A Igreja em Antioquia (11:19-26)
Esta seção fala de dois movimentos da Igreja
Primitiva ao longo do mar Mediterrâneo. O primeiro foi rumo ao norte, a partir
de Jerusalém para Antioquia, na Síria. O Evangelho foi pregado livremente
naquela cidade distante. O segundo foi rumo ao sul, de Antioquia a Jerusalém. O
primeiro levou as bênçãos espirituais da salvação àqueles que estavam no
Norte. O segundo trouxe bênçãos materiais dos novos convertidos para os
irmãos necessitados em Jerusalém. Como se faz menção de Chipre (uma ilha),
é bem provável que eles tenham viajado por barco.
Rumo ao Norte (11.19-26).
As palavras iniciais
deste parágrafo — E os que foram dispersos (19) — são
exatamente as mesmas em grego, na frase inicial de 8.4. Outro ramo da
diáspora cristã aqui é tomado e contado. Esta dispersão teve início com a
perseguição que sucedeu por causa de Estêvão (cf. 8.1).
Os cristãos dispersos viajaram para o norte até
a Fenícia (as cidades de Tiro e Sidom), o Líbano moderno,
na costa norte da Palestina, Chipre — a maior ilha
da extremidade leste do mar Mediterrâneo — e Antioquia. Esta
cidade, fundada em 300 a.C, tinha se tornado a terceira maior cidade do
Império Romano, superada apenas por Roma e Alexandria. Diz-se que as suas
muralhas encerravam uma área maior do que as de Roma. A oito quilômetros da
cidade, ficava o bosque de Dafne, um importante centro de adoração a Apolo e
Ártemis [ou Artemisa]. Como um resultado parcial disto, Antioquia
era famosa pela sua imoralidade. Ainda assim, muitos judeus e
prosélitos ali viviam. Eles foram evangelizados em primeiro lugar, pois
foi dito que os primeiros missionários não estavam anunciando a ninguém a
Palavra senão somente aos judeus. Isto provavelmente aconteceu antes da
experiência de Pedro em Cesaréia.
Felizmente, havia alguns homens de Chipre
e Cirene (Norte da África) que eram um pouco mais esclarecidos.
Quando eles chegaram a Antioquia, pregaram o Senhor Jesus aos gregos
(20). Embora os antigos manuscritos gregos façam uma diferença entreHellenas ("gregos")
e Hellenistas (helênicos"), o contexto deixa claro
que esta nova pregação se dirigia aos gentios. Os evangelizadores — anunciando é
a palavra euangelizomenoi — estavam proclamando as Boas Novas
sobre o Senhor Jesus, ou proclamando que Jesus é o Senhor.
Como estavam obedecendo às ordens de Cristo
(Mt 28.19), eles viram o cumprimento da sua promessa (1.8) — a
mão do Senhor era com eles (21), i.e., o seu poder se
manifestava no seu ministério. O resultado foi que grande número creu e se converteu
ao Senhor.Antioquia em pouco tempo tornou-se o principal centro do
cristianismo.
A fama do que estava acontecendo em Antioquia
chegou aos ouvidos da igreja que estava em Jerusalém (22).
Preocupados quanto a esta evangelização dos gentios estar de acordo
com a ordem divina, os líderes enviaram Barnabé até Antioquia. Isto pode
implicar que ele verificaria o trabalho na Fenícia (19) no seu caminho para o
Norte.
A igreja de Jerusalém não poderia ter escolhido
alguém melhor do que Barnabé para esta missão. Ele era um verdadeiro
"filho da consolação" (4.36), onde quer que fosse. Um cristão judeu
legalista e preconceituoso certamente teria impedido o maravilhoso movimento
do Espírito de Deus em Antioquia. Mas Barnabé o encorajou: o qual,
quando chegou e viu a graça de Deus, se alegrou e exortou a todos a que, com
firmeza de coração, permanecessem no Senhor (23). O generoso Barnabé
estava tão integralmente consagrado ao seu Senhor que se alegrava por ver
qualquer pessoa — até mesmo um gentio — aceitando a Cristo. Ao invés de
criticar o novo movimento, ele lhe deu a sua aprovação e a sua bênção. Ele se
alegrou por ver a graça de Deus em operação nesta cidade tão necessitada.
O próprio Barnabé era um judeu natural de Chipre (4.36), o que fazia
com que ele se harmonizasse perfeitamente com os evangelizadores de Chipre
e Cirene. Ele exortou os novos convertidos, cumprindo assim o significado
do seu nome: "filho da exortação".
