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sábado, 27 de fevereiro de 2016

Teologia Sistematica O Pecado

            
                


               O Caráter Essencial do Primeiro Pecado  



O pecado é um dos mais tristes fenômenos da vida humana, e também o mais co­mum. Faz parte da experiência comum da humanidade e, portanto, impõe-se à atenção de todos os que não fecham deliberadamente os olhos para as realidades da vida humana. Há os que sonham por algum tempo com a bondade essencial do homem e falam com indulgência das palavras e ações isoladas que não se enquadram nos padrões éticos da boa sociedade, descrevendo-as como simples paixões e fraquezas, pelas quais o homem não é responsável e as quais prontamente cedem a medidas corretivas; mas, com o correr do tempo, com o fracasso de todas as medidas de reforma externa, e com a verificação de que a supressão de um mal só serve para liberar outro, essas pessoas ficam inevitavelmente desiludidas. Tomam consciência do fato de que estiveram lutando meramente com os sintomas de uma doença arraigada profundamente e que defron­tam, não apenas o problema dos pecados, isto é, dos atos pecaminosos isolados, mas o problema muito maior e mais profundo do pecado, de um mal inerente à natureza hu­mana. É exatamente o que estamos começando a presenciar na época atual. Muitos modernistas de hoje não hesitam em dizer que a doutrina de Rousseau a respeito da bondade inerente do homem evidenciou-se como um dos mais perniciosos ensinos do período do Iluminismo, e agora reclamam a presença de maior medida de realismo no reconhecimento do pecado. Assim, WalterHorton, que pleiteia uma teologia realis­ta e acredita que esta requer a aceitação de alguns princípios marxistas, diz: "Creio que o cristianismo ortodoxo representa uma profunda compreensão de todo o predicamento humano. Creio que a dificuldade humana básica é aquela perversão da vonta­de, aquela traição contra a vontade divina, que se chama pecado; e creio que o peca­do é, num certo sentido, uma enfermidade racial, transmissível de geração a geração. Ao afirmar essas coisas, os 'pais' cristãos e os reformadores protestantes falavam como realistas, e podiam ter coletado pilhas de provas empíricas para suporte das suas idéias". Em vista do fato de que o pecado é real e ninguém pode livrar-se dele na presente existência, não admira que os filósofos, como os teólogos, se decidiram a atracar-se com o problema do pecado, conquanto na filosofia seja mais conhecido como o problema do mal que do pecado. Consideraremos abreviadamente algumas das mais importantes teorias filosóficas sobre o mal.

Teorias Filosóficas a Respeito da Natureza do Mal 
1. TEORIA DUALISTA. Esta é uma das teorias que foram comuns na filosofia grega. Na forma do gnosticismo, conseguiu penetrar na Igreja Primitiva. Admite a existência de um princípio eterno do mal, e sustenta que no homem o espírito representa o princípio do bem, e o corpo, o do mal. É objetável por várias razões: (a) É posição filosoficamente insustentável que haja fora de Deus algo que seja eterno e independente da Sua vontade. (b) Essa teoria retira do pecado o seu caráter ético, fazendo dele uma coisa puramente físi­ca e independente da vontade humana, e, deste modo, destrói na verdade a idéia de peca­do, (c) Também elimina a responsabilidade do homem, apresentando o pecado como uma necessidade ou inevitabilidade física. Segundo essa teoria, o único meio de escaparmos do pecado consiste em livrar-nos do corpo. 
