Soteriologia Bíblica: Enfoque
na
Salvação dos Gentios
O Senhor, nosso
Deus, não faz acepção de pessoas (Dt 10.17; At 10.34; Rm 2.11; Ef 6.9). Criou
tudo e todos e preserva-os pela sua gloriosa bondade e justiça (Sl 36.6; 68.19;
103.13-19; 104.9-31; At 17.25-28). Ele ama a todos indistintamente e deseja a
salvação de toda humanidade (Jo 3.16; At 17.30,31; Rm 1.16; Tt 2.11), através
de seu Filho, Jesus (Mt 1.21; At 4.12; Rm 3.24; 2 Co 5.18).
OS GENTIOS NO
ANTIGO TESTAMENTO
1. As nações
descendentes de Noé (Gn 9.18,19).
Toda a raça humana
descende de um casal criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1.27; 5.2; Mc
10.6; At 17.25,26). O homem foi criado santo, justo e bom para a glória do nome
santo do Senhor (Gn 5.1; Sl 115.1; Ec 7.29; Is 43.7). Todavia, com a Queda e o
crescimento da maldade no mundo (Gn 4.8,23; 6.11,12), Deus enviou o Dilúvio,
salvando apenas a família do justo Noé (Gn 6 – 9; Hb 11.7; 1 Pe 3.20; 2 Pe
2.5). De seus descendentes, Jafé (Gn 10.2-5), Cam (Gn 10.6-20), e Sem (Gn
10.21-31), formaram-se as nações com suas respectivas geografias (Gn 10 – 11).
Entretanto, os homens continuavam desobedecendo a Deus (Gn 11.1-9), apesar dos
justos que sempre se mantiveram fiéis ao Deus verdadeiro em todas as gerações
(Gn 4.26; 5.22; Gn 7.1). Do interior desse cenário pecador, Deus chama um
descendente de Sem, Abraão, para que dele uma nova nação fosse formada (Gn
12.1-3).
2. A exclusividade
dos descendentes de Abraão (Gn 15.5,6; Dt 14.2).
Ao chamar Abraão
para que de seus descendentes fosse constituído uma nova nação ou povo eleito,
o Senhor começa uma nova história: A do povo de Israel (Gn 12.1-3; 13.14-17;
15.4-7,17-21). O propósito de Deus para a nação judaica (Gn 18.18; 22.18) era
torná-la propriedade peculiar, reino sacerdotal e povo santo (Êx 19.5,6).
Israel fora constituída uma nação peculiar e distinta dos outros povos, pois
Deus a escolhera para si (Is 44.1-2; Ez 20.5). A partir de então, todas as
etnias, raças, ou povos que não fossem descendentes de Abraão ou israelitas
eram considerados gôyim, cujo significado básico é “nações”, “estrangeiros”,
“gentios” ou “pagãos” (Gn 15.18-21). Essas nações são conhecidas pela
idolatria, depravação (Lv 18.22-24), e perversidade com que tratavam os seus
filhos (Lv 18.21; 20.2-5). Contudo, a nação de Israel não fora apenas eleita
para ser o instrumento pelo qual o Senhor alcançaria os gentios que
respondessem positivamente à salvação oferecida pelo Deus de Israel (Gn 12.3;
22.16-18; Sl 67.2-4), mas também o povo pelo qual o Eterno destruiria os
gentios rebeldes (Gn 12.3; 15.16; ver Dt 7 – 8; Gl 3.8).
3. A salvação dos
gentios anunciada no Antigo Testamento.
Apesar de o Senhor
estabelecer e amar a Israel, a nação desobedecia-o perversa e continuamente (2
Rs 21.2; 2 Cr 28.3; 36.14; Is 1.1-30; 30.9; 65.1-7; Rm 10.21). Contudo, Deus
prosseguiria com seu plano santo para oferecer aos gentios a redenção (Rm
11.25-310). Já ao crente Abraão Deus prometera que os gentios que o abençoassem
seriam abençoados, e nele, todas as famílias da terra seriam benditas (Gn 12.3;
Gl 3.8,9,13,14; Rm 4.17). Várias passagens das Escrituras revelam o amor de
Deus manifestado gratuitamente aos gentios que exerceram fé no Santo de Israel,
como por exemplo, Raabe (Js 6.1-27); Rute (Rt 1– 4 ); Naamã (2 Rs 5.1-19), e os
ninivitas (Jn 3.1-10). Se isso não bastasse, o Senhor prometera tornar os
gentios o seu povo (Is 11.1,10; 421-5; 52.15; 65.1; compare com Mt 12.18-21; At
15.14-18; Rm 9.25-30; 10.19-21; 15.8-12, 19-21).
