Breve Biografia: George Whitefield
A Vida de George Whitefield – (1714-1770)
Quais foram os homens que reavivaram a religião na
Inglaterra há cem anos atrás? Quais foram seus nomes, a fim de que possamos
honrá-los? Onde eles nasceram? Como foram educados? Quais são os fatos mais
importantes nas suas vidas? Qual foi a área especial em que trabalharam? A
estas questões eu desejo fornecer algumas respostas no presente e nos subseqüentes
capítulos.
Eu tenho pena do homem que não tem interesse nestas
perguntas. Os instrumentos que Deus emprega para fazer a sua obra no mundo
merecem um cuidadoso exame. O homem que não se incomoda em olhar para os
chifres de carneiro que derrubaram Jericó, para o martelo e estaca que mataram
Sísera, para as tochas e trombetas de Gideão, para a funda e pedra de Davi,
pode muito bem ser considerado como uma pessoa fria e sem coração. Eu estou
certo de que todos os que lerem este volume gostarão de conhecer alguma coisa a
respeito dos evangelistas ingleses do século dezoito.
O primeiro que mencionarei é o bem conhecido George
Whitefield. Embora não seja o primeiro em ordem, se olharmos para a data de seu
nascimento, eu o coloco como primeiro quanto aos méritos, sem nenhuma
hesitação. De todos os heróis espirituais de cem anos atrás, nenhum compreendeu
tão cedo quanto Whitefield, as demandas de seu tempo, e ninguém estava tão na
dianteira na grande obra de ofensiva espiritual. Eu penso que cometeria uma injustiça
se colocasse qualquer outro nome na frente do seu.
Whitefield nasceu em Gloucester, no ano de 1714. Esta
venerável cidade, que foi o lugar de seu nascimento, está ligada com mais de um
nome que deveria ser querido a todo amante da verdade protestante. Tyndale, um
dos primeiros e mais capazes tradutores da Bíblia inglesa, também nasceu em
Gloucester.
Hooper, um dos maiores e melhores dos nossos
reformadores ingleses, foi bispo de Gloucester, e foi queimado na fogueira por
causa da verdade de Cristo, diante da sua própria igreja, no reinado da Rainha
Maria. No século seguinte, Miles Smith, Bispo de Gloucester, foi um dos
primeiros a protestar contra os procedimentos romanizadores de Laud, o qual era
então Deão de Gloucester. Na verdade, ele ia tão longe nos seus sentimentos
protestantes que quando Laud moveu a mesa de comunhão da catedral para o lado
direito, e a colocou pela primeira vez do lado oposto do altar, em 1616, o
Bispo Smith ficou tão ofendido que se recusou a entrar na catedral a partir daquele
dia até a sua morte. Lugares como Gloucester, não podemos duvidar, têm
vinculados a si uma rica herança de muitas orações. A cidade aonde Hooper
pregou e orou, e onde o zeloso Miles Smith protestou, foi o lugar onde nasceu o
maior pregador do Evangelho que a Inglaterra jamais viu.
Como muitos outros homens famosos, Whitefield era de
origem humilde, e não gozava de conhecimento de pessoas ricas ou nobres para
ajudá-lo a ir avante no mundo. Sua mãe possuía a hospedaria Bell em Gloucester,
e parece que não prosperou no negócio. De qualquer modo, parece que ela nunca
teve condições de fazer nada para que Whitefield avançasse na vida. A
hospedaria ainda existe, e é tida como o lugar de nascimento não apenas do
nosso maior pregador inglês, mas também de um bem conhecido prelado inglês:
Henry Philpot, Bispo de Exeter.
O início da vida de Whitefield, de acordo com seu
próprio relato, foi tudo, menos religioso, embora, como muitas crianças, ele
tivesse ocasionais fisgadas de consciência e afetos espasmódicos de sentimentos
de devoção. Mas, os hábitos e os gostos em geral são o único teste verdadeiro
dos caracteres dos jovens. Ele confessa que era ‘dado à mentira, conversa
obscena, galhofa tola’, e que era um ‘profanador do domingo, freqüentador de
teatro, jogador de cartas e leitor de romances’. Tudo isso, diz ele, continuou
até a idade de quinze anos.
Pobre como era, sua residência em Gloucester lhe
proporcionou a vantagem de uma boa educação na escola pública secundária da
cidade. Aí ele foi um estudante externo até a idade de 15 anos. Nada é
conhecido a respeito do seu progresso aí. Entretanto, ele dificilmente deve ter
sido ocioso, pois neste caso não estaria pronto para ingressar na universidade
logo depois, com a idade de 18 anos. Além disso, suas cartas mostram uma
familiaridade com o latim, através de freqüentes citações, o que dificilmente
seria conseguido se não houvesse aprendido na escola. O único fato conhecido a
respeito dos seus dias na escola é o fato curioso de que ele era notável por
sua elocução e memória, e foi selecionado para recitar discursos diante da
Corporação de Gloucester quando da sua visita anual à Escola Secundária.
Com a idade de 15 anos Whitefield deixou a escola, e
parece ter abandonado o latim e o grego por um tempo. Com toda a probabilidade,
as difíceis circunstâncias financeiras de sua mãe tornaram absolutamente
necessário que ele fizesse alguma coisa para ajudá-la no seu negócio e que
ganhasse o seu próprio sustento. Assim, ele começou a ajudá-la no serviço
diário de sua hospedagem. ‘Finalmente,’ diz ele, ‘eu coloquei o meu avental
azul, lavei copos, limpei salas e, em uma palavra, tornei-me um zelador
declarado durante um ano e meio.’
Este estado de coisas, entretanto, não durou muito; o
negócio da sua mãe na hospedaria não floresceu e ela finalmente aposentou-se
totalmente. Um antigo colega de escola reavivou em sua mente a idéia de ir para
Oxford, e ele voltou para os bancos da Escola Secundária reiniciando seus
estudos. Alguns amigos que estavam interessados por ele se levantaram no
Pembroke College, em Oxford, onde a Escola Secundária de Gloucester fez duas
exibições. Finalmente, após diversas circunstâncias providenciais terem
suavizado o caminho, ele ingressou em Oxford como um servente no Pembroke
College com a idade de 18 anos.
O período em que Whitefield residiu em Oxford foi o
momento crucial na sua vida. O seu jornal nos diz que durante os dois ou três
anos que antecederam a sua ida para a Universidade, ele não esteve isento de
convicções religiosas. Mas, a partir do momento em que ingressou no Pembroke
College, estas convicções rapidamente amadureceram em direção a um cristianismo
convicto. Ele fazia uso diligente de todos os meios de graça ao seu alcance.
Ele gastava seus tempos vagos visitando a prisão da cidade, lendo para os
prisioneiros, e tentando fazer o bem. Ele conheceu os famosos John Wesley, seu
irmão Charles Wesley, e um pequeno grupo de jovens do mesmo pensamento,
incluindo o conhecido autor de ‘Theron and Aspasion,’ James Hervey. Este era o
devotado grupo aos quais o termo ‘metodistas’ foi aplicado pela primeira vez,
por causa do seu ‘método’ estrito de viver. Num certo período da sua vida,
Whitefield parece ter devorado com prazer livros como: ‘Thomas à Kempis’, e, ‘O
Combate Espiritual de Castanuza’, e ter estado em perigo de tornar-se um
semi-papista, um ascético ou um místico, e de fazer da auto-negação o centro da
religião. Ele diz em seu jornal: ‘Eu sempre escolhia o pior tipo de alimento.
