O termo “Pai” era atribuído pelos fiéis aos mestres e bispos da Igreja
Primitiva. Historicamente falando, surgiu devido à reverência e amor que muitos
cristãos tinham pelos seus líderes religiosos dos primeiros séculos. Eram assim
chamados carinhosamente devido ao amor e zelo que tinham pela igreja. Mais
tarde, o termo é atribuído particularmente aos bispos do concílio de Nicéia, e
posteriormente Gregório VII reivindicou com exclusividade o termo “papa”, ou
seja, "pai dos pais”.
Com a morte do último apóstolo, João em Éfeso, termina a era apostólica,
porém Deus já havia capacitado homens para cuidar de sua Igreja, e começou uma
nova era para o cristianismo. Assim, a obra que os apóstolos receberam do
Senhor Jesus e a desenvolveram tão arduamente acha-se agora nas mãos de novos
líderes que tinham a incumbência de desenvolver a vida litúrgica da Igreja como
fizeram os apóstolos.
O período que comumente é chamado de pós-apostólico é de intenso
desenvolvimento do pensamento cristão. Seu trabalho e influência garantiram a
unidade da Igreja. Para um assunto tão importante, a Igreja convocou grandes
assembléias conciliares, os chamados Concílios Ecumênicos, dos quais
participavam todos os bispos, que no final promulgavam suas declarações de fé.
Para uma melhor compreensão, podemos dividir os Pais da Igreja em quatro
grandes grupos, a saber: Apostólicos, Apologistas, Polemistas e Pós-Nicenos.
Todavia, essa divisão não é absoluta, pois podemos enquadrar alguns deles em
mais de um desses grupos devido à vasta literatura que produziram para a
edificação e defesa do cristianismo, como é o caso de Tertuliano, considerado o
pai da teologia latina. Sendo assim, temos:
PAIS APOSTÓLICOS
Foram os mais antigos escritores cristãos fora do Novo Testamento, pertencendo
à chamada “era subapostólica”. Eles tiveram relação mais ou menos direta com os
apóstolos e escreveram para a edificação da Igreja, geralmente entre o primeiro
e segundo século. Os mais importantes foram:
CLEMENTE DE ROMA (30-100 d.C.)
Clemente era um cristão que gozava de grande autoridade entre seus
contemporâneos. Orígenes e Eusébio de Cesáreia identificam-no como o
colaborador de Paulo mencionado em Filipenses: “E peço também a ti, meu
verdadeiro companheiro, que ajudes essas mulheres que trabalharam comigo no
evangelho, e com Clemente, e com os outros cooperadores, cujos nomes estão no
livro da vida” (Filipenses 4.3). Irineu de Lião escreveu que Clemente teria
sido o terceiro sucessor do apóstolo Pedro no pastorado da Igreja em Roma.
Segundo Tertuliano, ele foi consagrado pelas mãos do apóstolo Pedro. Escreveu
uma Epístola chamada de 1º Clemente, escrita de Roma por volta de 95 d.C., para
a igreja em Corinto. A obra Atos dos Mártires, do século IV ou V d.C., afirma
que Clemente foi exilado para a península de Queronese, na área do mar Negro,
foi atirado ao mar com uma âncora amarrada ao seu pescoço.
INÁCIO DE ANTIOQUIA DA SÍRIA (35-108 d.C.)
Conforme se encontra na História Eclesiástica, de Eusébio, Inácio teria
sido o segundo bispo de Antioquia: “Mas, depois que Evódio fora estabelecido o
primeiro sobre os antioquenos, Inácio o segundo, reinava no tempo do qual
falamos”.
Foi martirizado em Roma, durante o reinado de Trajano (97-117 d.C.).
Inácio quando seguiu para Roma estava disposto a ser martirizado, pois durante
a viagem escreveu cartas às igrejas manifestando o desejo de não perder a honra
de morrer por seu Senhor. Foi lançado às feras no Anfiteatro romano no ano 108.
Tudo quanto sabemos sobre sua vida é através de suas sete cartas escritas
no caminho rumo ao martírio em Roma; Carta aos Efésios, Carta aos Romanos,
Filadélfia, Esmirna, Trálios, Magnésia e Policarpo. Inácio é o primeiro
escritor a apresentar claramente o padrão de ministério: um bispo numa igreja
com seus presbíteros e diáconos. Opôs-se às heresias gnósticas. Sua preocupação
principal era com a unidade da Igreja.