2. TEORIA DE QUE O PECADO É MERA PRIVAÇÃO. De acordo com Leibnitz, o pre­sente mundo é o melhor mundo possível. A existência do pecado deve ser considerada inevitável. O pecado não pode ser atribuído à ação pessoal de Deus e, portanto, deve ser considerado como simples negação ou privação, sem necessidade de nenhuma causa eficiente. As limitações da criatura o tornam inevitável. Essa teoria torna o pecado um mal necessário, desde que as criaturas são necessariamente limitadas, e o pecado é uma conseqüência inevitável dessa limitação. Sua tentativa de evitar fazer de Deus o autor do pecado não tem bom êxito pois, mesmo que o pecado fosse apenas uma negação sem nenhuma causa eficiente, Deus seria, não obstante, o autor da limitação da qual ele resultaria. Além disso, a teoria tende a obliterar a distinção entre o mal moral e o mal fí­sico, visto que descreve o pecado como pouco mais que um infortúnio sobrevindo ao homem. Conseqüentemente, propende a embotar no homem a noção do mal ou da cor­rupção do pecado, destruo o sentimento de culpa e abrogar a responsabilidade moral do ser humano. 
3. TEORIA DE QUE O PECADO É UMA ILUSÃO. Para Spinoza, como para Leibnitz, o pecado é simplesmente um defeito, uma limitação da qual o homem está cônscio; mas en­quanto Leibnitz considera a noção do mal, que surge dessa limitação, como necessária, Spinoza sustenta que a resultante consciência do pecado deve-se simplesmente à inade­quação do conhecimento do homem, que não consegue ver tudo sub specie aeternitatis, is­to é, em unidade com a eterna e infinita essência de Deus. Se o conhecimento do homem fosse adequado, de sorte que visse tudo em Deus, ele não teria nenhuma idéia do pecado; este seria simplesmente inexistente para ele. Mas essa teoria, que apresenta o pecado co­mo uma coisa puramente negativa, não explica os seus terríveis resultados que a experiên­cia universal da humanidade atesta da maneira mais convincente. Levada adiante coeren­temente, ela abroga(ab-rogar: Jur. Fazer cessar a existência ou a obrigatoriedade de (uma lei) em sua totalidade) todas as distinções éticas e reduz conceitos como "caráter moral" e "conduta moral" a frases sem sentido. De fato, reduz toda a vida do homem a uma ilusão: seu conhecimento, sua experiência, o testemunho da consciência, e assim por diante, pois todo o seu conhecimento é inadequado. Além disso, vai contra a experiência da humani­dade, que atesta que os mais inteligentes são, muitas vezes, os maiores pecadores, sendo Satanás o maior de todos. 
4. TEORIA DE QUE O PECADO É FALTA DE CONSCIÊNCIA DE DEUS, PELO FATO DE ESTAR A NATUREZA HUMANA PRESA AOS SENTIDOS. É o conceito de Schleiermacher. Segundo ele, a consciência do pecado, da parte do homem, depende da sua cons­ciência de Deus. Quando o senso da realidade de Deus se desperta no homem, imediata­mente toma consciência da oposição da sua natureza inferior àquela noção. Esta oposição segue-se da própria constituição do seu ser, de sua natureza sensorial, presa aos sentidos, da ligação da alma com um organismo físico. É, pois, uma imperfeição inerente, mas uma imperfeição que o homem sente como pecado e culpa. Contudo, isso não faz de Deus o autor do pecado, uma vez que o homem concebe erroneamente essa imperfeição como pecado. O pecado não tem existência objetiva, mas existe somente na consciência do homem. Mas essa teoria declara o homem constitutivamente mau. O mal estava presente no homem mesmo em seu estado original, quando sua consciência de Deus não era su­ficientemente forte para dominar a natureza sensorial do homem, presa aos sentidos. Isso está em flagrante oposição à Escritura, quando esta sustenta que o homem erronea­mente julga que esse mal é o pecado e, assim, entende o pecado e a culpa como puramente subjetivos. E embora Schleiermacher queira evitar esta conclusão, faz de Deus o autor do pecado, responsável por este, pois Ele é o Criador da natureza sensorial do homem. A teoria repousa também numa incompleta indução dos fatos, visto que não leva em conta o fato de que muitos dos mais odiosos pecados do homem não pertencem à sua natureza física, e, sim, à sua natureza espiritual, como por exemplo a avareza, a inveja, o orgulho, a malícia, e outros. Além disso, leva às conclusões mais absurdas como, por exemplo, a de que o ascetismo, enfraquecendo a natureza sensorial, o domínio dos sentidos, necessa­riamente enfraquece a força do pecado; a de que o homem vai ficando menos pecador, conforme se vão enfraquecendo os seus sentidos; a de que o único redentor é a morte; e a de que os espíritos desencarnados ou incorpóreos, o diabo inclusive, não têm nenhum pecado. 
