designação para indicar os seguidores de Jesus, e preferiam chamá-los «galileus».

«...Cristo deixou surgir esse nome... como um pendão, mediante o que se viesse a conhecer, por todo o mundo, que havia um povo cujo capitão era Cristo, o qual glorificava ao seu nome». (Calvino, in loc).

11:27  Naqueles dias desceram profetas de Jerusalém para Antioquia;

11:27 - Vss. 27-30 - A visita a Jerusalém, ao tempo da fome.

Esta breve seção tem produzido toda sorte de problemas históricos e de interpretação. Parece-nos que se por essa altura a igreja cristã de Antioquia enviava bens materiais a Jerusalém, a fim de ajudar a aliviar a situação de pobreza a de fome que ali imperava, que já se dera a mudança de poder, de Jerusalém para Antioquia, ou, pelo menos, que estava ocorrendo então essa transferência do poder central de Jerusalém para aquela cidade. Alguns eruditos, entretanto, têm duvidado da autenticidade de toda essa seção, com base nos seguintes argumentos:

1. Nenhuma profecia, segundo lemos aqui, teria sido feita, tudo não passando de uma reiteração da narrativa de At 21:10,11, onde encontramos o mesmo profeta, Ágabo, em operação. Essa narrativa, pois, no presente texto, teria sido criação do autor sagrado, que simplesmente duplicou eventos com relação a Ágabo. Observe-se que naquela seção há certa similaridade de conteúdo, o que tem dado origem a esta sugestão.

2. Alguns estudiosos duvidam da autenticidade histórica desta seção, visto que evidentemente ela não é aludida na epístola aos Gálatas, e nem em qualquer das demais epístolas paulinas, como parte das atividades de Paulo. A visita descrita por esse apóstolo, no trecho de Gl 1:18-24, corresponde ao que se lê em At 9:26-29, ao passo que o informe de Gl 2:1-10 corresponde ao que está registrado em At 15:2-29, visita essa que, ordinariamente, e chamada de «visita ao concilio».

3. A visita aqui historiada —At 11:27-30 —aparentemente teria ocorrido entre as duas outras visitas ali mencionadas; mas quanto a isso não contamos com qualquer registro nas epístolas paulinas. Os intérpretes que assim dizem pensam que é fatal, para esta seção que ora comentamos, a observação de que a epístola aos Gálatas certamente teria algum registro sobre essa visita, se realmente ela houvesse ocorrido, posto que o apóstolo Paulo ansiava por registrar todas as suas atividades relacionadas a Jerusalém, porquanto queria demonstrar que recebera o evangelho independentemente dos outros apóstolos, e, sim, diretamente da parte do Senhor Jesus, o que o qualificava a ser um apóstolo, tal como aqueles outros, devido ao fato de que o Senhor tratara diretamente com ele, aparecendo-lhe pessoalmente, do mesmo modo que fizera com os demais apóstolos. Ora, dizem ainda os mesmos intérpretes, que se tivesse havido alguma outra visita a Jerusalém, que não foi mencionada, poder-se-ia imaginar que, nessa oportunidade, Paulo poderia ter-se consultado com os apóstolos, e que o seu evangelho era uma mensagem emprestada de outros.
comentario biblico Normam R.Champlin novo testamento


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