Eu jejuava duas vezes por semana; minha aparência era desprezível. Eu pensava
que passar brilhantina no cabelo era impiedade. Eu usava luvas de lã, roupa
remendada, e sapatos sujos; e pensei que estava convencido de que o reino não
consiste em comida e bebida, mas ainda persistia resolutamente nestes atos
voluntários de auto-negação, porque encontrava neles grande estímulo para a
vida espiritual.’ Ele foi gradualmente libertado de toda esta escuridão, em
parte pelo conselho de um ou dois cristãos experientes, e em parte pela leitura
de livros tais como: ‘A Vida de Deus no Coração do Homem’ de Scougal, ‘Apelo
Sério’ de Law, ‘Apelo aos não Convertidos’ de Baxter, ‘Alerta a Pecadores não
Convertidos’ de Alleine, o comentário de Matthew Henry. ‘Acima de tudo’ diz
ele, ‘tendo a minha mente agora mais aberta e alargada, eu comecei a ler as
Sagradas Escrituras de joelhos, colocando de lado todos os outros livros e
orando, se possível, sobre cada linha e palavra. Isto proveu alimento e bebida
de fato para minha alma. Eu diariamente recebia vida fresca, luz e poder do
alto.
Eu obtive mais conhecimento verdadeiro da leitura do Livro de Deus em um
mês do que jamais poderia adquirir de todos os escritos dos homens.’ Uma vez
ensinado a entender a gloriosa liberdade da graça de Cristo, Whitefield nunca
mais voltou-se para o ascetismo, legalismo, misticismo, ou estranhas idéias da
perfeição cristã. A experiência adquirida por meio de amargo conflito lhe foi
muito valiosa. As doutrinas da livre graça uma vez plenamente aprendidas,
lançaram profundas raízes no seu coração, e tornaram-se como se fosse osso do
seu osso e carne da sua carne. De todo o pequeno grupo de metodistas de Oxford,
nenhum parece ter se apossado tão cedo de uma clara visão do Evangelho de
Cristo como ele o fez, e nenhum a guardou tão resolutamente até o fim.
Com a idade de 22 anos, Whitefield foi admitido às
Santas Ordens pelo Bispo Benson de Gloucester, no Domingo da Santíssima
Trindade, em 1736. Sua ordenação não resultou da sua própria busca. O bispo
ouviu de Lady Selwyn e de outros a respeito do seu caráter, mandou buscá-lo e
deu-lhe cinco guinéus para comprar livros, oferecendo-se para ordená-lo quando
ele desejasse, embora tivesse apenas 22 anos de idade. Esta oferta inesperada o
alcançou quando ele estava cheio de escrúpulos a respeito da sua própria
condição para o ministério. Aquilo desfez as amarras e o levou a tomar uma
decisão. ‘Eu comecei a pensar’, diz ele, ‘que se continuasse a resistir, eu
lutaria contra Deus’.
O primeiro sermão de Whitefield foi pregado na própria
cidade onde ele nasceu, na Igreja de Santa Mary-le-Crypt, em Gloucester. A sua
própria descrição é o melhor relato que pode ser dado: ‘Domingo passado, de
tarde, eu preguei meu primeiro sermão, na Igreja de Santa Mary-le-Crypt, onde
fui batizado e também pela primeira recebi o sacramento da Ceia do Senhor.
Curiosamente, como você pode facilmente conjecturar, isto atraiu uma grande
congregação na ocasião. A visão, a princípio, atemorizou-me um pouco. Mas fui
confortado com um sentimento sensível ao meu coração da presença divina, e logo
descobri a indizível vantagem de ter sido acostumado a falar em público quando
garoto na escola, e de exortar prisioneiros e pessoas pobres nas suas casas
quando na Universidade. Por meio disso fui guardado de ser demasiadamente
desencorajado. Quando eu prosseguia percebi um fogo se acender, até que por
fim, embora tão jovem e cercado por uma multidão daqueles que me conheciam
desde os dias da minha meninice, eu acredito que fui habilitado a pregar o
Evangelho com algum grau de autoridade.
Alguns poucos escarneceram, mas a
maioria parecia subitamente impressionada; e eu ouvi que uma queixa foi feita
ao bispo, de que eu havia levado quinze pessoas à loucura com o meu primeiro
sermão! O digno prelado desejou que a loucura não viesse a ser esquecida antes
do próximo domingo.’
Quase que imediatamente após sua ordenação, Whitefield
foi para Oxford e obteve seu grau de Bacharel em Artes. Ele então começou sua
vida ministerial regular assumindo deveres temporários na Tower Chapel em
Londres. Enquanto servia ali, pregou continuamente em muitas igrejas de
Londres, e entre outras, nas igrejas paroquiais de Islington, Bishopsgate,
Santo Dunstan, Santa Margaret, Westminster, Ibow, Cheapside. Desde o início ele
obteve um grau de popularidade tal, que nenhum pregador antes ou desde então provavelmente
jamais alcançou. Quer em dias de semana ou domingos, onde quer que ele pregasse
as igrejas lotavam e uma grande sensação era produzida. A grande verdade é que
um pregador extemporâneo e realmente eloqüente, pregando o puro Evangelho com
os dons de voz e de maneiras não usuais, era naquele tempo uma completa
novidade em Londres. As congregações eram tomadas de surpresa e arrebatadas. De
Londres ele foi transferido por dois meses para Dummer, numa pequena paróquia
rural em Hampshire, perto de Basingstoke. Esta era uma esfera de ação
totalmente nova, e ele parecia como que um homem enterrado vivo entre aquele
povo pobre e iletrado. Mas cedo ele adaptou-se a situação, e concluiu
posteriormente que colheu muito proveito das conversas que teve com os pobres.
De Dummer ele aceitou um convite, o qual lhe havia sido feito com insistência
pelos irmãos Wesley para visitar a colônia de Geórgia na América do Norte, para
ajudar no cuidado de uma casa de órfãos que havia sido estabelecida perto de
Savannah para filhos de colonizadores. Após pregar por alguns poucos meses em
Gloucestershire, e especialmente em Bristol e Stonehouse, ele viajou para
América no segundo semestre de 1737, permanecendo lá por cerca de um ano. As
coisas relacionadas com esta casa de órfãos, deve-se observar, ocuparam muito
da sua atenção desde este período da sua vida até a sua morte. Apesar de bem
intencionado, parece ter sido uma decisão de questionável sabedoria, e
certamente acarretou a Whitefield um mundo de ansiedade e responsabilidade até
o fim de seus dias.
Whitefield retornou da Geórgia na segunda parte do ano
de 1738, em parte para obter as ordens do sacerdote, que lhe foram conferidas
pelo seu antigo amigo, o Bispo Benson, e em parte para tratar de negócios
relacionados com a casa de órfãos. Ele cedo descobriu, entretanto, que a sua
posição não era mais a mesma de antes de haver viajado para a Geórgia. O grosso
do clero não lhe era mais favorável e olhavam-no com suspeitas, como um
entusiasta e um fanático. Eles estavam escandalizados principalmente por causa
da pregação da doutrina da regeneração ou do novo nascimento, como algo que
muitas pessoas batizadas necessitavam grandemente! O número de púlpitos aos
quais ele tinha acesso rapidamente diminuiu. Os guardiões da igreja, os quais
não tinham olhos para a bebedeira e impureza, ficaram cheios de intensa
indignação sobre o que eles chamavam de ‘violação da ordem’. Bispos que podiam
tolerar o Arminianismo, Socinianismo e Deísmo, encheram-se de indignação contra
um homem que declarava plenamente a expiação de Cristo e a obra do Espírito
Santo, e começaram a denunciá-lo abertamente. Para abreviar, deste período da
sua vida em diante, o campo de utilidade de Whitefield dentro da Igreja da
Inglaterra estreitou-se rapidamente de todos os lados.
O fato que neste tempo provocou uma reviravolta em
todo o curso do ministério de Whitefield foi sua adoção do sistema de pregação
a céu aberto. Observando que milhares em todo lugar não freqüentavam locais de
culto, gastavam seus domingos na ociosidade ou no pecado e não eram alcançados
pelos sermões pregados dentro das paredes dos templos, ele resolveu, num
espírito de ofensiva santa, ir atrás deles ‘nas ruas e becos’, de acordo com o
princípio de seu Mestre, e ‘compeli-los a entrar’. A sua primeira tentativa em
fazer isso foi entre os mineiros de carvão em Kingswood, perto de Bristol, em
fevereiro de 1739. Depois de muita oração, ele foi um dia para o monte Hannam,
colocou-se de pé sobre o monte, e começou a pregar a aproximadamente uma
centena de mineiros, baseado em Mateus 5:1-3. Logo a coisa tornou-se conhecida.