5. TEORIA DO PECADO COMO FALTA DE CONFIANÇA EM DEUS E COMO OPO­SIÇÃO AO SEU REINO, DEVIDO À IGNORÂNCIA. Como Schleiermacher,Ritschl também dá ênfase ao fato de que o pecado é entendido somente do ponto de vista da consciência cristã. Os que se acham fora dos limites da religião cristã, e os que estão ainda alheios à experiência da redenção, não têm nenhum conhecimento do pecado. Sob a influência da obra redentora de Deus, o homem toma consciência da sua falta de confiança em Deus e da sua oposição ao reino de Deus, que constitui o bem supremo. O pecado não é determi­nado pela atitude do homem para com a lei de Deus, mas por sua relação com o propósito de Deus, que visa ao estabelecimento do Reino. O homem imputa a si próprio, como cul­pa, o seu fracasso em não conseguir tornar seu o propósito de Deus, mas Deus o considera apenas como ignorância e, porque ignorância, é perdoável. Esse conceito de Ritschl lem­bra-nos, por contraste, a máxima grega: Conhecimento é virtude. Absolutamente não faz justiça à posição escriturística de que o pecado é, acima de tudo, transgressão da lei de Deus e, portanto, torna o homem culpado à vista de Deus e merecedor de condenação. Além disso, a idéia de que o pecado é ignorância vai contra a voz da experiência cristã. O homem que leva sobre si o fardo do senso de pecado, certamente não pensa nisso daquele modo. Também é grato porque não somente os pecados cometidos na ignorância são perdoáveis, mas igualmente todos os demais, com a única exceção da blasfêmia contra o Espí­rito Santo. 
6. TEORIA DE QUE O PECADO É EGOÍSMO. Assumem essa posição Mueller e A. H. Strong, entre outros. Alguns que assumem essa posição concebem o egoísmo ape­nas como o oposto do altruísmo ou da generosidade; outros o entendem como a escolha do ego, em vez de Deus, como o supremo objeto do amor. Ora, essa teoria, especialmente quando concebe o egoísmo como a colocação do ego no lugar de Deus, é, de longe, a melhor das teorias mencionadas. Todavia, dificilmente se pode dizer que é satisfatória. Embora todo egoísmo seja pecado, e haja um elemento de egoísmo em todo pecado, não se pode dizer que o egoísmo é a essência do pecado. Só se pode definir propriamente o pecado com referência à lei de Deus, referência completamente ausente da definição em foco. Além disso, há muitos pecados nos quais o egoísmo está longe de ser o princípio dominante. Quando um pai é abatido pela pobreza e vê a esposa e os filhos esmorecidos por falta de alimento, e, em seu desesperado desejo de socorrê-los acaba recorrendo ao roubo, dificilmente se pode dizer que isso é puro egoísmo. Até pode ser que a idéia de ego estivesse inteiramente ausente. A inimizade para com Deus, a dureza de coração, a impenitência e a incredulidade são pecados hediondos, mas não podem ser simplesmente classi­ficados como egoísmo. E certamente a idéia de que toda virtude é desinteresse próprio ou generosidade, o que parece constituir um necessário corolário da teoria que estamos con­siderando, não é válida, pelo menos numa das suas formas. Um ato não deixa de ser vir­tuoso quando a sua realização cumpre e satisfaz alguma exigência da nossa natureza. Ademais, a justiça, a fidelidade, a humildade, a clemência, a paciência e outras virtudes podem ser cultivadas ou praticadas, não como formas de generosidade, mas como virtudes inerentemente excelentes, não meramente pela promoção da felicidade de outros, mas pelo que elas são em si mesmas. 