POLICARPO (69-155 d.C.)
Foi discípulo do apóstolo João, provavelmente nasceu em 70 d.C. Eusébio
declara que não somente foi instruído pelos apóstolos e conviveu com muitos que
haviam visto o Senhor, mas também foi instituído bispo da Ásia pelos apóstolos,
na Igreja de Esmirna. Aparentemente Policarpo conhecia alguns personagens
ilustres de sua época, como Inácio, Irineu, Aniceto de Roma e Marcião.
Policarpo resistiu a doutrina de Marcião e chamou-lhe de “primogênito de
Satanás”. De acordo com Irineu, Policarpo escreveu diversas cartas à comunidade
e a bispos em particular, das quais somente a carta aos Filipenses foi
preservada.
Em um dos seus escritos que trazem o seu nome é nos dada à narrativa de
sua morte. Devido a sua idade, quiseram fazê-lo negar o nome de Jesus e assim
escapar com vida, ao que ele respondeu: “Eu tenho servido a Cristo por 86 anos
e Ele nunca me fez nada de mal. Como posso blasfemar contra meu Rei que me
salvou?”. Quando o colocaram na fogueira, dizem que o fogo não o queimou, e
então seus inimigos o apunhalaram até a morte e depois o queimaram.
PAPIAS DE HIERÁPOLIS (70-140 d.C.)
Bispo de Hierápolis, de quem somente sabemos alguma coisa através de
escritos de Eusébio e Irineu. Ele era um homem curioso, que tinha o habito de
inquirir sobre as origens do cristianismo. Foi Papias quem iniciou a tradição
que diz que Marcos era interprete de Pedro: “Marcos, que foi interprete de
Pedro, pôs por escrito, ainda que não com ordem, o quanto recordava que o
Senhor havia feito”.
Segundo Irineu de Lião, Papias teria sido discípulo do apóstolo João,
conforme Eusébio de Cesáreia, Papias fora discípulo de “outro João, o
“presbítero”, e não o apóstolo João.
Escreveu uma coleção de relatos sobre ditos e feitos do Senhor e de seus
discípulos, da qual restam somente pequenos fragmentos.
PAIS APOLOGISTAS
Foram aqueles que empregaram todas as suas habilidades literárias em
defesa do cristianismo perante a perseguição do Estado. Geralmente este grupo
se situa no segundo século, e os mais proeminentes entre eles foram:
TERTULIANO (155-220 d.C.)
Nasceu em Cartago, um dos principais centros culturais do Império Romano.
Destinado pela família ao estudo das leis, recebeu esmerada educação. Aos vinte
anos seguiu para Roma, onde ampliou sua formação. Regressou a Cartago no final
do século II e, depois de se converter ao cristianismo, dedicou-se ao estudo
das Escrituras, da literatura cristã e profana e dos tratados gnósticos.
Iniciou então uma produtiva atividade literária voltada para a consolidação da
Igreja no norte da África. Teólogo, foi o principal apologista da igreja
ocidental e o primeiro teólogo cristão a escrever em latim. Formado em direito,
ensinou oratória e advogou em Roma, onde se converteu ao cristianismo.
Possivelmente as suas maiores contribuições foram suas discussões sobre a
Trindade e a Encarnação do Logos. A sua principal obra escrita em defesa do
cristianismo foi Apologética.
JUSTINO MARTIR (100-166 d.C.)
Filho de pais pagãos teria nascido perto da cidade de Siquém, onde passou
boa parte de sua juventude numa busca filosófica atrás da verdade. Ele foi um
filósofo platônico. Seus estudos profundos do platonismo, pitagorismo, do
estoicismo e do aristetolismo convenceram-no de que nem toda a verdade está
contida na filosofia e que ele precisava continuar inquirindo sobre a verdade.