O número de ouvintes rapidamente aumentou, até que a congregação contava com
muitos milhares. Seu próprio relato da conduta destes mineiros de carvão
negligenciados, os quais nunca haviam estado em uma igreja nas suas vidas, é
profundamente comovente: ‘Não tendo’, escreve ele a um amigo, ‘nenhuma justiça
própria para renunciar, eles ficavam felizes ao ouvir de um Jesus, o qual era
um amigo de publicanos, e que não veio chamar os justos, mas pecadores ao
arrependimento. A primeira vez que descobri que estavam sendo afetados foi
através da visão dos sulcos brancos feitos por suas lágrimas, que rolavam
abundantemente das suas faces negras, visto que haviam saído das suas minas de
carvão. Centenas deles foram logo levados a uma profunda convicção, a qual, foi
comprovado, terminou felizmente em uma sadia e total conversão.
A mudança era
visível a todos, apesar de alguns terem escolhido atribuí-la a qualquer outra
coisa que não ao dedo de Deus. Visto que a cena era totalmente nova, ela
freqüentemente ocasionava muitos conflitos interiores. Às vezes, quando vinte
mil pessoas estavam diante de mim, eu não tinha uma só palavra para dizer, quer
a Deus ou a eles. Mas eu nunca fui totalmente desamparado, e freqüentemente
(porque negar isto seria mentir contra Deus) fui de tal modo assistido, que vim
a saber, por uma feliz experiência, o que o nosso Senhor tencionava ao dizer
‘do seu interior fluirão rios de água viva’. O firmamento aberto sobre mim, a vista
dos campos adjacentes, com a visão de milhares, alguns em carroças, outros
sobre o dorso de cavalos, e alguns nas árvores, e às vezes, todos comovidos e
em lágrimas, era quase que demais para mim e dominava-me totalmente.’
Dois meses depois disto Whitefield iniciou a prática
de pregação a céu aberto em Londres, no dia 27 de abril de 1739. As
circunstâncias nas quais isto aconteceu foram curiosas. Ele havia ido para
Islington para pregar a convite do vigário, seu amigo, Sr. Stonehouse. No meio
da oração os guardiões da igreja vieram a ele e pediram sua licença para pregar
na diocese de Londres. E claro que Whitefield não tinha esta licença, assim
como nenhum outro ministro que não oficiava regularmente na diocese, naqueles
dias.
O resultado da questão foi que, sendo proibido de pregar pelos guardiões
da igreja no púlpito, ele foi para fora depois da comunhão e pregou no
cemitério da igreja. ‘E’, diz ele, ‘Deus agradou-se em assistir-me na pregação
e a comover tão maravilhosamente os ouvintes, que acredito que poderíamos ter
ido para a prisão cantando hinos. Não digam os adversários que eu mesmo me
retirei das suas sinagogas. Não! Eles me expulsaram.’ Daquele dia em diante ele
tomou-se um constante pregador do campo quando quer que o tempo e a estação do
ano o fizesse possível. Dois dias depois, no domingo de 29 de abril, ele
registra: ‘Eu preguei em Moorfields a uma multidão extremamente grande. Tendo
ficado debilitado pelo meu sermão da manhã, eu descansei de tarde dormindo um
pouco, e às cinco horas fui e preguei em Kenninngton Common, à cerca de duas
milhas de Londres, quando não menos do que trinta mil pessoas foram estimadas
estar presentes’. Daí em diante, aonde quer que houvesse amplos espaços abertos
ao redor de Londres, aonde quer que houvesse grandes grupos de ociosos, ímpios,
profanadores do domingo reunidos, em Hackney Fields, Mary-le-bone Fields,
May-Fair, Smithfields, Blackheath, Moorfields, Kenninngton Conmion, lá estava
Whitefield levantando sua voz por Cristo. O Evangelho assim proclamado era ouvido
e alegremente recebido por centenas que nunca sonharam em ir a um lugar de
adoração. A causa da pura religião avançou e almas foram arrancadas das mãos de
Satanás, como brasas do fogo. Mas a coisa estava indo rápido demais para a
igreja daqueles dias. O clero, com poucas exceções, recusava inteiramente
apoiar este estranho pregador. Com um espírito de verdadeira inveja, eles nem
gostavam de ir atrás das massas da população semi-pagã, nem queriam que ninguém
fosse fazer o trabalho para eles.
A conseqüência foi que as pregações de
Whitefield nos púlpitos da Igreja da Inglaterra a partir deste tempo cessaram
quase que inteiramente. Ele amava a igreja na qual havia sido ordenado; ele
gloriava-se nos seus artigos de fé; ele usava com prazer os seus livros de
oração. Mas a igreja não o amava, e assim perdeu o uso dos seus serviços. A
pura verdade é, que a igreja da Inglaterra daqueles dias não estava pronta para
um homem como Whitefield. A igreja estava sonolenta demais para entendê-lo e
incomodada com um homem que não se aquietava nem deixava o diabo em paz.
Os acontecimentos da história de Whitefield a partir
deste período até o dia da sua morte são quase que inteiramente da mesma
compleição. Um ano era exatamente como o outro e tentar segui-lo seria apenas
pisar repetidamente sobre o mesmo solo. De 1739 até o ano da sua morte em 1770,
um período de 31 anos, sua vida foi de uma desenvoltura uniforme. Ele foi
eminentemente um homem de uma só coisa, que era o cuidado dos negócios de seu
Mestre. De domingo de manhã aos sábados à noite, de primeiro de janeiro a 31 de
dezembro, excetuando-se quando ficava impossibilitado por doença, ele estava
quase que incessantemente pregando a Cristo, e indo ao redor do mundo
convidando os homens ao arrependimento, a virem a Cristo e a serem salvos.
Dificilmente houve uma cidade de considerável tamanho na Inglaterra, Escócia ou
País de Gales, que ele não tenha visitado como evangelista. Quando as igrejas
lhe estavam abertas, ele pregava alegremente nas igrejas; quando apenas capelas
podiam ser conseguidas, ele pregava com alegria nas capelas. Quando igrejas e
capelas estavam ambas fechadas, ou eram demasiadamente pequenas para conter
seus ouvintes, ele estava pronto e desejoso de pregar ao ar livre. Por 31 anos
ele laborou deste modo, sempre proclamando o mesmo Evangelho glorioso, e
sempre, até onde os olhos humanos possam julgar, com imenso efeito. Numa única
semana de pentecostes, após pregar em Moorfields, ele recebeu cerca de mil
cartas de pessoas espiritualmente aflitas, e admitiu à mesa do Senhor trezentos
e cinqüenta pessoas. Nos trinta e quatro anos do seu ministério é reconhecido
que ele pregou publicamente dezoito mil vezes.
Suas viagens foram prodigiosas, quando consideradas as
ruas e meios de transportes do seu tempo. Mais do que qualquer homem nos tempos
modernos, ele estava familiarizado com ‘perigos no deserto e perigos no mar’.
Ele visitou a Escócia quatorze vezes e em nenhum outro lugar foi mais bem
aceito e útil do que naquele país amante da Bíblia. Ele cruzou o Atlântico sete
vezes, de ida e de volta, em miseráveis e lentos barcos a vela e atraiu a
atenção de milhares em Boston, New York e Philadelphia. Ele foi à Irlanda duas
vezes, e em determinada ocasião quase foi assassinado por uma turba de papistas
ignorantes em Dublin. Na Inglaterra e no País de Gales, ele percorreu cada um
de seus condados, da Ilha de Wight até Berwick-on-Thiid, e da Land’s End até
North Foreland.
