3. O PECADO DA MENTIRA.
MENTIRA (MENTIROSO)
1. Definições Básicas
Temos preparado um longo artigo sobre os Vícios, onde é comentado o vício da mentira. Mentir é fazer declarações propositalmente falsas, meias verdades que envolvem falsas impressões. Um exagero proposital é um tipo de mentira, como também o é uma declaração parcial proposital. Até mesmo as verdades proferidas com o intuito de enganar, naquilo em que visam iludir, não passam de mentiras. Entretanto, as histórias de ficção, escritas ou filmadas, embora não correspondam à realidade, não são mentiras, visto que não se propõem a narrar fatos, mas tão-somente simbolizam fatos e idéias.
2. Palavras Bíblicas Envolvidas
No hebraico encontramos kazab, palavra usada por vinte e nove vezes, conforme se vê, por exemplo em Juí. 16:10,13; Sal. 40:4; Pro. 6:19; 14:5,25; 19:5,9; Isa. 28:15,17; Eze. 13:8,9,19; Dan. 11:27; Osé. 12:1; Amós 2:4; Sof. 3:13. Também encontramos sheqer, que aparece no Antigo Testamento por cerca de quarenta e três vezes com o sentido de «falsidade», «mentira», («mentiroso», etc., segundo se vê, para exemplificar, em Jó 13:4; Sal. 63:11; 119:69; Isa. 9:15; 59:3; Jer. 9:3,5; 14:14; 29:21,31; Eze. 13:22; Miq. 6:12; Hab. 2:18; Zac. 10:2 e 13:3. Ambas as palavras podem indicar «engano», «mentira». Outras palavras hebraicas bem menos usadas sãoakzab (Miq. 1:14), bad, «artifício» (Jó 11:3; Isa. 16:6; Jer. 48:30); kachash, «fingimento» (Osé. 7:3; 10:13; 11:12; Naum 3:1); dabar, «palavra de falsidade» (Pro. 29:12).
No grego encontramospseüdos, «mentira» «falsidade», palavra empregada no Novo Testamento por sete vezes: João 8:44; Rom. 1:25; II Tes. 2:11; I João 2:21,27; Apo. 21:27; 22:15. E também pseúsma, «falsidade», em Rom. 3:7.
3. Usos Bíblicos
Os homens mentem, principalmente, a fim de enganar. Essa palavra é usada nas Escrituras para indicar as declarações falsas dos homens acerca de Deus e das realidades espirituais (Jer. 14:14; Eze. 13:9; Rom. 1:25). A verdade divina é reduzida a uma mentira, pelas idéias e declarações dos homens. As mentiras dos homens pervertem, portanto, a verdade dita por Deus. Toda mentira cria uma falsa certeza (Isa. 28:15). Os resultados da mentira são o erro e a ilusão (Jer. 23:32). Os padrões morais são solapados pelas mentiras (Rom. 1:26 ss).
Deus não pode mentir, mas precisa julgar (I Sam. 15:29; Tito 1:2). Por isso, a mentira nunca é atribuída a Deus, mas é atribuída aos homens, como quando prestam falso testemunho (Pro. 6:19). O ato de mentir era proibido pela lei mosaica (Exo. 20:16; Lev. 19:11). Os crentes deveriam reconhecer que o ato de mentir é próprio da vida velha, na incredulidade, devendo ser rejeitado pelo crente como uma roupa indesejável, segundo se vê em Col. 3:9; «Não mintais uns aos outros, uma vez que vos despistes do velho homem com os seus feitos». O trecho de João 8:44 apresenta Satanás como o pai da mentira. Os trechos de Apo. 21:27 e 22:15 mostram que os mentirosos habituais (que o fazem devido à sua natureza corrompida e não regenerada), ficam impedidos da salvação e do lar celestial.
