Por mais de um século, o
povo judeu vinha sofrendo a humilhação de estar sob a dominação romana. Ao
entrar triunfante em Jerusalém, em 63 a.C., o general Pompeu teve o atrevimento
de penetrar no Templo, iniciando um período de profanação que acentuou ainda
mais a perda de independência da nação judaica. Entretanto, enquanto o Templo
permanecesse de pé e houvesse um rei judeu no trono (Agripa), haveria a
esperança de uma independência futura.
Por isso, à medida que o
século se aproximava do fim, a crescente expectativa messiânica combinava-se
com as aspirações nacionalistas judaicas e os conflitos provocados pela ambição
política de grupos rivais. Do ponto de vista de Roma, o judaísmo era uma
autonomia insuportável, só tolerada para manter o nacionalismo judaico sob
controle. Entretanto, se os ideais religiosos desencadeassem os sentimentos
nacionalistas, Roma estaria pronta para intervir.
Em 44 d.C., a morte do
rei Agripa colocou todo o país sob a administração direta de Roma, acabando com
a ilusão da independência judaica. A crescente opressão romana, o alinhamento
das autoridades romanas ao lado dos gentios que habitavam a terra, e as
repetidas violações da santidade do Templo criaram uma atmosfera propícia à
revolta. Em abril do ano 66 de nossa era, quando o governador romano confiscou
dezessete talentos do tesouro do Templo, os nacionalistas judeus se rebelaram.
Eles se apoderaram do Templo, interromperam os sacrifícios diários em honra ao
imperador romano e capturaram a fortaleza de Massada.
A Revolta
A Grande Guerra, ou
Primeira Revolta Judaica, foi um evento ímpar naquela região, porque os judeus
foram o único povo no antigo Oriente Próximo a lançar uma ofensiva em larga
escala contra o Império Romano. Ímpar também foi o fato de que nenhum outro
conflito da Antigüidade foi relatado com tantos detalhes por uma testemunha
ocular. Essa testemunha foi um historiador judeu do primeiro século chamado
Yosef ben Mattityahu, mais conhecido como Flávio Josefo. Josefo era um
ex-fariseu e comandante das forças nacionalistas judaicas na Galiléia. O
historiador romano Dio Cássio também forneceu outro importante relato, baseado
em documentos militares oficiais.
Em resposta à insurreição
judaica, concentrada principalmente em Jerusalém, Vespasiano, principal
comandante romano, foi enviado para sufocar o levante com cerca de cinqüenta
mil soldados. O ataque de Vespasiano começou no norte de Israel que, ao
contrário de Jerusalém, ofereceu pouca resistência. Por exemplo, as famílias
judias que ocupavam a fortaleza galiléia de Jotapata, defendida por Josefo,
preferiram cometer suicídio a se renderem ao inimigo. Quanto a Josefo, ele
passou para o lado dos romanos.
Uma exceção foi a cidade
de Gamla, nas Colinas de Golã, que, no outono do ano 67 d.C., tentou conter o
avanço romano em direção a Jerusalém. Os romanos, porém, dizimaram a cidade,
massacrando quatro mil judeus. Para que suas famílias não fossem vítimas da
brutalidade de Roma, cerca de cinco mil judeus tiraram a própria vida, saltando
para a morte do alto dos abismos que cercavam aquela área. A atitude heróica
daquela cidade lhe rendeu o título de "Massada do Norte".
O Cerco de Jerusalém
O Parque Arqueológico Ofel, adjacente ao monte do
Templo, em Jerusalém. Pedras do antigo Templo cobrem a rua herodiana, no
extremo sul da Muralha Ocidental, da Porta dos Mouros até o lado sudoeste do
monte do Templo.
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No verão do ano 70 de
nossa era, a Décima Legião de Vespasiano chegou às portas de Jerusalém e sitiou
a cidade. Por causa da afluência de refugiados vindos de outras cidades
judaicas destruídas pelos romanos, além dos próprios habitantes da Judéia que
fugiam das legiões, a população de Jerusalém tinha, no mínimo, triplicado. A
reputação de Jerusalém como cidade grande e inexpugnável (ela era uma das
maiores cidades do mundo antigo) fazia dela um desafio significativo para os já
enfraquecidos soldados romanos. Entretanto, como centro da autoridade política
e espiritual da revolta judaica, a cidade estava também destinada a ilustrar de
forma exemplar o castigo aplicado por Roma a seus inimigos.