O seu trabalho ministerial regular em Londres durante
a estação de inverno, quando a pregação no campo era necessariamente suspensa,
era, às vezes, prodigioso. Seus compromissos semanais no Tabernáculo em
Tottenham Court Road, o qual foi construído por ele quando os púlpitos da
igreja estabelecida foram fechados, compreendiam os seguintes trabalhos: cada
domingo de manhã ele ministrava a Ceia do Senhor a diversas centenas de
comungantes, às seis e meia. Depois disso, ele lia orações, e pregava de manhã
e de tarde. Então pregava novamente no início da noite, às cinco e meia, e
concluía dirigindo-se a um largo grupo de viúvas, casais, homens e mulheres
solteiros, todos sentados separadamente na área do Tabernáculo, com exortações
apropriadas às suas respectivas situações. Nas manhãs de segunda, terça, quarta
e quinta, ele pregava regularmente às seis horas. Nas tardes de segunda, terça,
quarta, quinta e sábado, ele fazia palestras. Isto, pode-se observar, perfazia
treze sermões por semana. E durante todo este tempo ele mantinha uma ampla
correspondência com pessoas em quase toda parte do mundo.
Que qualquer constituição humana pudesse suportar os
labores que Whitefield suportou durante tanto tempo, parece surpreendente. Que
sua vida não tenha sido ceifada pelos perigos aos quais estava freqüentemente
exposto, não é menos surpreendente. Mas ele foi imortal até que seu trabalho
fosse realizado. Por fim, ele morreu subitamente em Newbury Porth, na América
do Norte, num domingo, 29 de setembro de 1770, ainda relativamente novo, com 56
anos de idade. Ele foi casado com uma viúva chamada James, de Abergavenny, a
qual morreu antes dele. Se podemos julgar pela pouca menção que ele faz da
esposa em suas cartas, o casamento não parece ter contribuído muito para sua
felicidade. Ele não deixou filhos, mas deixou um nome bem melhor preservado do
que se tivesse deixado filhos e filhas. Talvez nunca tenha havido um homem do
qual se pudesse dizer tão verdadeiramente que gastou e foi gasto por Cristo
como George Whitefield.
As circunstâncias particulares do fim deste grande
evangelista são tão profundamente interessantes que eu não me desculparei em
demorar-me neles. Foi um fim em extraordinária harmonia com o teor da sua vida.
Assim como havia vivido por mais de trinta anos, assim ele morreu: pregando até
o fim. Ele literalmente morreu no posto. ‘Morte súbita’, freqüentemente dizia,
‘é glória súbita. Quer correto ou não, não posso deixar de desejar partir desta
maneira. Para mim seria pior do que a morte ter de ser assistido na doença e
ver os amigos chorando ao redor de mim’. Ele teve o desejo do seu coração
atendido. Foi ceifado numa noite por um acesso espasmódico de asma, quase que
antes que seus amigos viessem a saber que se encontrava doente.
O meu Sol deu luz a muitos, mas agora ele está
se pondo – não, agora ele está se levantando para o zênite da glória imortal.
Eu vivi mais do que muitos na terra, mas eles não viverão mais do que eu nos
céus. Muitos viverão mais do que eu na terra, e permanecerão quando este corpo
não mais existir, mas lá, oh, pensamentos divinos!, eu estarei num mundo aonde
tempo, idade, doença, e sofrimentos são desconhecidos, o meu corpo agora falha,
mas o meu espírito se expande. Como eu desejaria viver para sempre para pregar
a Cristo. Mas eu morro para estar com Ele. Quão breve – comparativamente breve
– foi a minha vida comparada com os imensos labores os quais eu vejo diante de
mim ainda não realizados. Mas se eu partir agora, enquanto ainda tão poucos
preocupam-se com as coisas celestiais, o Deus da Paz certamente visitará
vocês’”. Depois que o sermão terminou, Whitefield jantou com um amigo, então
cavalgou para Newbury Porth, apesar de bastante fatigado. Ao chegar ali, ele
ceou cedo e retirou-se para a cama. A tradição diz que quando ele subia as
escadas com uma vela acesa nas mãos, ele não pôde resistir ao desejo de voltar
o rosto, no topo da escada, e falar aos amigos que estavam reunidos, os quais
vieram encontrá-lo. Enquanto ele falava, o fogo brilhava dentro dele, e antes
que pudesse concluir, a vela que segurava nas mãos queimou até o fim. Ele
retirou-se para o seu quarto para não mais sair de lá com vida. Um violento
acesso de asma se apoderou dele logo depois que foi para a cama e antes das
seis da manhã, o grande pregador estava morto. Quando chegou a hora, ele não
tinha nada para fazer a não ser morrer. Onde ele morreu, aí foi enterrado, em
uma câmara mortuária abaixo do púlpito da igreja, onde ele estava comprometido
para pregar. O seu sepulcro é visto até o dia de hoje e nada faz a pequena
cidade onde morreu tão famosa quanto o fato de que ali estão os ossos de George
Whitefield.
O Ministério e Pregação de Whitefield
Esta compreensão incorreta talvez seja inevitável, e
não deveria nos surpreender. As fontes para que se forme uma correta opinião a
respeito de um homem como Whitefield são necessariamente muito escassas. Ele
não escreveu livros lidos por milhões, de fama universal, como ‘O Peregrino’,
de Bunyan. Ele não encabeçou cruzadas contra uma igreja apóstata com o apoio de
uma nação e príncipes ao seu lado como Martinho Lutero. Ele não fundou nenhuma
denominação, que ligasse sua fé aos seus escritos e preservasse cuidadosamente
seus melhores atos e palavras. Há Luteranos e Wesleyanos nos dias presentes,
mas não há ‘Whitefieldianos’. Não! O grande evangelista foi um homem simples e
sincero, que viveu para uma coisa apenas: pregar a Cristo. Fazendo isto, ele
não se importava com mais nada. Os registros a respeito desse homem são amplos
e plenos nos céus, não há dúvida, mas são poucos e escassos na terra.
Não devemos esquecer, além disso, que muitos em todas
as épocas não vêem nada em homens como Whitefield senão fanatismo e entusiasmo.
Eles abominam tudo que se pareça com ‘zelo’ em religião. Eles detestam todos os
que viram o mundo de cabeça para baixo, fogem do velho caminho da tradição e
não deixam o diabo sozinho. Tais pessoas, não tenho dúvidas, nos diriam que o
ministério de Whitefield somente produziu excitação temporária, e que sua
pregação era mera extravagância, não havendo nada de especial a ser admirado no
seu caráter. E de se temer que há dezoito séculos atrás houvessem dito o mesmo
a respeito do apóstolo Paulo.
A pergunta, ‘Que bem fez Whitefield?’ é uma pergunta
que eu respondo sem a menor hesitação. Eu acredito que o bem direto que ele fez
às almas imortais foi enorme. Eu vou adiante, – eu acredito que foi
incalculável. Testemunhas dignas de crédito na Inglaterra, Escócia e América
registraram sua convicção de que ele foi um instrumento na conversão de
milhares de pessoas. Muitos, onde quer que ele pregasse, foram não apenas
satisfeitos, excitados, e arrebatados, mas abandonaram seus pecados, e foram
feitos reais servos de Deus. ‘Enumerar pessoas’, eu não esqueço, é em todos os
tempos uma prática objetável. Somente Deus pode ler os corações e discernir o
trigo do joio. Muitos, sem dúvida, em dias de excitação religiosa, são tidos
como convertidos, os quais não o foram de modo algum. Mas eu desejo que meus
leitores compreendam que a minha alta avaliação da utilidade de Whitefield é
baseada em sólida base. Eu peço que observem bem o que os contemporâneos de
Whitefield pensavam sobre o valor de seus labores.