Vários livros são atribuídos a Justino, porém somente três são aceitos
como genuínos. São os denominados de Primeira Apologia, Segunda Apologia e o
Diálogo com Trifo, o judeu. Sua Primeira Apologia é dirigida ao imperador
Antonino Pio, que reinou de 138-161 d.C., aos seus filhos Lucius e Marco
Aurélio, a todo o senado romano e “a todos os romanos”. A Segunda Apologia é
dirigida ao senado romano, embora já tivesse sido alcançado pela Primeira. Os
dois foram escritos para contestar a perseguição. O Diálogo com Trifo consta de
uma conversa de dois dias entre Justino e um douto judeu contemporâneo dele.
Foi um dos homens mais competentes do seu tempo e um dos principais
defensores da fé Cristã. Seus livros que ainda existem, oferecem informações
valiosas sobre a vida da Igreja nos meados do segundo século. Foi martirizado
em Roma, no ano de 166
PAIS POLEMISTAS
Diferentemente dos apologistas do segundo século, que procuraram fazer uma
explanação e uma justificação racional do cristianismo para as autoridades, os
polemistas empenharam-se em responder os desafios dos falsos ensinos heréticos,
condenando veementemente esses ensinos e seus mestres.
Os pais desse grupo não mediram esforços para defender a fé cristã das
falsas doutrinas surgidas fora e dentro da Igreja. Apesar de a maioria ter
vivido no Oriente, os grandes polemistas vieram do Ocidente:
IRINEU (130-202 d.C.)
Oriundo da Ásia Menor, em sua juventude foi discípulo de Policarpo, de
acordo com Eusébio de Cesáreia. Irineu escreveu a Florino, um ex-condiscípulo
de Policarpo, que apostatara tornando-se valentiniano: “Pois os estudos de
nossa juventude cresceram com nossa mente e se uniram a ele com tamanha
firmeza, que também posso dizer até o lugar em que o bendito Policarpo
costumava se sentar e discursar; e também suas entradas, suas saídas, o caráter
de sua vida e a forma de seu corpo, e suas conversas com as pessoas, e seu
relacionamento familiar com João, conforme costumava contar, bem como sua
familiaridade com os que haviam visto o Senhor. Também a respeito de seus
milagres, sua doutrina, tudo isso era contado por Policarpo, de acordo com as
Sagradas Escrituras, conforme havia recebido das testemunhas oculares da
doutrina da salvação”.
A maior parte de sua obra desenvolveu-se no campo da literatura polêmica
contra o ensino gnóstico, que acreditava na existência de um mundo distinto de
Deus. Sua primeira obra, Adversus Haereses, título em latim que significa
“Contra Heresias”, escrita entre 182 e 188 d.C., salienta-se por sua
habilidade, moderação e pureza na apresentação do cristianismo, condenando os
ensinos de Marcião.
ORÍGENES (185-254 d.C.)
Orígenes foi o maior dos intérpretes alegóricos e o mais prolífico da
antiguidade cristã. A maior parte das informações sobre a vida de Orígenes pode
ser localizada no sexto livro da História Eclesiástica, de Eusébio de Cesáreia.
Nasceu em Alexandria, no Egito, onde foi aluno de Clemente, o que o faria
sucessor deste anos mais tarde. Ficou à frente da escola catequética por 28
anos, levando uma vida extremamente ascética e piedosa. Devido ao seu zelo,
interpretou literalmente o texto de Mateus 19.12, que diz: “Porque há eunucos
que assim nasceram do ventre da mãe; há eunucos que foram castrados pelos
homens; e há eunucos que se castraram a si mesmos por causa do Reino dos céus.
Quem pode receber que o receba”, e mutilou-se a si mesmo.
Seu pai Leônidas morreu martirizado em 202, o que fez com que ele sentisse
o mesmo sentimento, a ponto de dizer ao pai que se encontrava preso: “Não vás
mudar de idéia por causa de nós”. Em 212 esteve em Roma, Grécia e Palestina. A
mãe do imperador Alexandre Severo, Júlia Maméia, chamou-o a Antioquia para
ouvir suas lições. Morreu em Cesáreia durante a perseguição do imperador Décio.
A produção literária de Orígenes foi enorme. Segundo estimativa, ele foi o
autor de seis mil pergaminhos. Uma vez que seus conhecimentos bíblicos eram
enormes e estava consciente de que o texto das Escrituras continha ligeiras
variantes, compôs a “Hexapla”, uma obra monumental de erudição bíblica que não
foi conservada na íntegra.