7. TEORIA DE QUE O PECADO CONSISTE NA OPOSIÇÃO DAS PROPENSÕES INFE­RIORES DA NATUREZA HUMANA A UMA CONSCIÊNCIA MORAL DESENVOLVIDA GRADATTVAMENTE. Essa opinião foi desenvolvida, como foi assinalado no item anterior, por Tennant, em suas Conferências Hulseanas. É a doutrina do pecado elaborado de acordo com a teoria evolucionista. Os impulsos naturais e as qualidades herdadas, derivadas dos animais inferiores, compõem o material do pecado, mas não se tornam pecado concretamente enquanto não forem tolerados contrariamente ao senso moral da humanidade em seu desenvolvimento gradual. As teorias de McDowall e Fiske seguem linhas semelhantes. A teoria apresentada por Tennant hesita um tanto entre a idéia bíblica sobre o homem e a idéia apresentada pela teoria evolucionista, inclinando-se ora para um lado, ora para outro. Pressupõe que o homem tinha livre arbítrio -- vontade livre -- mesmo antes do despertar da sua consciência moral, de modo que podia fazer uma escolha quando era posto diante de um ideal moral; mas não explica como se pode conceber uma vontade livre e indetermi­nada num processo de evolução. A teoria limita o pecado às transgressões da lei moral cometidas com clara consciência de um ideal moral e, portanto, condenadas como más pela consciência. É, na verdade, apenas a velha idéia pelagiana do pecado enxertada na teoria evolucionista e, portanto, está aberta a todas as objeções que pesam sobre o pelagianismo. 
O defeito radical dessas teorias todas é que procuram definir o pecado sem levar em consideração que o pecado é essencialmente o abandono de Deus, a oposição a Deus e a transgressão da lei de Deus. Sempre se deve definir o pecado em termos da relação do homem com Deus e Sua vontade como vem expressa na lei moral.

A Idéia Bíblica do Pecado 
Ao dar a idéia bíblica do pecado, é necessário chamar a atenção para diversas particularidades.

1. O PECADO É O MAL NUMA CATEGORIA ESPECÍFICA. Hoje em dia ouvimos falar muito do mal, e relativamente pouco do pecado; e isso é muito enganoso. Nem todo mal é pecado. Não se deve confundir o pecado com o mal físico, com aquilo que é danoso ou calamitoso. É possível falar, não só do pecado mas da doença, como um mal, mas, então, a palavra "mal" é empregada em dois sentidos totalmente diversos. Acima da esfera física está a esfera ética, na qual é aplicável o contraste entre o bem moral e o mal moral, e é somente nesta esfera que podemos falar de pecado. E mesmo nesta esfera não é desejável substituir a palavra "pecado" pela palavra "mal" sem acrescentar algum qualificativo, pois aquela é mais específica do que esta. O pecado é um mal moral. Muitos nomes emprega­dos na Escritura para designar o pecado indicam o seu teor moral. Chatt’th dirige a atenção para o pecado como um feito que erra o alvo e que consiste num desvio do cami­nho certo. 'Avel'avon indicam que é uma falta de integridade e retidão, uma saída da vereda designada. Pesha' refere-se a ele como uma revolta ou uma recusa de sujeição à autoridade legítima, uma positiva transgressão da lei, e um rompimento da aliança. E resha' o assinala como uma fuga ímpia e culposa da lei. Ademais, é designado como culpa por 'asham, como infidelidade e traição por ma'al, como vaidade por 'aven e como perversão ou distorção da natureza (torção) por 'avah. As palavrasneotestamentárias corres­pondentes, como hamartia, adikía, parabasis, paraptoma, anomia, paranomia e outras, in­dicam as mesmas idéias. Em vista do emprego dessas palavras e do modo pelo qual a Bí­blia normalmente fala do pecado, não se pode duvidar do seu teor ético. Não é uma cala­midade que sobreveio inopinadamente ao homem, envenenou sua vida e arruinou sua feli­cidade, mas um curso que o homem decidiu seguir deliberadamente e que leva consigo miséria inaudita. Fundamentalmente não é uma coisa passiva, como uma fraqueza, um de­feito, ou uma imperfeição pela qual não podemos ser responsabilizados, mas uma ativa oposição a Deus, e uma positiva transgressão da Sua lei, constituindo culpa. O pecado é o resultado de uma escolha livre, porém má, do homem. Este é o ensino claro da Palavra de Deus, Gn 3.1-6; Is 48.8; Rm 1.18-32; 1 Jo 3.4. A aplicação da filosofia evolucionista ao estudo do Velho Testamento levou alguns eruditos à convicção de que a idéia ética do pe­cado não se desenvolveu até o tempo dos profetas, mas esta opinião não encontra apoio na maneira como os mais antigos livros da Bíblia falam do pecado. 