Franklin, o bem conhecido filósofo americano era um
homem frio e calculista, um Quaker por profissão, o qual, não é de se esperar,
que viesse a fazer uma elevada avaliação do trabalho de nenhum ministro. Ainda
assim ele confessou: ‘era maravilhoso ver a mudança logo efetuada através da
sua pregação nos hábitos dos habitantes de Philadelphia. De descuidados ou
indiferentes sobre religião, parecia como se o mundo inteiro estivesse se
tornando religioso.’ O próprio Franklin, deve-se notar, foi o principal editor
de obras religiosas na Philadelphia, e a sua prontidão em imprimir os sermões e
jornais de Whitefield mostram o seu julgamento da influência que Whitefield
exercia na mente dos americanos.
Maclaurin, Willison, Macculloch, foram ministros
escoceses cujos nomes são bem conhecidos no norte de Tweed, sendo que os dois
primeiros merecidamente alcançaram elevada posição como escritores teológicos.
Todos eles têm testificado repetidamente que Whitefield foi um instrumento na
realização de imenso bem na Escócia. Willison em particular diz, ‘que Deus o
honrou com surpreendente sucesso entre pecadores de todas as classes e convicções’.
O velho Henry Venn de Huddersfield e Yelling foi um
homem de forte bom senso, assim como de grande graça. Sua opinião foi que ‘se a
grandeza, extensão, sucesso e a ausência de sentimentos interesseiros nos
labores de um homem podem conferir distinção entre os filhos de Cristo, então
estamos autorizados a afirmar que dificilmente qualquer um se igualou ao Sr.
Whitefield’. Novamente ele diz: ‘Ele foi abundantemente bem sucedido nos seus
amplos labores. Os selos do seu ministério, do início ao fim, estou persuadido,
foram maiores do que poderiam ser creditados se o número pudesse ser fixado.
Uma coisa é certa: sua espantosa popularidade devia-se apenas à sua utilidade,
pois ele mal abria a sua boca como um pregador e Deus conferia uma
extraordinária bênção às suas palavras.’
John Wesley não concordava com Whitefield em vários
pontos teológicos de não pouca importância. Mas quando pregou seu sermão
fúnebre, ele disse: ‘Temos nós lido ou ouvido de alguma pessoa que tenha
chamado tantos milhares, tantas miríades de pecadores ao arrependimento? Acima
de tudo, temos nós lido ou ouvido de alguém que tenha sido um instrumento
abençoado na condução de tantos pecadores das trevas para a luz, e do poder de
Satanás para Deus?’
Indubitavelmente, estes testemunhos são valiosos, mas
há um ponto que eles não mencionaram. Este ponto é a quantidade do bem indireto
que Whitefield realizou. Embora os efeitos diretos dos seus labores tenham sido
grandes, eu acredito firmemente, que os efeitos indiretos foram ainda maiores.
Seu ministério foi uma benção para milhares que talvez nunca o tenham visto ou
ouvido.
Ele foi o primeiro, entre os evangelistas do século
dezoito, a restaurar a atenção para as antigas verdades que produziram a
Reforma Protestante. Suas constantes afirmações das doutrinas ensinadas pelos
reformadores, suas repetidas referências aos artigos, homilias e escritos dos
melhores teólogos ingleses, obrigaram muitos a pensar, compungindo-os a
examinarem seus próprios princípios. Se toda verdade fosse conhecida, eu acredito
que comprovaria que a ascensão e progresso do corpo evangélico da Igreja da
Inglaterra recebeu um poderoso impulso de George Whitefield.
Mas este não é o único bem indireto que Whitefield fez
em seus dias. Ele estava entre os primeiros a mostrar o caminho correto para
enfrentar os ataques dos infiéis e céticos do cristianismo. Ele viu claramente
que a arma mais poderosa contra tais homens não é um debate metafísico e
dissertações críticas, mas pregar todo o Evangelho, viver todo o Evangelho, e
disseminar todo o Evangelho. Os escritos de Leland, do jovem Sherlock, de
Waterland, e de Leslie, não obtiveram a metade do sucesso que obteve a pregação
de Whitefield e seus companheiros em reprimir a enchente de infidelidade. Estes
foram os verdadeiros campeões do cristianismo. Infiéis raramente são abalados
por meros debates abstratos. Os argumentos mais certos contra eles são a
verdade do Evangelho e a vida do Evangelho.
Acima de tudo, ele foi o primeiro inglês que parece
ter entendido plenamente o que o Doutor Chalmers apropriadamente chamou de
sistema ofensivo. Ele foi o primeiro a ver que os ministros de Cristo devem
fazer o trabalho de pescadores de homens. Eles não devem esperar que as almas
venham a eles, mas devem ir atrás das almas, e ‘compeli-las a entrar’. Ele não
sentava comodamente ao lado de sua lareira, como um gato num dia de chuva,
lamentando-se a respeito da impiedade do país. Ele saía para enfrentar o diabo
na sua cidadela; atacava o pecado e a impiedade face a face, e não lhes dava
sossego.
Ele penetrava nas ruas e becos atrás de pecadores; caçava a ignorância
e o vício aonde quer que eles pudessem ser encontrados. Em resumo, ele aplicou
um sistema de ação, que até o seu tempo era comparativamente desconhecido no
seu país, mas um sistema o qual uma vez iniciado, nunca cessou de ser empregado
até o dia de hoje. Missões nas cidades, missões nos grandes centros, sociedades
de visitas distritais, pregações a céu aberto, missões nacionais, serviços
especiais, pregações em teatros, tudo são evidências de que o valor do ‘sistema
ofensivo’ é agora generalizadamente reconhecido por todas as igrejas. Agora nós
entendemos melhor como trabalhar do que entendíamos cem anos atrás. Mas nunca
esqueçamos que o primeiro homem a dar início a estes tipos de atividades foi
George Whitefield. Vamos dar a ele o crédito que merece.
O caráter peculiar da pregação de Whitefield é o
próximo assunto que demanda algumas considerações. Os homens naturalmente
desejam saber qual foi o segredo do seu sucesso sem paralelo. O assunto está
envolto em consideráveis dificuldades, e não é tarefa fácil formar um
julgamento correto a seu respeito. A idéia comum de muitas pessoas de que ele
era um mero e comum metodista exaltado, notável por nada mais a não ser sua
grande fluência, forte doutrina e uma poderosa voz, não suporta uma momentânea
investigação.
O Dr. Johnson foi tolo o suficiente para dizer, que ‘ele
vociferava e impressionava, mas não chamava mais atenção do que um charlatão; e
que ele chamava atenção não por fazer melhor do que os outros, mas porque fazia
algo estranho’. Mas Johnson foi tudo, exceto infalível nas suas opiniões sobre
pastores e religião. Tal teoria não tem validade. Ela contradiz fatos
inegáveis.
E fato que nenhum pregador na Inglaterra jamais obteve
tanto sucesso em atrair a atenção de tão grandes multidões como Whitefield ao
pregar constantemente ao redor de Londres. Nenhum pregador jamais foi tão
universalmente popular em cada país que visitou, Inglaterra, Escócia e América.
Nenhum pregador jamais manteve sua influência tão completamente sobre seus
ouvintes como ele o fez por 34 anos. Sua popularidade nunca desvaneceu. Ela era
tão grande no fim dos seus dias como o foi no início. Onde quer que ele
pregasse, os homens deixavam suas lojas e empregos para reunirem-se ao redor
dele, e ouvir como quem ouve para a eternidade. Só isso já é um grande fato.
Obter a atenção das ‘massas’ por um quarto de século, e pregar incessantemente
por todo este tempo é uma evidência de um poder não comum.
Outro fato, é que a pregação de Whitefield produzia um
poderoso efeito em pessoas de todos os níveis. Ele ganhou a admiração das altas
e baixas camadas, dos ricos assim como dos pobres, dos eruditos assim como dos
ignorantes. Se a sua pregação houvesse sido popular apenas entre os ignorantes
e pobres, nós poderíamos pensar na possibilidade de que havia pouco nela exceto
declamação e barulho. Mas, longe de ser este o caso, ele parece ter sido aceito
por um bom número de nobres e pessoas bem educadas. O Marquês de Lothian, o
Conde de Leven, o Conde de Duchan, o Lord Rae, o Lord Dartmouth, o Lord James
A. Gordon, poderiam ser citados entre os seus mais calorosos admiradores, além
de Lady Huntyngdon e uma grande quantidade de senhoras da Corte.