CIPRIANO (200-258 d.C.)
Thascius Cecilius Cyprianus era de família nobre e influente de Cartago.
Converteu-se ao cristianismo em 246 d.C., sendo posteriormente eleito bispo em
sua cidade natal, por volta de 249 d.C. Exerceu um ministério pastoral
influente produzindo vários escritos antes de ser perseguido e decapitado nos
dias do imperador Valeriano.
As principais obras de Cipriano são: Tratado Sobre a Unidade da Igreja e
Dos Caídos, escrito em 251 d.C., enviadas aos confessores romanos da fé. De
habitu virginum (249 d.C.), De mortalitate (252 d.C.), De opere et eleemosnynis
(252 d.C.) e uma coleção de cartas. Algumas de suas obras são revisões dos
escritos de Tertuliano, a quem Cipriano chamava de mestre.
AGOSTINHO DE HIPONA (354-430)
O Protestantismo e o Catolicismo Romano tributam honra à contribuição que
Agostinho deu à causa do cristianismo. Polemista capaz, pregador talentoso,
administrador episcopal competente, teólogo notável, ele criou uma filosofia
cristã da história que em sua essência, continua válida até hoje. Vivendo num tempo
em que a velha civilização clássica parecia sucumbir diante dos bárbaros,
Agostinho se posicionou entre dois mundos, o mundo clássico e o novo mundo
medieval. Para ele, os homens deveriam olhar adiante para a “Cidade de Deus”,
uma civilização espiritual, uma vez que a velha civilização clássica estava
passando.
Agostinho nasceu em 354, na casa de um oficial romano na cidade de
Tagasta, ao norte da África. Sua mãe, Mônica, dedicou a vida à sua formação e
conversão à fé cristã. Seus primeiros anos de estudos foram feitos na escola
local, onde aprendeu latim à força de muitos açoites, e odiou tanto o grego que
jamais o aprenderia fluentemente. Foi enviado para uma escola em Madaura e daí
para Cartago, para estudar retórica. Livre dos limites familiares, Agostinho
fez o mesmo que a maioria dos estudantes de então, e se entregou às paixões da
união ilegítima com uma concubina. Seu filho, Adeodato, nasceu dessa união, em
372. Em 373, na busca pela verdade ele aceitou o ensino maniqueísta; no
entanto, por considerá-lo insuficiente, voltou à filosofia com a leitura de
Hortênsio, de Cícero, e dos ensinos do neoplatonismo. Ensinou retórica em sua
cidade natal e em Cartago, até ir para Milão, por volta de 384.
Em 386, aconteceu sua crise de conversão. Um belo dia, meditando num
jardim sobre a sua situação espiritual, ouviu uma voz próxima à porta que
dizia: “Tome e leia”. Agostinho abriu sua Bíblia em Romanos 13.13-14:
"Andemos honestamente, como de dia; não em glutonarias, nem em
bebedeiras, nem em desonestidades, nem em dissoluções, nem em contendas e
inveja. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e não tenhais cuidado da carne
em suas concupiscências".
Essa leitura trouxe-lhe a luz que sua alma não havia conseguido encontrar
nem no maniqueísmo nem no neoplatonismo. Separou-se de sua concubina e
abandonou sua profissão de retórica. Sua mãe que tanto orara por sua conversão,
morreu logo depois do seu batismo. De volta a Cartago, foi ordenado sacerdote
em 391. Cinco anos depois foi consagrado bispo de Hipona. Daí até sua morte, em
430, dedicou sua vida à administração episcopal, estudando e escrevendo. Ele é
apontado como o maior dos pais da Igreja. Deixou mais de 100 livros, 500
sermões e 200 cartas.
Talvez a obra mais conhecida de sua lavra sejam as Confissões, uma das
maiores obras autobiográficas de todos os tempos. Nas páginas dessa obra,
Agostinho abre a sua alma. Os livros I a VII descrevem sua vida antes da
conversão; os dois livros seguintes narram os acontecimentos posteriores à sua
conversão, inclusive a morte de sua mãe e sua volta ao norte da África; os
livros XI a XIII são comentários aos primeiros capítulos de Gênesis, em que
Agostinho recorre à alegoria com frequência.