A descrição de Barnabé é quase tão nobre quanto
poderia ser a de qualquer homem: Porque era homem de bem e cheio do
Espírito Santo e de fé (24). As três coisas aqui afirmadas a respeito
de Barnabé formaram os pontos principais de muitos sermões fúnebres. O pastor
consagrado sempre fica feliz quando pode dizer essas coisas sobre um membro
falecido de sua igreja. O resultado do caráter e do ministério deste bom homem
de Deus cheio do Espírito Santo e inspirado pela fé foi que muita gente se uniu
ao Senhor. Mas Barnabé precisava de ajuda. A tarefa em Antioquia era
excessivamente grande para ele. Esta metrópole cosmopolita de língua grega
exigia os serviços tanto de um gigante intelectual quanto de um exortador cheio
do Espírito. Assim, Barnabé foi até Tarso, cerca de 200 quilômetros a noroeste
de Antioquia para buscar Saulo (25). Feliz é o homem que
percebe as suas limitações, e que está disposto a trazer um ajudante à altura
da situação. O desprendido Barnabé desejava somente o que era melhor para o
Reino. Assim, ele foi buscar Saulo, o brilhante e altamente educado jovem
rabino judeu que havia se convertido alguns anos antes. Saulo teve um bom
início no seu ministério, e depois tinha sido enviado para casa pela igreja de
Jerusalém (9.30), quando passou a correr um risco de vida.
Achando-o, o conduziu para Antioquia (25).
As palavras
"buscar" e achando sugerem que Barnabé teve de
procurar por algum tempo antes de encontrar Saulo. É provável que Saulo
estivesse ocupado evangelizando a sua província da Síria e Cilícia, como
ele mesmo indica (Gl 1.21). Durante todo um ano, Barnabé e Saulo se reuniram naquela
igreja e ensinaram muita gente. Deve ter sido um ano de ministério muito
frutífero para ambos — o generoso Barnabé exortando e encorajando o povo, e o
perspicaz Saulo expondo as Escrituras e exaltando a Cristo. Eles formavam uma
equipe maravilhosa.
Uma afirmação muito interessante aparece no final
deste versículo: Em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez,
chamados cristãos. Até agora, eles tinham sido designados como
"fiéis", "irmãos", "santos", "do
Caminho", e, como aqui, "discípulos". Mas como os judeus usavam
normalmente as designações "irmãos" e "discípulos",
era necessário atribuir um nome mais peculiar que inquestionavelmente indicasse
os discípulos de Cristo.
A palavra "cristão" aparece somente
duas outras vezes no Novo Testamento. Agripa disse a Paulo: "Por
pouco me queres persuadir a que me faça cristão" (26.28). E Pedro
escreveu: "se padece como cristão [sendo perseguido pelo mundo por ter
esse nome], não se envergonhe" (1 Pe 4.16). A história da
atribuição do nome, tomada em conjunto com este fato, sugere que cristãos não
foi uma designação escolhida por eles mesmos, mas que lhes foi atribuída por
aqueles que estavam fora da igreja. Além disso, é muito improvável que os
judeus chamassem os crentes por este nome. Gloag observa: "Não
se deve supor que eles dariam esse nome sagrado Christosàqueles que
eles consideravam hereges e apóstatas". Os judeus os chamavam
de "nazarenos" (24.5), uma expressão de desprezo.
Parece claro que a designação cristãos foi
dada aos discípulos pelos gentios de Antioquia, como Meyer afirma. Sempre
se supôs que este termo era usado como uma zombaria. Mas Meyer insiste:
"Não há nada que apóie a opinião de que a palavra foi, a princípio, um
título ridículo". Ao contrário, como os gregos e os romanos normalmente
designavam partidos políticos pelos nomes dos fundadores, assim também eles se
referiam a este grupo como cristãos. Lake e Cadbury observam
acertadamente que a palavra "implica que Christosjá tinha
sido adotado pela população gentia como um nome próprio — um hábito
ao qual os cristãos surpreendentemente logo se submeteram, como é demonstrado
pelo uso da palavra por Paulo". Originalmente, "Cristo" — lit.,
"o Cristo" — significava "o Messias". Foi um título
adicionado ao nome Jesus, "Jesus, o Cristo", quando pregava aos
judeus. Mas os gentios naturalmente o adotaram como um nome próprio.
O fato de que o povo de Antioquia julgou necessário
dar um nome ao novo movimento na cidade mostra como este movimento tinha
crescido. Ele precisava ser reconhecido e designado. Gloag escreve:
"Enquanto o cristianismo estava confinado aos judeus e aos prosélitos, os
cristãos não eram distinguidos deles, e eram considerados pelos gentios como
uma seita judaica; mas agora o fato de que inúmeros gentios eram recebidos sem
circuncisão dentro da igreja era uma prova de que o cristianismo era diferente
do judaísmo, e assim os discípulos não mais seriam encarados como
os saduceus, fariseus, essênios e outras seitas judaicas".
A história da evangelização de Antioquia ilustra
"Quando o Evangelho tem sucesso":
1. Quando é pregado a gente nova (19);
2. Quando é pregado a todas as classes e raças
(20-21);
3. Quando é pregado por homens cheios do Espírito
(22-26).
Bibliografia
R. Earle
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