2. O PECADO TEM CARÁTER ABSOLUTO. Na esfera ética, o contraste entre o bem e o mal é absoluto. Não há condição neutra entre ambos. Apesar de indubitavelmente ha­ver graus nos dois, não há graduação entre o bem e o mal. A transição de um para o outro não é de caráter quantitativo, e, sim, qualitativo. Um ser moral bom não se torna mal por uma simples diminuição da sua bondade, mas somente por uma mudança qualitativa radical, por um volver ao pecado. O pecado não é um grau menor de bondade, mas um mal positivo. Isso é ensinado claramente na Bíblia. Quem não ama a Deus é, por isso caracterizado como mau. A Escritura não reconhece nenhuma posição de neutralidade Ela concita o ímpio a voltar-se para a retidão e, às vezes, fala do justo como caindo no mal; mas não contém nem uma só indicação de que um ou outro alguma vez fica numa posição neutra. O homem está do lado certo ou do lado errado, Mt 10.32, 33; 12.30 Lc 11.23; Tg 2.10. 
3. O PECADO SEMPRE TEM RELAÇÃO COM DEUS E SUA VONTADE. Os mais anti­gos teólogos compreenderam que é impossível ter uma correta concepção do pecado sem vê-lo em relação a Deus e Sua vontade e, portanto, acentuavam este aspecto e normalmente falavam do pecado como "falta de conformidade com a lei de Deus". É, sem dúvida, uma correta definição formal do pecado. Mas surge a questão: Qual é precisamente o conteúdo material da lei? Que é que ela exige? Respondendo-se esta questão, será possível determinar o que é o pecado num sentido material. Ora, não há dúvida de que a grande e central exigência da lei é o amor a Deus. E se, do ponto de vista material, a bondade consiste em amar a Deus, o mal moral consiste no oposto. É a separação de Deus, a oposição a Deus, o ódio a Deus, e isto se manifesta em constante transgressão da lei de Deus, em pensamento, palavra e ato. As seguintes passagens mostram clara­mente que a Escritura vê o pecado em relação a Deus e Sua lei, quer como lei escrita nas tábuas do coração, quer como dada por meio de Moisés, Rm 1.32; 2.12-14; 4.15; Tg 2.9; 1 Jo 3.4. 