Na época do cerco romano,
duas das mais combativas facções nacionalistas judaicas, os zelotes e os sicários,
tinham assumido o controle do monte do Templo com a ajuda de mercenários
idumeus (descendentes dos edomitas). Os idumeus tinham assassinado
impiedosamente os saduceus e fariseus que constituíam as alas mais moderadas da
sociedade e ocupavam as posições de governo. Desde o início, o objetivo dos
combatentes era aniquilar as forças de ocupação romanas e expulsar os invasores
da terra de Israel. Agora que a guerra havia chegado à Cidade Santa, era vencer
ou morrer.
Para evitar que a
população judaica da cidade fugisse ao invés de lutar até a morte, os zelotes
destruíram os depósitos de alimentos e proclamaram a inviolabilidade divina de
Jerusalém. Como a única maneira de sair da cidade era num caixão, um dos
líderes da seita dos fariseus, o rabino Yochanan ben Zakkai, escapou
escondendo-se num deles e rendendo-se a Vespasiano.
Ao ser levado à presença
do general, o prisioneiro dirigiu-se a ele como imperador e disse que Deus só
permitiria que Sua Cidade Santa fosse conquistada por um grande soberano.
Segundo a tradição, naquele mesmo instante chegou um mensageiro vindo de Roma
para comunicar que o imperador havia morrido e que Vespasiano tinha sido
escolhido como seu sucessor.
Impressionado com a
profecia do rabino, o novo imperador permitiu-lhe proteger os rolos da Torá e
os eruditos que se dedicavam ao seu estudo na cidade de Yavneh. Assim, embora o
Templo tenha sido destruído, a Torá foi preservada; e, embora Jerusalém tenha
sido arrasada, o judaísmo foi poupado.
O Golpe Final
Vespasiano retornou a Roma
para assumir seus deveres como imperador e entregou a seu filho Tito,
comandante da Décima Legião, a tarefa de completar a tomada de Jerusalém.
Apesar da fome que tomava conta da cidade, os judeus celebraram a última Páscoa
em seu Templo e se prepararam para a ofensiva romana.
O ataque começou dias
depois, com um bombardeio de catapultas que durou dois meses, até que,
finalmente, os romanos romperam o muro. Indo de casa em casa, os conquistadores
incendiaram a cidade, massacrando todos os judeus que encontravam pela frente.
Um testemunho arqueológico da ferocidade dos combates é a "Casa
Queimada", localizada dentro do atual Bairro Judeu [da Cidade Antiga]. Ali
estão as ruínas de uma das casas destruídas pelos romanos em 70 d.C., com os
restos de uma mulher que foi morta com uma lança na mão e tombou na soleira da
porta.
Escultura de Vespasiano.
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Embora enfraquecidos pela
fome, os judeus defenderam o monte do Templo contra a invasão dos romanos por
três semanas. Então, no nono dia do mês de Av (agosto), os romanos atingiram o
complexo do Segundo Templo. Como um sinal dos céus, o primeiro Templo havia
sido destruído pelos babilônios nesse mesmo dia, 656 anos antes.
Dio Cássio descreveu a
resistência final dos judeus reunidos em torno do recinto sagrado:
O povo estava posicionado embaixo, no pátio, os anciãos nos degraus, e os
sacerdotes no Santuário propriamente dito. E, embora eles fossem apenas um
punhado de pessoas lutando contra um exército muito superior, só foi possível
derrotá-los depois que uma parte do Templo foi incendiada. Diante disso, eles
buscaram a morte. Alguns se lançavam contra as espadas dos romanos, outros
matavam seus companheiros, outros tiravam a própria vida e outros se jogavam no
meio das chamas. Parecia a todos, e principalmente a eles mesmos, que, longe de
ser uma derrota, o fato de perecerem junto com o Templo representava vitória,
salvação e felicidade.
Detalhe do Arco de Tito, em Roma,
mostrando os tesouros retirados do Templo. |
Depois disso, os romanos
saquearam o Templo e retiraram dele todos os objetos de valor. Mais tarde,
esses tesouros foram exibidos em Roma, durante a parada da vitória, carregados
por milhares de escravos judeus. A imagem desse dia permanece até hoje no Fórum
Romano, gravada num dos altos-relevos do monumento conhecido como o Arco do
Triunfo de Tito.
Uma vez começado o
incêndio do Templo, os romanos cortaram as árvores daquela área para fazer uma
grande fogueira em torno da estrutura. A umidade acumulada nos blocos de pedra
calcária do Templo se expandiu com a alta temperatura e explodiu as paredes, e
todo o edifício sagrado ruiu num só dia.
A Questão do "Por
Quê?"
Josefo comentou que a
demolição do Templo contrariou as ordens específicas de Tito, que queria
preservá-lo. Realmente, a política romana era controlar os templos dos povos
conquistados e depois permitir que eles fossem novamente utilizados para o
culto de seus deuses, como um ato de clemência em troca da completa submissão.