4. A salvação dos
gentios interpretada pelo apóstolo Paulo.
Em nossa mais
recente obra, Igreja: Identidade e Símbolos, discutimos exaustivamente o tema
da igreja entre os gentios, a interpretação de Paulo a respeito da conversão
dos pagãos, e o estabelecimento de uma comunidade de redimidos entre eles. A
expressão ekklēsiai tōn ethnōn, em Rm 16.4, quer dizer “igreja dos gentios”.
Todavia não é impróprio traduzir a expressão por “igrejas das nações”, ou ainda
“igrejas étnicas”. No leitmov paulino ta ethnē corresponde aos gentios em
diversas perícopes ( vide Rm 2.14; 9.30; 15.9-11,12,16,27; Gl 2.8,9,14; 3.8,14;
Ef 2.11; 3.6; 4.17; 1 Ts 4.5; 1 Tm 4.17; ver ainda Mt 6.32; 12.21; Lc 12.30; At
10.45), aos pagãos (1 Co 12.2), ou às nações não-judaicas (Rm 16.26; cf. Mt
25.32; 28.19; Mc 13.10; Lc 21.24). Em qualquer um desses textos ta ethnē
corresponde aos pagãos, aos gentios, às nações não-judaicas, e também às
igrejas e cristãos gentílicos.
Especificamente, a
perícope paulina de Romanos 15.9-27, apresenta o caráter escatológico da igreja
dos gentios desde o Antigo Testamento. As citações do Salmo 18.49 no versículo
9, de Deuteronômio 32.43 no versículo 10, do Salmo 117.1 no versículo 11, e de
Isaías 11.1 no versículo 12 (entre outros) fundamentam a realidade
histórico-escatológica das igrejas dos gentios como projeto histórico-redentor
de Deus na História. Com muita perspicácia, Paulo cita textos da Torá, dos
Profetas e dos Escritos a fim de enfatizar, conforme J.J.Pilch, “que toda a
Escritura hebraica anunciou que os pagãos se tornariam parte do plano de Deus e
se juntariam ao povo escolhido”.
Na primeira
referência veterotestamentária, Davi refere-se às nações gentílicas que
habitavam nos limítrofes e até mesmo em Israel, conforme a citação de Tiago em
Atos 15.16,17. Paulo mantém a tônica dos ensinos de Romanos 9 – 11 em que a
salvação dos gentios está relacionada intrinsecamente ao paradoxo da rejeição e
salvação de Israel: “Como também diz em Oseias: Chamarei meu povo, ao que não
era meu povo; e amada, à que não era amada. E sucederá que no lugar em que lhes
foi dito: Vós não sois meu povo, aí serão chamados filhos do Deus vivo” (Rm
9.25,26). Deus, portanto, não chamou à igreja apenas dentre os judeus, mas
também dentre os gentios (Rm 9.24), e, segundo Bultmann, como “comunidade
escatológica e povo de Deus dos tempos finais”.
Na segunda incursão
nos textos hebraicos (v.10), Paulo traduz o hebraico gôy, “nação”, “povo”, mas
principalmente “pagãos”, “gentios” por panta ta ethnē, todas as nações,
conforme a LXX. Desde os primórdios da tradição patriarcal, os gôyim (plural),
apesar da incredulidade e paganismo, participariam, desde que cressem, das
bênçãos divinas prometidas a Abraão e a seus descendentes no futuro (Gn
12.1-3).
A ênfase e a
estrutura poética de Deuteronômio 32.21 clamam por uma abordagem específica.
Contudo, interessa-nos, por enquanto, o vaticínio profético da sentença. A
idolatria de Israel provocara a ira do Senhor, e, por conseguinte (ação e
reação), Deus provocaria o povo de Israel com “os que não são povo; com nação
louca” os despertaria à ira. (ver Dt 31.17,18).
A explicação
etno-soteriológica em Paulo entende que se trata insofismavelmente dos gentios.
Essa interpretação é reforçada pela leitura paulina do Salmo 117. 1, no
versículo 11 de Romanos 15. O plural hebraico gôyim é traduzido, como já
afirmamos, por panta ta ethnē pela LXX, opção também seguida por Paulo.