Os cristãos de todos os tempos têm sido abençoados com a leitura dessa
obra escrita por Agostinho para louvor de Deus, cuja graça alcançou um pecador
como ele. O livro traz no primeiro parágrafo a citadíssima frase: “Tu nos
fizestes para ti e nosso coração não descansará enquanto não repousar em ti”. A
consciência de seu pecado e a força do mal, evidenciado por sua vida imoral
apaixonada, levaram-no a clamar: “Dá-me a castidade e a continência, mas não
ainda”. Essa necessidade só foi preenchida por sua experiência da graça de
Deus.
Agostinho escreveu ainda tratados teológicos dos quais De Trinitate, sua
obra sobre a Trindade, é o mais importante. Os primeiros sete livros da obra
são dedicados a exposição bíblica dessa doutrina. Seu breve trabalho Enchiridion
ad Laurentium resume sua ideias teológicas e de certo modo completa outra de
suas obras, Retractationes, dando ao leitor uma imagem mais nítida e resumida
de sua teologia. Agostinho escreveu também muitas obras polêmicas para defender
a fé dos falsos ensinos e das heresias dos maniqueístas, dos donatistas e,
principalmente dos pelagianos. Sua De Haeresibus é uma história das heresias.
O bispo de Hipona escreveu obras práticas e pastorais, além de muitas
cartas das quais ainda restam umas 240. Essas obras e cartas tratam de muitos
problemas práticos que um administrador eclesiástico enfrenta no decorrer dos
anos de ministério.
Sua grande obra apologética e sobre a qual reside sua maior fama, é o
tratado De Civitate Dei, popularmente conhecida como A Cidade de Deus
(413-426). O próprio Agostinho considerava ser essa sua grande obra.
A formulação de uma interpretação cristã da história deve ser considerada
uma das contribuições permanentes deixadas por esse grande erudito cristão. Nem
historiadores gregos nem romanos foram capazes de compreender tão
universalmente a história do homem. Agostinho exalta o poder espiritual sobre o
temporal, ao afirmar a soberania do Deus que se tornou o Criador da história no
tempo. Deus é Senhor da história e nada o limita como ensinara o filósofo
Hegel. Tudo o que vem a ser é uma consequência de sua vontade e ação. Antes
mesmo da criação, Deus tinha um plano em vista para sua criação.
Mas Agostinho também contribuiu com alguns erros para o pensamento
cristão. Contribuiu para a formulação da doutrina do purgatório com todas as
suas consequências nocivas; enfatizou tanto o valor dos dois sacramentos que a
doutrina da regeneração batismal e da graça sacramental se tornaram
consequências lógicas de sua posições; sua interpretação do milênio, que ele
via como o período entre a Encarnação e a segunda vinda de Cristo em que a
Igreja venceria o mundo.
Essa ênfase de Agostinho não deve nos impedir de ver o significado de sua
obra para a Igreja Cristã. Os Reformadores encontraram em Agostinho um aliado
inestimável na sua crença em que o homem escravizado pelo pecado, necessita da
salvação através da graça de Deus pela fé somente. No período entre Paulo e
Lutero, a Igreja não teve mais ninguém da estatura moral e espiritual de
Agostinho.
PAIS PÓS-NICENOS
Entre os Concílios de Nicéia (325) e de Calcedônia (451), vários dos mais
capazes Pais da Igreja Cristã desempenharam seu ministério. Eles procuraram
estudar a Bíblia em bases científicas a fim de desenvolverem o seu significado
teológico. Sem dúvidas, Agostinho foi o maior deles.
Eles seguiram a escola de Antioquia ou Síria de interpretação, destacando
o estudo histórico-gramatical da Bíblia com intenção de descobrir o significado
que o escritor sagrado tinha em mente para aqueles a quem escreveu. Evitaram a
tendência alegorizante praticada pelos seguidores da escola alexandrina, que
seguiam o exemplo de Orígenes.
JOÃO CRISÓSTOMO (345-407)
João, chamado Crisóstomo devido à sua eloquência, logo depois de sua
morte, mereceu literalmente o nome de “boca-de-ouro”. Nasceu por volta de 345
numa família rica, da aristocracia de Antioquia. Sua mãe apesar de ter
enviuvado aos 20 anos, recusou-se a casar de novo para poder se dedicar
totalmente à educação do filho. Crisóstomo foi aluno do sofista Libânio, amigo
do Imperador Juliano. Libânio instruiu-o bem nos clássicos gregos e na
retórica, o que lhe deu as bases para sua excelente oratória.