4. O PECADO INCLUI A CULPA E A CORRUPÇÃO. A culpa é o estado de merecimen­to da condenação ou de ser passível de punição pela violação de uma lei ou de uma exigên­cia moral. Ela expressa a relação do pecado com a justiça ou da penalidade com a lei. Mesmo assim, porém, a palavra tem duplo sentido. Pode indicar uma qualidade inerente ao pecador, a saber, o seu demérito, más qualidades ou culpabilidade, que o faz merecedor de castigo. Dabney fala disso como "culpa potencial". É inseparável do pecado, jamais se encontra em quem não é pessoalmente pecador, e é permanente, de modo que, uma vez es­tabelecida, não pode ser removida pelo perdão. Mas também pode indicar a obrigação de satisfazer a justiça, pagar a penalidade do pecado --a "culpa de fato", como lhe chama Dabney. Não é inerente ao homem, mas é o estatuto penal do legislador, que fixa a pena­lidade da culpa. Pode ser removida pela satisfação pessoal ou viçaria das justas exigências da lei. Embora muitos neguem que o pecado inclui culpa, essa negação não se harmoniza com o fato de que o pecado é ameaçado com castigo, e de fato o recebe, e evidentemente contradiz claras afirmações da Escritura, Mt 6.12; Rm 3.19; 5.18; Ef 2.3. Por corrupção entendemos a corrosiva contaminação inerente, a que todo pecador está sujeito. É uma realidade na vida de todos os indivíduos. É inconcebível sem a culpa, embora a culpa, como incluída numa relação penal, seja concebível sem a corrupção imediata. Mas é sem­pre seguida pela corrupção. Todo aquele que é culpado em Adão, também nasce com uma natureza corrupta, em conseqüência. Ensina-se claramente a doutrina da corrupção do pecado em passagens como, Jó 14.4; Jr 17.9; Mt 7.15-20; Rm 8.5-8; Ef 4.17-19. 
5. O PECADO TEM SUA SEDE NO CORAÇÃO. O pecado não reside nalguma faculdade da alma, mas no coração, que na psicologia da Escritura é o órgão central da alma, onde estão as saídas da vida. E desse centro, sua influência e suas operações espalham-se para o intelecto, a vontade, as emoções em suma, a todo o homem, seu corpo inclusive. Em seu estado pecaminoso, o homem completo é objeto do desprazer de Deus. Há um sentido em que se pode dizer que o pecado teve origem na vontade do homem, caso em que a vontade não designa uma volição efetiva, na medida em que isto sucede com a natu­reza volitiva do homem. Havia uma tendência do coração, subjacente à volição efetiva, quando o pecado entrou no mundo. Esta maneira de ver está em perfeita harmonia com as descrições bíblicas, em passagens como as seguintes: Pv 4.23; Jr 17.9; Mt 15.19, 20; Lc 6.45; Hb 3.12. 
6. O PECADO NÃO CONSISTE APENAS DE ATOS MANIFESTOS. O pecado não con­siste somente de atos patentes, mas também de hábitos pecaminosos e de uma condição pecaminosa da alma. Estes três âmbitos se interrelacionam do seguinte modo: O estado pecaminoso é a base dos hábitos pecaminosos, e estes se manifestam em ações pecamino­sas. Também há verdade, porém, na alegação de que os atos pecaminosos repetidos levam ao estabelecimento de hábitos pecaminosos. As ações e as disposições pecaminosas do homem devem ser atribuídas a uma natureza corrupta, que as explica. As passagens cita­das no parágrafo anterior consubstanciam esta opinião, pois provam com clareza que o es­tado ou a condição do homem é completamente pecaminosa. E se for necessário levantar a questão sobre se os pensamentos e os sentimentos do homem natural, chamado "carne" na Escritura, devam ser considerados como constituindo pecado, poder-se-ia responder indicando passagens como as seguintes: Mt 5.22, 28; Rm 7.7; Gl 5,17, 24, e outras. Em conclusão, pode-se dizer que se pode definir o pecado como falta de conformidade coma lei moral de Deus, em ato, disposição ou estado. 
O Conceito Pelagiano do Pecado 
O conceito pelagiano do pecado é completamente diverso do que foi apresentado acima. O único ponto de semelhança está em que o pelagiano também vê o pecado em re­lação à lei de Deus, e o considera uma transgressão da lei. Mas em todas as outras particularidades, sua concepção difere amplamente do conceito bíblico e agostiniano. 