Portanto, escreve Paulo à igreja de Roma (1.7), “abundeis em toda esperança
pela virtude do Espírito Santo” (Rm 15.13). Não há qualquer restrição à igreja
dos gentios a respeito do Pneumatos Hagios. Eles devem “transbordar”
(perisseuo) na esperança (elpis), na alegria (khara), na paz (eirene) pelo poder
(en dynamei) do Espírito. Contudo, a igreja dos e entre os gentios trazia sua
própria identidade antropocultural, muito embora conservasse os principais
fundamentos da fé veterotestamentária e possuísse a virtude do Espírito (
OS GENTIOS EM O
NOVO TESTAMENTO
1. Nos Evangelhos.
Nos Evangelhos
encontramos referências aos gentios em Mateus (6.7,32; 12.18; 18.17, etc.),
Marcos (10.33) e Lucas (12.30; 18.32; 21.24; 22.25). Na maioria das vezes, os
gentios são descritos com suspeição (Mt 20.19; Mc 10.33), no entanto, Mateus
12.18-21 destaca a missão profética do Messias entre os gentios (Is 42.1-4),
enquanto Mateus 10.18 o testemunho dos apóstolos entre eles. Embora o objetivo
da missão de Cristo e dos Doze fosse anunciar o Reino dos céus às “ovelhas perdidas
da casa de Israel” (Mt 12.6; 15.24), muito gentios, assim como no Antigo
Testamento, foram alcançados pela graça de nosso Senhor Jesus, como por
exemplo, a mulher cananeia (Mt 15.21-28), e o centurião (Lc 7.1-10). João
afirma que Jesus veio para os judeus, mas eles o rejeitaram (Jo 1.11-13) e
crucificaram-no (Jo 19.13-16). Todavia, após a ressurreição, Jesus comissionou
os apóstolos para que anunciassem o evangelho a todos os gentios (Mt 28.19,20;
Mc 16.15,16), e não somente aos judeus.
2. Nos Atos dos Apóstolos.
A primeira menção
aos gentios em Atos refere-se ao conluio entre judeus e gentios para crucificar
o Messias (At 4.27). Embora Atos 1.8 estabelecesse a missão dos apóstolos entre
os gentios, somente em Atos 9.15, com a conversão de Paulo, é que se declara
enfaticamente a evangelização dos gentios (ver At 13.44-47). Todavia, a
resistência dos apóstolos em evangelizá-los (At 10.9-16) é vencida quando
Cornélio e os demais recebem o dom do Espírito Santo (At 10.44-48). O fato
trouxe perturbações (At 11.1-3,18), mas após a justificativa de Pedro (At
11.4-17 ver 15.7-11), a igreja glorificou a Deus pelo arrependimento dos
gentios (At 10.45; 11.18; 15.3,12). Porém, manteve-se anunciando o evangelho
somente aos judeus (At 11.19), e, posteriormente, constrangendo os gentios
crentes à circuncisão (At 15.1).
3. Missão e
Salvação entre os Gentios.
Se Pedro e o
evangelho da circuncisão são proeminentes nos capítulos 1 a 12 de Atos, dos
capítulos 13 ao 28 serão Paulo e o evangelho da incircuncisão (Gl 1.7). O primeiro
diz respeito aos judeus, e o segundo aos gentios (At 13.44-47). Paulo estava
consciente que fora chamado por Deus para anunciar o evangelho aos gentios (At
9.15; 13.47; 22.21; Rm 15.16; Ef 3.8), sem os entraves da lei (At 15.19, 28,
29; Rm 4.9-16). Diferentemente dos judeus incrédulos (At 13.46, 50; 14.2)
muitos gentios converteram-se ao Senhor (At 11.1,18; 13.20-23), e se
interessaram em ouvir o evangelho (At 13.42). Alguns receberam com alegria o
evangelho (At 13.48), mas outros, incitados pelos judeus, resistiram (At
14.1-6; 17.13). Contudo, Deus “abrira aos gentios a porta da fé” (At 14.27), e
nem mesmo os entraves do legalismo dos crentes judeus impediriam a salvação dos
gentios (At 15.20-31; Rm 3.29), como profetizado desde o Antigo Testamento (Rm
16.25-27).
4. As Atividades
Evangelísticas entre os Gentios.
Em nossa obra
Igreja: Identidade e Símbolos, comentamos que F.F.Bruce afirma que durante dez
anos, de 47-57 d.C., Paulo realizou intensa atividade missionária nos
territórios que margeiam o Mar Egeu. O labor paulino foi dirigido
especificamente às províncias romanas da Galácia, Macedônia, Grécia, Acaia e
Ásia. Contudo, uma leitura despretensiosa do livro de Atos dos Apóstolos
revelará as incursões missionárias:
1.
nas cidades das três províncias
litorâneas do Mediterrâneo (Lícia, Panfília, Cilícia),
2.
das três do litoral do Mar Egeu
(Mísia, Lidia, Caria),
3.
das três litorâneas ao Mar Negro
(Ponto, Bitínia, Paflagônia), e,
4.
nas províncias do interior
(Galácia, Capadócia, Licaônia, Pisídia, Frígia).