Por algum tempo exerceu a advocacia, mas após seu batismo em 386,
tornou-se monge. Com a morte da mãe em 374, passou a viver uma vida ascética e
bem rigorosa até 380. Nessa época viveu numa caverna de uma montanha perto de
Antioquia. A saúde debilitada o obrigou a abandonar o regime rigoroso. Ordenado
em 386, pregou em Antioquia alguns de seus melhores sermões até o ano de 398.
Nesse ano foi escolhido como patriarca de Constantinopla, posição que manteve
até ser banido em 404 pela Imperatriz Eudóxia, denunciada por ele por usar
roupas extravagantes e por colocar uma estátua de prata de si mesma próxima a
Santa Sofia, onde ele pregava. Morreu no exílio em 407.
Talvez alguns anos de estudo com Diodoro de Tarso tenham algo a ver com
sua capacidade como orador. Cerca de 640 de suas homilias sobreviveram, e basta
uma leitura rápida para se ter uma idéia de seu talento nessa área. A maioria
de suas homilias ou sermões se constituem em exposições das epístolas de Paulo.
Por não conhecer o hebraico, não fez uma investigação crítica dos textos do
Antigo Testamento. Mas destacou a importância do contexto e procurou descobrir
o sentido literal dado pelo autor e fazer uma aplicação prática desse sentido
aos problemas das pessoas de sua época. Essas aplicações morais práticas do
evangelho eram marcadas por grande integridade moral. Para ele não deveria
haver divórcio entre moral e religião; a cruz e a ética devem caminhar juntas.
Não é por acaso que ele foi e continua sendo um dos maiores oradores sacros que
a igreja Oriental já teve.
TEODORO (350-428)
Outro notável pai da igreja da Mopsuéstia. Ele estudou a Bíblia com
Diodoro de Tarso. Essa ótima instrução foi possível por ter nascido de família
rica. Ordenado presbítero em Antioquia em 338, tornou-se bispo da Mopsuéstia,
na Cilícia em torno de 392. Teodoro foi chamado apropriadamente de "o
príncipe dos exegetas antigos". Ele se opôs ao sistema alegórico de
interpretação e propôs uma compreensão que levasse em conta a gramática e a
formação histórica do texto, a fim de descobrir o sentido que o autor quis dar.
Deu atenção especial ao contexto imediato e remoto do texto. Esse método fez
dele um comentarista e teólogo dos mais competentes. Teodoro escreveu
comentários sobre livros da Bíblia como as cartas aos colossenses e aos
tessalonicenses. Tanto ele como Crisóstomo enriqueceram notavelmente a
interpretação da Bíblia no seu tempo. A obra de ambos contrastava com as
forçadas interpretações da Bíblia geradas pelo uso do método alegórico de
interpretação.
EUSÉBIO DE CESARÉIA (260-340)
Um dos pais da Igreja mais amplamente estudados é Eusébio de Cesaréia,
merecedor do título de pai da História da Igreja quanto Heródoto o é do título
de pai da História. Depois de receber uma boa instrução por parte de Panfílio
em Cesaréia, ajudou o amigo a organizar sua biblioteca nessa cidade. Eusébio
era estudante interessado e lia tudo o que pudesse ajudar em suas pesquisas.
Ele se serviu tanto da literatura profana quando da sacra.
A personalidade de Eusébio era adequada aos seus alvos de erudição. Tinha
um espírito refinado e cordato e detestava querelas suscitadas pelas heresia
ariana. Tomou um lugar de honra ao lado de Constantino no Concílio de Nicéia e,
como ele, preferiu uma solução de reconciliação entre os partidos de Atanásio e
Ário. Foi o Credo de Cesaréia, escrito por Eusébio de Cesaréia, que o Concílio
de Nicéia modificou e aceitou.