Alguns eruditos acreditam que os soldados romanos, meio enlouquecidos pela
duração da resistência judaica e pelo desejo de se apoderarem dos tesouros do
Templo, incendiaram tudo deliberadamente.
Algumas fontes judaicas
afirmam que o fogo começou acidentalmente quando a tocha de um soldado atingiu
as cortinas do santuário. Entretanto, quando minha turma na Universidade
Hebraica de Jerusalém debateu essas opções, nenhuma delas nos pareceu
satisfatória. Então procuramos nosso professor, Isaías Gafni, um judeu
ortodoxo, e perguntamos qual era a sua opinião. Depois de uma pausa e de um
sorriso, ele nos disse: "Talvez Jesus tivesse razão!" Quer sua
resposta tenha sido apenas uma tática de retórica rabínica ou um lampejo
inconsciente de inspiração, o fato é que ela acabou com a discussão.
Para os rabinos, o motivo
da destruição do Templo foi sinat
chinam, "ódio sem
sentido" entre os judeus. Segundo essa teoria, a violenta rivalidade entre
as seitas judaicas explodiu numa espécie de guerra civil, dividindo o povo
judeu, enfurecendo a Deus e expondo a nação ao juízo divino e à fúria dos
romanos.
Contudo, se levarmos em
conta a suposição do professor Gafni, Jesus esclareceu qual foi a principal
causa da destruição de Jerusalém:
"Pois sobre ti virão
dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras e, por todos os lados,
te apertarão o cerco; e te arrasarão e aos teus filhos dentro de ti; não
deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste a oportunidade da tua
visitação" (Lc 19.43-44; cf. Mt 23.37-38; At 3.13-15).
Parte da "Casa Queimada" descoberta em
escavações no Bairro Judeu em 1970. A casa foi completamente queimada na
conflagração que arrasou a Cidade Alta de Jerusalém deixando-a em cinzas no
dia 30 de agosto do ano 70 d.C.
|
Embora outros fatores
internos estivessem em ação, a rejeição de Jesus como o Messias prometido, por
parte da nação judaica, foi o ato culminante que desencadeou o julgamento
divino. Apesar desse juízo ter acabado com a instituição do Templo e forçado a
reformulação do judaísmo, ele não pôs fim ao povo judeu nem às promessas
pactuais e incondicionais de restauração nacional e bênçãos futuras através do
Messias. Jesus incluiu essa esperança até mesmo em Seu discurso profético
contra Jerusalém e o Templo: "Eis
que a vossa casa vos ficará deserta. Declaro-vos, pois, que, desde agora, já
não me vereis, até que venhais a dizer: Bendito o que vem em nome do
Senhor!" (Mt 23.38-39).
O apóstolo Paulo,
baseando-se nas profecias de Isaías, ensinou que esse dia de arrependimento
nacional dos judeus acontecerá na volta de Jesus a Jerusalém: "E, assim, todo o Israel será
salvo, como está escrito: Virá de Sião o Libertador e ele apartará de Jacó as
impiedades. Esta é a minha aliança com eles, quando eu tirar os seus
pecados" (Rm 11.26-27).
"E, assim, todo o Israel será salvo, como está
escrito: Virá de Sião o Libertador e ele apartará de Jacó as impiedades. Esta
é a minha aliança com eles, quando eu tirar os seus pecados" (Rm
11.26-27). Na foto: judeus junto ao
Muro das Lamentações. |
A chamada ao
arrependimento em relação a Jesus, reconhecendo-O como o Messias prometido, foi
feita por muitos judeus piedosos antes da destruição do Templo e continua a ser
feita atualmente. O apóstolo Pedro, que fez sua exortação ainda nos dias do
Segundo Templo, nos recorda que a esperança da restauração de Israel está em seu
arrependimento: "Arrependei-vos,
pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados, a fim de que, da
presença do Senhor, venham tempos de refrigério, e que envie ele o Cristo, que
já vos foi designado, Jesus, ao qual é necessário que o céu receba até aos
tempos da restauração de todas as coisas" (At 3.19-21).
Sempre que um judeu
responde a esse chamado, ele encontra sua libertação. Quando a nação judaica
atender finalmente a essa exortação, o desastre da Grande Guerra será
transformado na vitória da Grande Redenção
.notas
Randall Price, presidente do World
of the Bible Ministries, Inc., é
arqueólogo e autor de vários livros sobre Jerusalém e o Templo Judaico.
fonte biblicaaqueologia.blogspot.com
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PAZ DO SENHOR
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