Entre as muitas
cidades que foram alvos da missão salvífica do apóstolo, destacam-se: Éfeso,
Tessalônica, Corinto, Galácia, Pérgamo, Tiatira, Atenas, Filadélfia, Esmirna,
Troade, Mileto, Laodiceia, Colossos, Sardes entre outras. As igrejas edificadas
nessas localidades foram citadas direta e indiretamente por Paulo em vários
textos de suas epístolas.
5. A Formação da
Igreja entre os Gentios.
Ainda em nossa obra
Igreja: Identidade e Símbolos, explicamos a formação da igreja gentílica,
referindo-nos ao fato de que Paulo faz várias referências à igreja gentílica
como uma comunidade local ou doméstica:“igreja que está em Cencreia”; “igreja
que está em sua casa”; “em cada igreja” (Rm 16.1.5; 1 Co 4.17). “Em cada
igreja” é, por extensão, “toda a igreja” (Rm 16.23; 1 Co 4.17). Febe servia a
Deus na comunidade cristã citadina de Cencreia, cidade portuária oriental de
Corinto. Provavelmente, a igreja mencionada não se reunia em templos, mas em
casa, como atesta o versículo 5 de Romanos 16, a respeito da comunidade cristã
que se reunia na casa de Prisca e Áquila (1 Co 16.19).
As ekklēsiai tōn
ethnōn, do versículo 4 (Rm 16), são as igrejas gentílicas da Ásia Menor que
agradecem ao casal Priscila e Áquila pelo esforço sacrifical a favor de Paulo.
Estas igrejas eram “comunidades paulinas”, compostas por cristãos de várias
etnias que viviam na Ásia. Entre eles, o Apóstolo dos Gentios destaca o irmão
Epêneto, “que é as primícias da Ásia para Cristo” (v.5). Este cristão, a quem
Paulo chama de agapētón mou, “meu amado”, fora um dos primeiros convertidos ao
evangelho na Ásia Menor. “As primícias da Ásia para Cristo”, refere-se à
fundação das igrejas citadinas na Ásia.
JUDEUS E GENTIOS
UNIDOS POR DEUS MEDIANTE A CRUZ
1. A igreja de
Deus.
Pedro em defesa do
evangelho entre os gentios afirmou que “Deus visitou os gentios, para tomar
deles um povo para o seu nome” (At 15.14). Esse novo povo é a Igreja, formada
por judeus e gentios convertidos a Cristo (Rm 9.29). De ambos os povos, judeus
e gentios, Cristo fez apenas um, “derribando a parede de separação que estava
no meio”, e, pela cruz, “reconciliou ambos com Deus em um corpo” (Ef 2.14-16).
Assim, o Espírito Santo revela a Paulo (Ef 3.4,5), que os gentios não são mais
estrangeiros (gôyim), nem forasteiros, mas concidadãos dos Santos, da família
de Deus (Ef 2.11-22; 1 Pe 2.5), co-herdeiros e participantes da promessa em
Cristo pelo evangelho (Ef 3.6).
2. Expansão da
igreja entre os gentios.
Através das viagens
missionárias de Paulo, o apóstolo dos gentios (Rm 11.13; Ef 3.7), o evangelho
propagou-se entre os povos, raças e culturas que estavam ao alcance dele
naqueles dias (Rm 15.19,20). Em várias regiões foram estabelecidas igrejas
formadas principalmente por gentios (Rm 16.4). Essas comunidades de redimidos
auxiliaram a igreja da Judeia, composta em sua maioria por judeus, em suas
necessidades (Rm 15.25-33; 2 Co 8 – 9). O Senhor Jesus estava preservando os
cristãos judeus por meio da riqueza da igreja gentílica.
3. A tarefa
inacabada.
A tarefa de
evangelização dos gentios ainda é uma das maiores responsabilidades da igreja
moderna. Quando Israel falhou em anunciar a salvação do Senhor entre as nações
pagãs, Deus levantou a igreja, formada por gentios e judeus crentes em Jesus.
Mas se nós, a igreja do Senhor, não anunciarmos o evangelho aos povos, quem
irá? Deus o chama para ser atalaia nesse mundo perverso (Mc 16.15-18).
CONCLUSÃO
A salvação dos
gentios sempre foi propósito do Senhor. Ele deseja que todos os homens sejam
salvos, pois ama a todos indistintamente. Em pleno século 21, muitos ainda não
ouviram falar do evangelho de Jesus. Não queres hoje ir aos gentios e
anunciar-lhes a salvação em Cristo?
Se você gostou
desse artigo, não se esqueça de adquirir nossa obra Igreja: Identidade e
Símbolos, onde tratamos de vários outros detalhes a respeito do estabelecimento
e formação da igreja entre os gentios.
notas CPADNEWS
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