Sua maior obra literária é a História Eclesiástica, um panorama da
história da Igreja dos tempos apostólicos até 324. Seu propósito era fazer um
relato das dificuldades passadas da Igreja, ao fim desse longo período de luta
e começo de uma história de prosperidade. A obra continua sendo útil até hoje,
uma vez que Eusébio teve acesso à excelente biblioteca de Cesaréia e dos
arquivos imperiais.
Eusébio é até hoje nossa melhor fonte sobre a história da Igreja durante
os três primeiros século de sua existência, embora eruditos lastimem que não
tenha feito notas de rodapé mais precisas sobre suas fontes de informação, a
exemplo do que fazem os historiadores contemporâneos. Apesar de suas monótonas
divagações e de sue estilo inconstante, a obra tem sido de inestimável valor
para a Igreja ao longo dos séculos.
JERÔNIMO (331-420)
Jerônimo, natural de Veneza, foi batizado em 360 e durante vários anos
dedicou-se aos estudos, viajando por Roma e pelas cidades da Gália. Na década
seguinte visitou Antioquia e adotou a vida monástica, ocasião em que aprendeu o
hebraico. Em 382, tornou-se secretário de Dâmaso, bispo de Roma, que lhe
sugeriu a possibilidade de fazer uma nova tradução da Bíblia. Em 386, Jerônimo
foi para a Palestina e lá, graças à generosidade de Paula, uma rica senhora
romana a quem tinha ensinado hebraico, viveu num retiro monástico em Belém por
quase 35 anos.
A maior obra de Jerônimo foi uma tradução latina da Bíblia conhecida como
Vulgata. Antes de 391, ele tinha completado a revisão do Novo Testamento latino
cuidadosamente cotejado com o grego. A versão da Bíblia feita por Jerônimo tem
sido amplamente usada pela Igreja Ocidental e foi, até recentemente, a única
Bíblia oficial da Igreja Católica Romana desde o Concílio de Trento.
Jerônimo foi também um exímio comentarista, tendo escrito muitos
comentários que são usados até hoje. Sua grande dedicação e seu enorme
conhecimento dos clássicos ajudaram-no na interpretação das Escrituras, embora
nos últimos anos de sua vida desaprovasse o saber clássico.
AMBRÓSIO (339-397)
Ambrósio demonstrou grande capacidade nos campos da administração
eclesiástica, pregação e teologia. Seu pai ocupara o alto cargo de prefeito da
cidade da Gália, e sua família procedente dos altos círculos imperiais de Roma,
proporcionou-lhe uma formação na área jurídica, pretendendo que ele se voltasse
para a carreira política. Alcançou logo o cargo de governador imperial da área
em torno da cidade de Milão. Com a morte do bispo de Milão em 374, o povo pediu
unanimemente a sua ascensão ao cargo. Crendo ser este um chamado de Deus, ele
aceitou o cargo, distribuiu seus bens aos pobres, tornou-se bispo e começou a
estudar intensamente a Bíblia e teologia.
Ambrósio provou ser um administrador ousado e capaz na condução dos
negócios da Igreja. Levantou-se contra as poderosas facções arianas e não
hesitou em se opor ao imperador Teodósio. Em 390 ou 391, Teodósio reuniu o povo
de Tessalônica, cujo governador fora assassinado, numa praça da cidade e
ordenou o massacre deles. Quando ele veio a igreja tomar a ceia, Ambrósio
recusou-se a admiti-lo na comunhão até que ele humilde e publicamente, se
arrependesse desse ato.
Embora suas interpretações e exposições práticas da Bíblia tenham sido
prejudicadas pelo uso do método alegórico, Ambrósio foi um talentoso pregador.
Sua pregação na catedral de Milão foi um instrumento para levar Agostinho de
Hipona ao conhecimento do cristianismo, resultando mais tarde na conversão
deste. Possivelmente foi ele que introduziu o cântico de hinos e a salmódia
antifonal na Igreja Ocidental. Ambrósio foi também um teólogo de grande
talento, embora só tenha estudado teologia depois de ordenado bsipo.
Fontes:
Modulo 4 de Teologia da FTB - Editora Betesda
História da Igreja Cristã - Editora Vida
O Cristianismo Através dos Séculos - Editora Vida Nova
História Eclesiástica - Eusébio de Cesaréia - Editora Paulus
Santo Agostinho - Editora Record
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