1. EXPOSIÇÃO DO CONCEITO PELAGIANO. Pelágio tomou o seu ponto de parti­da na capacidade do homem. Sua proposição fundamental é: Deus ordenou ao homem que praticasse o bem; daí, este deve ter capacidade para fazê-lo. Significa que o homem tem livre arbítrio no sentido absoluto da expressão, de modo que lhe é possível decidir a favor ou contra o que é bom, e também praticar tanto o bem como o mal. A decisão não depende de qualquer caráter moral que haja no homem, pois a vontade é inteiramente indeterminada. Se o homem vai fazer o bem ou o mal, depende simplesmente da sua vontade livre e independente. Disto se segue, naturalmente, que não existe o que chamam de desenvolvimento moral do indivíduo. O bem e o mal estão localizados nas ações isolada do homem. Desta posição fundamental decorre naturalmente o ensino de Pelágio a respeito do pecado. O pecado consiste somente nos atos isolados provenientes da vontade. A coisa chamada natureza pecaminosa não existe, como tampouco as chamadas disposições pecaminosas. O pecado é sempre uma escolha deliberada do mal, escolha feita por uma vontade perfeitamente livre e que igualmente pode escolher e seguir o bem. Ma se fosse assim, inevitavelmente se seguiria que Adão não foi criado num estado de santidade positiva, mas, sim, num estado de equilíbrio moral. Sua condição seria de neutrali­dade moral. Nesse caso, ele não era nem bom nem mau, e, portanto, não tinha natureza moral; mas ele escolheu o curso do mal, e assim se tornou pecaminoso. Considerando que o pecado consiste unicamente em atos isolados decorrentes da vontade, a idéia da sua propagação pela procriação é absurda.  Uma natureza pecaminosa, se existisse tal coisa, poderia passar de pai a filho, mas os atos pecaminosos não podem ser propagado dessa maneira. Isso é por natureza uma impossibilidade. Adão foi o primeiro pecador mas em nenhum sentido o seu pecado passou aos seus descendentes. O que chamam de pecado original, não existe. As crianças nascem num estado de neutralidade, começando exatamente como Adão começou, com a exceção de que levam a desvantagem de terem maus exemplos ao seu redor.  O seu curso futuro terá que ser determinado pela sua própria livre escolha. A universalidade do pecado é admitida, porquanto toda experiência a testifica. Deve-se à limitação e ao hábito de pecar, que se forma gradativamente. Estri­tamente falando, segundo o ponto de vista pelagiano, não há pecadores, mas tão somente atos pecaminosos isolados.  Isso impossibilita completamente uma concepção religiosa da história da raça. 
2. OBJEÇÕES AO CONCEITO PELAGIANO. Há várias objeções fortes ao conceito pelagiano do pecado, das quais as mais importantes são as seguintes: 
a. A posição fundamental de que Deus só responsabiliza o homem por aquilo que es­te é capaz de fazer, é absolutamente contrária ao testemunho da consciência e à Palavra de Deus. É um fato inegável que, conforme o homem cresce no pecado, decresce a sua capa­cidade para o bem. Ele se torna, em proporção cada vez maior, um escravo do pecado. Segundo a teoria em foco, isso também envolveria uma diminuição da sua responsabilida­de. Mas isso equivale a dizer que o próprio pecado redime gradativamente as suas vítimas, aliviando-as da sua responsabilidade. Quanto mais pecador, menos responsável o homem é. Contra essa posição a consciência registra um vigoroso protesto. Paulo não diz que os pecadores endurecidos que ele descreve em Rm 1.18-32 estavam virtualmente sem res­ponsabilidade, mas, antes, considera-os dignos de morte. Disse Jesus que os ímpios judeus que se vangloriavam da sua liberdade, mas manifestaram a sua extrema iniqüidade procu­rando matá-lo, eram escravos do pecado, não compreendiam a Sua linguagem porque eram incapazes de ouvir a Sua palavra, e iam morrer em seus pecados, Jo 8.21,22, 34,43. Embora escravos do pecado, eram, não obstante, responsáveis. 