E um fato que eminentes críticos e homens de letras,
como o Lord Bolingbroke e o Lord Chesterfield, foram pessoas que se deleitavam
em ouvi-lo freqüentemente. Era reconhecido que mesmo o frio e artificial
Chesterfield aquecia-se com a eloqüência de Whitefield. Bolingbroke disse: ‘Ele
é o homem mais extraordinário do nosso tempo. Ele tem a eloqüência mais
impressionante que jamais ouvi em qualquer pessoa.’ Franklin, o filósofo, não
mediu palavras ao falar dos poderes da sua pregação. Hume, o historiador,
declarou que valia a pena viajar vinte milhas para ouvi-lo.
A verdade é que fatos como estes não podem ser
invalidados. Eles derrubam completamente a teoria de que a pregação de
Whitefield não foi nada, exceto barulho e exaltação. Bolingbroke, Chesterfield,
Hume, e Franklin não eram facilmente enganáveis. Eles não eram juízes
insignificantes de eloqüência. Eles estavam provavelmente entre os críticos
mais qualificados de seus dias. Suas opiniões imparciais e sem preconceito
parecem-me suprir uma prova inquestionável de que deve ter havido algo muito extraordinário
a respeito da pregação de Whitefield. Mas, afinal, a questão permanece sem ser
respondida: qual foi o segredo da popularidade e efetividade sem rival de
Whitefield? Eu admito francamente que, devido à escassez das fontes que
possuímos para formar nosso julgamento, a pergunta é difícil de ser respondida.
Entretanto, eu me aventuro a dizer ousadamente, que
com todas as suas faltas, os sermões impressos de Whitefield recompensarão sua
leitura. O leitor deve lembrar-se de que eles não foram preparados
cuidadosamente para impressão, como os sermões de Melville ou Bradley, mas foram
pessimamente registrados, paragrafados, e pontuados, devendo lê-los com isto
continuamente em sua mente. Além disso, deve lembrar-se que uma composição em
inglês para ser falada a ouvintes, e uma composição em inglês para leitura
privada, são quase que duas línguas diferentes; de modo que sermões bons para
serem pregados são ruins quando lidos. Lembremo-nos destas duas coisas, e
julguemos de acordo, e eu estaria muito enganado se não viéssemos a encontrar
muito o que admirar em muitos dos sermões de Whitefield. Da minha parte, eu
devo dizer claramente que eles são grandemente subestimados.
Deixe-me agora destacar o que parece ter sido as
características distintivas da pregação de Whitefield.
Whitefield pregava um Evangelho singularmente puro.
Talvez poucos homens tenham dado aos seus ouvintes tanto trigo e tão pouco
restolho. Ele não se levantava para falar sobre sua denominação, sua causa, seu
interesse ou seu ofício. Ele estava perpetuamente lhe falando a respeito dos
seus pecados, do seu coração, de Jesus Cristo, do Espírito Santo, da absoluta
necessidade de arrependimento, fé e santidade, do modo como a Bíblia apresenta
estes importantes assuntos. ‘Oh, que justiça a de Jesus Cristo!’ Ele sempre
dizia: ‘Eu devo ser desculpado se menciono isso em quase todos os meus
sermões.’ Pregação desse tipo é a pregação que Deus se deleita em honrar. Ela
deve ser preeminentemente uma manifestação da verdade.
A pregação de Whitefield era singularmente lúcida e
simples. O que quer que seus ouvintes pensassem da sua doutrina, não podiam
deixar de entender o que ele queria dizer. Seu estilo de falar era fácil, claro
e coloquial. Ele parecia abominar sentenças longas e complicadas. Ele sempre
tinha em vista o seu alvo e se dirigia diretamente para lá. Ele dificilmente
atrapalhava seus ouvintes com argumentos obscuros e raciocínios intrincados.
Afirmativas bíblicas simples, ilustrações adequadas, e exemplos pertinentes,
eram as armas mais comuns que ele usava. A conseqüência era que seus ouvintes
sempre o entendiam. Ele nunca atirava acima das cabeças dos seus ouvintes. Aí
está outro importante elemento para o sucesso do pregador. Ele deve esforçar-se
de todos os modos para ser entendido. O arcebispo Usher tinha um ditado muito
sábio: ‘Fazer coisas simples parecerem difíceis é coisa que qualquer homem pode
fazer, mas fazer coisas difíceis, simples, é a obra de um grande pregador’.
Whitefield era um pregador singularmente ousado e
direto. Ele nunca usava aquela expressão indefinida ‘nós’, que parece tão
peculiar nos nossos púlpitos, e que apenas deixa a mente do ouvinte em um
estado enevoado e confuso. Ele enfrentava os homens face a face, como alguém
que tem uma mensagem de Deus para eles: ‘Eu vim aqui para lhe falar a respeito
da sua alma.’ O resultado era que muitos dos seus ouvintes costumavam pensar
que os seus sermões eram dirigidos especialmente a eles. Ele não ficava
contente como muitos, em apenas insistir em uma aplicação pobre, como que um
apêndice no final de um longo discurso, pelo contrário, um constante veio de
aplicação corria através de todos os seus sermões. ‘Isto é para você, e isto é
para você’. Seus ouvintes nunca eram deixados sozinhos.
Outra característica marcante da pregação de
Whitefield era o seu singular poder de descrição. Os árabes têm um provérbio
que diz: ‘o melhor orador é aquele que pode transformar os ouvidos dos homens
em olhos.’ Whitefield parece ter tido uma faculdade peculiar para fazer isto.
Ele dramatizava tão plenamente seu assunto, que parecia fazê-lo mover-se e
andar diante dos seus olhos. Ele costumava traçar um desenho tão vivo das
coisas que estava tratando, que seus ouvintes podiam crer que na verdade as
viam e ouviam. ‘Em uma ocasião,’ diz um de seus biógrafos, ‘Lord Chesterfield
estava entre seus ouvintes.
O grande pregador ao descrever a miserável condição
de um pecador não convertido, ilustrou o assunto descrevendo um mendigo cego. A
noite estava escura e o caminho perigoso. O pobre mendicante foi abandonado
pelo seu cachorro próximo da beira de um precipício, e não tinha nada para ajudá-lo
a apalpar seu caminho senão sua bengala. Whitefield empolgou-se tanto com seu
assunto e o descreveu com tal poder gráfico, que todo o auditório ficou em
total silêncio e sem respirar, como se estivesse vendo os movimentos do pobre
velho homem; e finalmente, quando o mendigo estava a ponto de dar o passo fatal
que o faria precipitar-se do despenhadeiro para inevitável destruição, Lord
Chesterfield correu para salvá-lo exclamando em alta voz, ‘Ele caiu. Ele caiu!’
O nobre Lord tinha sido tão inteiramente arrebatado pelo pregador, que
esqueceu-se de que tudo era apenas uma descrição.’
Outra característica dominante da pregação de
Whitefield era o seu tremendo fervor. Um homem pobre e sem educação disse que
‘ele pregava como um leão.’ Ele conseguia mostrar ao povo que ele pelo menos
cria em tudo que estava dizendo, e que o seu coração, alma, mente, e força,
estavam empenhados em fazê-los acreditar nisto também. Os seus sermões não eram
como os disparos vespertinos de canhão em Portsmouth, um tipo de descarga
formal, disparada continuamente, mas que não perturba ninguém. Eles eram todos
cheios de vida e de fogo. Não havia como escapar deles. Dormir era praticamente
impossível. Você tinha que ouvir quer gostasse ou não. Havia neles uma santa
violência que tomava de assalto a sua atenção. Você seria facilmente
conquistado por sua energia antes que tivesse tempo de considerar o que fazer.