b. Negar que o homem tem por natureza uma estrutura moral é simplesmente re­baixá-lo ao nível dos animais. Segundo esse conceito, tudo da vida do homem que não se­ja uma consciente escolha da vontade, está privado de toda e qualquer qualidade moral. Mas a consciência dos homens em geral atesta o fato de que o contraste entre o bem e o mal aplica-se também às tendências, aos desejos, ao temperamento e às emoções do ho­mem, sendo que esses elementos também possuem um caráter moral.No pelagianismo, o pecado e a virtude são reduzidos a apêndices superficiais do homem, de maneira nenhuma vinculados à sua vida interior. As passagens que damos a seguir mostram que a opinião da Escritura é completamente diversa: Jr 17.9; SI 51.6,10; Mt 15.19; Tg 4.1,2.
 c. Uma escolha da vontade que não seja de modo nenhum determinada pelo caráter do homem, não somente é inimaginável, como também é eticamente destituída de valor. Se uma boa ação do homem simplesmente acontece porque sim, e não se pode dar nenhuma razão que explique por que não sucedeu o oposto, noutras palavras, se a ação não é uma expressão do caráter do homem, falta-lhe por completo valor moral. É só como um expoente do caráter que uma ação tem o valor moral que se lhe atribui.
 d. A teoria pelagiana não pode explicar satisfatoriamente a universalidade do peca­do. O mau exemplo dos pais e avós não oferece uma verdadeira explicação. A simples e abstrata possibilidade de um homem vir a pecar, mesmo quando fortalecida pelo mau exemplo, não explica como aconteceu que, de fato, todos os homens pecaram. Como se pode explicar que a vontade sempre e invariavelmente seguiu na direção do pecado, e nun­ca na direção oposta? É muito mais natural pensar numa disposição geral para pecar.

O Conceito Católico Romano do Pecado 
Conquanto os Cânones e Decretos do Concilio de Trento sejam um tanto ambíguos sobre a doutrina do pecado, o conceito católico romano do pecado predominante pode ser expresso como segue: O verdadeiro pecado sempre consiste num ato consciente da vontade. É certo que as disposições e os hábitos que não estão de acordo com a vonta­de de Deus são de caráter pecaminoso; contudo, não se lhes pode chamar pecados, no sentido estrito da palavra. A concupiscência que está presente no homem e por trás do pecado, ganhou domínio sobre o homem no paraíso e, assim, precipitou a perda do donum superadditum da justiça original, não pode ser considerada pecado, mas somente a lenha (fomes) ou o combustível para o pecado. A pecaminosidade dos descendentes de Adão é primordialmente uma condição negativa, apenas, consistindo na ausência de algo que devia estar presente, isto é, da justiça original, que não é essencial à natureza humana.  Alguma coisa essencial estaria faltando somente se, como alguns sustentam, a justitia naturalis também fosse perdida. 
As objeções a esse conceito evidenciam-se perfeitamente no que foi dito com relação à teoria pelagiana. Um simples lembrete delas parece mais que suficiente. Até onde sustenta que o verdadeiro pecado consiste somente numa escolha deliberada da vontade e em atos manifestos, as objeções levantadas contra o pelagianismo lhe são pertinentes. A idéia de que a justiça original foi acrescentada sobrenaturalmente à constituição natural do ho­mem, e de que a sua perda não macula a natureza humana, é antibíblica, como foi demons­trado em nossa discussão da imagem de Deus no homem. De acordo com a Bíblia, a concupiscência é pecado, verdadeiro pecado, e raiz de muitas ações pecaminosas. Expusemos isso quando consideramos o conceito bíblico do pecado. 

Fonte Bibliografia L. Berkhof,teologia sistematica

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