Isto, podemos estar certos, era um dos segredos do seu sucesso. Nós devemos
convencer os homens, de que nós mesmos somos sinceros, se quisermos ser
acreditados. A diferença entre um pregador e outro, freqüentemente não está
tanto nas coisas que são ditas, quanto no modo como são ditas.
Foi registrado por um de seus biógrafos que um senhor
americano foi ouvi-lo, pela primeira vez, em conseqüência de um relato que
ouvira dos seus poderes de pregação. O dia estava chuvoso, a congregação
comparativamente pequena e o início do sermão um tanto quanto pesado. Nosso
amigo americano começou a dizer a si mesmo: ‘Este homem não é nenhum grande
prodígio, afinal de contas’. Ele olhou ao redor e percebeu a congregação tão
pouco interessada quanto ele mesmo. Um homem de idade, em frente do púlpito,
havia adormecido. Mas subitamente, Whitefield interrompeu. Sua expressão mudou.
E então exclamou subitamente em um tom alterado: ‘Se eu tivesse vindo falar a
vocês em meu próprio nome, bem que vocês poderiam descansar seus cotovelos em
seus joelhos, e suas cabeças nas mãos e dormir; e apenas olharem aqui e ali,
dizendo:do que este tagarela está falando? Mas eu não vim em meu próprio nome.
Não! Eu vim em nome do Senhor dos Exércitos!’ (então ele baixou as mãos e os
pés com tanta força que fez com que o prédio tremesse), ‘E eu preciso ser
ouvido.’ A congregação assustou-se.
O homem de idade logo acordou. ‘Ah, Ah.’
Gritou Whitefield fixando nele os olhos, ‘eu o acordei, não foi? Era exatamente
o que eu tencionava. Eu não vim aqui para pregar a troncos e pedras: eu vim a
vocês em nome do Senhor dos Exércitos e preciso e terei uma audiência.’ Os
ouvintes foram rapidamente arrancados de sua apatia. Cada palavra do sermão a
partir daí foi ouvida com profunda atenção, e o senhor americano nunca mais
esqueceu o episódio.
Outra característica da pregação de Whitefield que
merece uma nota especial era a enorme carga de emoção e sentimentos que
continha. Não era coisa incomum para ele chorar profusamente no púlpito.
Cornelius Winter, que freqüentemente o acompanhou em suas últimas jornadas, foi
tão longe ao ponto de dizer que dificilmente o presenciara terminar um sermão
sem algumas lágrimas. Mas, não parece ter havido nada de fingimento nisto. Ele
se emocionava intensamente pelas almas diante dele e seus sentimentos
encontravam uma saída nas lágrimas. De todos os ingredientes do seu sucesso,
nenhum, eu suspeito, foi tão poderoso como este. Isto despertava afeições e
tocava fontes secretas nos homens, as quais nenhuma argumentação e demonstração
poderiam mover. Isto suavizava os preconceitos que muitos haviam concebido
contra ele. Eles não podiam odiar o homem que chorava tanto por suas almas. ‘Eu
vim ouvi-lo,’ alguém disse a ele, ‘com os meus bolsos cheios de pedras, com a
intenção de quebrar a sua cabeça; mas o seu sermão alcançou o melhor de mim e
quebrou o meu coração.’ Uma vez que alguém se torne convencido de que um homem
o ama, este ouvirá alegremente o que ele tem a dizer.
Eu agora pedirei ao leitor que acrescente a esta
análise da pregação de Whitefield o fato de que até por natureza ele possuía
vários dos dons mais raros, os quais habilitam um homem a ser um orador. Seus
gestos eram perfeitos – tão perfeitos que até mesmo Garrick, o famoso ator, o
louvava sobremaneira. Sua voz era tão poderosa quanto seus gestos – tão
poderosa que ele podia fazer com que trinta mil pessoas o ouvissem de uma vez,
e ainda assim tão musical e bem entoada que alguns diziam que ele podia
arrancar lágrimas pelo modo como pronunciava a palavra ‘Mesopotâmia’. Sua
postura no púlpito era tão curiosamente graciosa e fascinante que era dito que
as pessoas que o ouviam, em cinco minutos estavam esquecidas de que ele era
vesgo. Sua fluência e domínio de uma linguagem apropriada eram da mais alta
ordem, inspirando-o sempre a usar a palavra certa e a colocá-la no correto
lugar. Acrescente, eu repito, estes dons às coisas já mencionadas e então considere
se não há o suficiente em nossas mãos para explicar seu poder e popularidade
como pregador.
Da minha parte, não hesito em dizer que acredito que
nenhum pregador inglês jamais possuiu tal combinação de excelentes
qualificações como Whitefield.
Alguns, sem dúvida, o superaram em alguns dos
seus dons; outros, talvez, o igualaram em outros. Mas, quanto a uma combinação
bem balanceada de alguns dos mais finos dons que um pregador possa ter, unidos
a uma voz, postura, estilo, gestos e domínio de palavras, Whitefield, eu repito
minha opinião, está sozinho. Eu acredito que nenhum outro pregador inglês,
morto ou vivo, jamais o igualou. E eu suspeito que sempre descobriremos que
exatamente na proporção em que um pregador se aproxima dessa curiosa combinação
de raros dons os quais Whitefield possuía, exatamente nesta proporção eles
obtêm o que Clarendon define ser a verdadeira eloqüência – ‘um estranho poder
de se fazer acreditar.’
A vida íntima e o caráter pessoal desse grande herói
espiritual do século passado são um ramo do meu assunto no qual não me
demorarei. De fato, não há necessidade para fazer isso. Ele era um homem
singularmente transparente. Não havia nada sobre ele que requeresse apologia ou
explicação. Suas faltas e boas qualidades eram ambas claras e evidentes como o
meio-dia. Portanto, eu me contentarei em simplesmente destacar as
características proeminentes do seu caráter até onde for possível serem
deduzidas de suas cartas e dos relatos dos seus contemporâneos, e então trazer
meu esboço dele a uma conclusão.
Ele era um
homem de profunda e sincera humildade. Ninguém pode ler as suas mil e
quatrocentas cartas, publicadas pelo Doutor Gillies sem observar isto.
Repetidas vezes, no próprio apogeu de sua popularidade, nós o encontramos
falando de si mesmo e do seu trabalho nos termos mais baixos. ‘Deus, tem
misericórdia de mim, um pecador’, ele escreve em 11 de setembro de 1753, ‘e
dá-me, por amor da Tua infinita misericórdia, um coração humilde, agradecido e
resignado. Eu sou verdadeiramente mais vil do que o mais vil dos homens, e fico
espantado de usares tal miserável como eu’. ‘Que nenhum dos meus amigos,’ ele
escreve em 27 de dezembro de 1753, ‘clame a tal verme indolente, morno e
inútil: poupa-te a ti mesmo.
Ao invés disso, estimulem-me, eu suplico, dizendo:
acorda, dorminhoco, e começa a fazer alguma coisa para o teu Deus.’ Linguagem
como esta, sem dúvida, parece tolice e fingimento para o mundo; mas o leitor da
Bíblia bem instruído verá nela a experiência do coração de todos os santos mais
brilhantes. E a linguagem de homens como Baxter, Brainerd e M’Cheyne. E a mesma
inclinação que havia no inspirado Apóstolo Paulo. Aqueles que têm mais luz e
graça são sempre os homens mais humildes.
Ele era um homem de ardente amor por nosso Senhor
Jesus Cristo. Este nome que está ‘acima de todo nome’ destaca-se
incessantemente em toda a sua correspondência. Como um ungüento perfumado, ele
dá um aroma a todas as suas cartas. Ele parece nunca cansar de dizer alguma
coisa a respeito de Jesus. ‘Meu Mestre’ como George Herbert dizia, nunca fica
fora de sua mente. Seu amor, Sua expiação, Seu sangue precioso, Sua justiça,
Sua prontidão em receber pecadores, Sua paciência e maneira meiga de lidar com
os santos, são temas que aparecem sempre frescos diante de seus olhos. Pelo
menos neste aspecto, há uma curiosa semelhança entre ele e aquele glorioso
teólogo escocês, Samuel Rutherford.
Ele era um homem de incansável diligência e labor no
que diz respeito nos negócios de seu Mestre. Seria difícil talvez, encontrar
alguém nos anais da Igreja que trabalhou tão duro por Cristo e se gastou tão
plenamente em seu serviço. Henry Venn, no sermão fúnebre em sua lembrança,
pregado em Bath, deu o seguinte testemunho, ‘Que sinal e prodígio foi este
homem de Deus, no que diz respeito à imensidão dos seus labores! Alguém não
pode senão ficar espantado que a sua estrutura mortal pudesse, pelo espaço de
quase trinta anos, sem interrupção, sustentar o peso deles; pois o que é mais
fatigante á estrutura humana, especialmente na juventude, do que um esforço
longo, contínuo, freqüente e violento dos pulmões? Quem que conheça sua
estrutura pensaria ser possível que uma pessoa pouco acima da idade adulta,
pudesse falar em uma simples semana, e isto durante anos – em geral quarenta
horas, e em muitas semanas, sessenta – e isto para milhares de pessoas; e após
seus labores, ao invés de descansar, poderia elevar orações e intercessões, com
hinos e cânticos espirituais, como costumava fazer, em cada casa à qual era
convidado? A verdade é que, no que diz respeito ao labor, este extraordinário
servo de Deus fez em algumas semanas tanto quanto a maioria daqueles que,
embora se esforçando, consegue fazer no espaço de um ano.
Ele foi até o fim, um homem de eminente auto-negação.
Seu estilo de vida era o mais simples. Ele foi notadamente um exemplo típico de
moderação no comer e beber. Durante toda a sua vida, ele acordava muito cedo.
Sua hora habitual de levantar-se era às quatro horas, tanto no verão como no
inverno; e era igualmente pontual na hora de recolher-se, cerca de dez horas da
noite. Um homem de oração, ele freqüentemente gastava noites inteiras em
leitura e devoção. Cornelius Winter, que freqüentemente dormia no mesmo quarto,
diz que ele às vezes levantava durante a noite com este propósito. Ele ligava
muito pouco para dinheiro, exceto como uma ajuda para a causa de Cristo, e o
recusava, quando lhe era oferecido para seu próprio uso. Uma vez recusou a
importância de sete mil libras. Ele não acumulou fortuna nem estabeleceu uma
próspera família. O pouco dinheiro que ele deixou ao morrer provinha
inteiramente de doações de amigos.
O comentário vulgar que o Papa fez a
respeito de Lutero, ‘este animal alemão não ama o ouro’, poderia bem ter sido
aplicado a Whitefield.
Ele era um homem de notável desinteresse e
simplicidade. Ele parecia viver apenas para dois objetivos: a glória de Deus e
a salvação de almas. Ele não tinha objetivos secundários ocultos. Ele não
levantou nenhum grupo de seguidores que tomassem seu nome. Ele não estabeleceu
nenhum sistema denominacional que adotasse seus próprios escritos como
elementos cardinais. Uma expressão sua é bem característica do homem: ‘Que o
nome de George Whitefield pereça contanto que Cristo seja exaltado’.
Ele era um homem de um espírito singularmente feliz e
alegre. Ninguém que o visse poderia jamais duvidar que ele se deleitava na sua
religião. Perseguido que foi de muitas maneiras por todo o seu ministério –
caluniado por alguns, desprezado por outros, deturpado por falsos irmãos,
sofrendo oposição em todo lugar pelo clero ignorante do seu tempo, preocupado
por incessante controvérsia – sua flexibilidade nunca falhou. Ele era um
cristão eminentemente alegre, cuja própria conduta recomendava a obra de seu
Mestre. Uma venerável senhora de New York, após sua morte, ao falar das
influências através das quais o Espírito ganhou seu coração para Deus, usou
estas notáveis palavras: ‘O Senhor Whitefield era tão feliz que isso me
provocou a tornar-me uma cristã.’
Finalmente, mas não menos importante, ele era um homem
de extraordinária caridade, catolicidade e liberalidade na sua religião. Ele
nada conhecia daquele sentimento tacanho que faz com que alguns homens imaginem
que tudo tem que ser estéril, fora de seus próprios campos, e que sua própria
denominação tem um completo monopólio da verdade e do Céu. Ele amava todos os
que amavam o Senhor Jesus com sinceridade. Ele media a todos com a medida que
os anjos usam, ‘professam eles arrependimento para com Deus, fé no nosso Senhor
Jesus Cristo e santidade de vida?’ Se sim, eles eram seus irmãos. Sua alma
ligava-se com estes homens, qualquer que fosse o nome com que fossem chamados.
Diferenças menores eram madeira, palha e restolho para ele. As marcas do Senhor
Jesus eram as únicas marcas que lhe interessavam. Essa catolicidade era mais
notável quando o espírito dos tempos em que viveu é considerado. Até mesmo os
Erskines, na Escócia, queriam que ele não pregasse em nenhuma outra denominação
que não a deles – isto é, a Igreja da Cessessão. Ele perguntou: ‘Por que
somente para eles?’ – E recebeu a incrível resposta que ‘eles eram o povo do
Senhor.’ Isto foi mais do que Whitefield podia suportar.
Ele disse: ‘Se não há
nenhum outro povo de Deus senão eles, se todos os outros são povo do diabo,
eles certamente têm mais necessidade de pregação;’ E ele finalizou
informando-os de que ‘se o próprio Papa lhe cedesse seu púlpito, ele
proclamaria alegremente nele a justiça de Cristo.’ A esta catolicidade de
espírito ele aderiu todos os seus dias. Se outros cristãos o deturpassem, ele
os perdoava, e se recusassem trabalhar com ele, ainda assim ele os amava. Nada
pode ser um testemunho mais valioso contra a intolerância do que o seu pedido,
feito pouco antes da sua morte que, quando morresse, John Wesley fosse
convidado para pregar no seu enterro. Wesley e ele há muito não concordavam
sobre pontos calvinistas; mas Whitefield, até o fim, estava determinado a
esquecer as diferenças superficiais, e a considerar Wesley como Calvino
considerou Lutero: ‘Simplesmente um bom servo de Jesus Cristo.’ Em outra
ocasião um severo professor de religião lhe perguntou ‘se ele pensava que veria
John Wesley no céu?’ ‘Não, senhor,’ foi a sua extraordinária resposta; ‘eu temo
que não. Ele estará tão próximo do trono, e nós tão distantes, que dificilmente
o veremos’.
Longe de mim dizer que o assunto deste capítulo foi um
homem sem faltas. Como todos os santos de Deus, ele foi uma criatura
imperfeita. Ele às vezes errava nos seus julgamentos. Ele freqüentemente tirava
conclusões precipitadas sobre a providência divina, e se enganava, tomando as
suas próprias inclinações como sendo direção de Deus. Ele era freqüentemente
apressado, tanto com sua língua como com sua pena. Ele não hesitava em dizer
que o ‘Arcebispo Tillotson não sabia mais do Evangelho do que Maomé.’ Ele errava
em distinguir algumas pessoas como inimigas do Senhor e outras como amigas do
Senhor tão precipitada e positivamente como às vezes fazia. Era censurável sua
atitude de denunciar muitos ministros como ‘fariseus,’ porque não aceitavam a
doutrina do novo nascimento. Mas ainda assim, apesar de tudo que foi dito, não
pode haver dúvida de que, no geral, ele era um homem eminentemente santo, que
se auto-negava, e consistente. ‘As faltas do seu caráter,’ diz um escritor
americano – ‘eram como pontos no sol, detectadas sem muita dificuldade por
qualquer observador moderado e cuidadoso que se esforce em procurá-las, mas,
para todo propósito prático, são pontos perdidos numa efulgência geral e
afável’. Quão bom seria para as igrejas dos nossos dias, se Deus lhes desse
mais ministros como o grande evangelista da Inglaterra de cem anos atrás!
Fonte: Reforma & Razão
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