4. Discussões Filosóficas
Será errada a mentira, em todos os casos? Alguns filósofos asseveram que há ocasiões em que mentir é melhor do que dizer a verdade. Um meu professor de filosofia deu um exemplo em classe, baseado na vida real, ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial. Ele falou sobre um sacerdote católico romano que se viu envolvido no movimento de resistência subterrânea de um paí» debaixo do poder militar dos nazistas. Vidas dependiam dele. Quando foi apanhado, ele confessou, e não mentiu, dizendo aos alemães que, de fato, fazia parte daquele movimento. O resultado foi desastroso. Também poderíamos pensar no caso dos pacientes terminais. Tais pacientes devem ficar sabendo da verdade, ou, pelo menos em alguns casos, é melhor enganar o doente? Há pessoas que simplesmente querem saber seu estado, e a essas deveríamos dizer a verdade. Mas há outras que, segundo os médicos e seus familiares julgam, sentir-se-iam menos premidas se a verdade não lhes fosse revelada, pois ass:m enfrentariam a morte mais tranqüilamente. Isso posto, em tais casos, seria melhor mentir a um paciente terminal. Se esses casos são exemplos de exceções válidas à regra contra a mentira, então podemos afirmar que, algumas vezes, a lei do amor é melhor servida por um engano (cují intenção é aliviar o sofrimento), do que se dizendo a verdade chocante e brutal.
CHAMPLIN, Russell Norman, Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia. Vol. 4. Editora Hagnos. pag. 228-229.
«...Não mintais...»
«Sem a honestidade, o fundo cai de todas as outras virtudes. O amor é aclamado como qualidade suprema da vida cristã; mas Paulo, ao dizer isso sobre a fé, a esperança e o amor, afirma que a maior delas é o amor, o qual deve ser sem hipocrisia (ver Rom. 12:9). O amor sem genuinidade é pior que não ter amor algum. A honestidade é a essência da coragem moral, conforme ficou demonstrado na vida de Jesus. Uma mentira inocente poderia tê-lo salvado da cruz, mas ele não a quis proferir, apesar de sua vida estar em perigo. Os primeiros cristãos deixaram profunda impressão sobre seus contemporâneos, não meramente por causa do amor que exemplificavam («Vede como esses cristãos se amam uns aos outros»), mas muito mais pela integridade de suas vidas (ver Tia. 5:12)». (Macleod, in loc.).
Um criminologista norte-americano asseverou que á fraude é a ofensa criminal mais propagada nos Estados Unidos da América, permeando todos os níveis da sociedade. Ê justo supormos que o mesmo se dá em muitos outros países.
Como a sociedade encara sem seriedade a mentira, o que se vê no grande número de piadas que se centralizam em redor dessa prática. Mas quão séria é essa questão, no N .T ., por refletir uma natureza desonesta e pervertida. Paulo adiciona essa maldade à sua pintada de vícios, conforme se vê no oitavo versículo. Este, tal e qual os outros vícios, pertence à i natureza antiga, ao homem velho e não-remido. Tal vício, tal como aqueles outros, é incompatível com a nossa nova vida em Cristo. No entanto, não é verdade que a maioria das pessoas, dentro e fora da igreja, diz o que pensa ser-lhes mais vantajoso, sem importar se é uma verdade ou uma mentira, de tal modo que o teste real da conduta é o teste «pragmático »? Serei beneficiado, se disser uma mentira? Se a resposta for «sim», então, para essas, pessoas, a mentira é preferível à verdade. «...vos despistes...» No grego temos o verbo «apekduomai», o qual, tal como o verbo do versículo anterior, pode significar «despir uma roupa». Portanto, o quase certo é que Paulo dá prosseguimento à sua metáfora do «despir-se» e do «vestir-se», tendo empregado apenas um sinônimo.
Como Nos Despimos Do Velho Homem ?
1. Quando aplicam os os meios de desenvolvimento e sp iritual, desvencilhamo-nos das vestes velhas e sujas que nos caracterizavam antes da conversão. (Isso é comentado no primeiro versículo deste capítulo).
2. Esse despir-se é realizado por ocasião da conversão (ver João 3:3), e prossegue na santificação (ver I Tes. 4:3). Ambas as coisas fazem parte da obra do Espírito.
3. Isso se cumpre através da nossa união com Cristo, por causa do que assumimos a sua natureza, e assim nos tornamos um «novo homem». (Ver II Cor. 5:17 e suas notas, quanto a esse conceito. Ver também as notas, em Rom. 6:3, sob o título «O batismo espiritual»).
4. O trecho de Efé. 4:22 encerra idêntica declaração, e ali são dadas notas adicionais que .iluminam o tema. O velho homem é representado pelas vestes velhas. Ele é a natureza antiga, não-convertido, egoísta, carnal, dominado por motivos carnais e temporais. Cristo é a «nossa vida» (ver o quarto versículo deste capítulo). Quando isso se toma uma realidade, então nos tornamos novas criaturas, ou seja, temo-nos vestido de novas vestes, metaforicamente falando. (Ver o velho homem crucificado, em Rom. 6:6).
«Torna-se perfeitô no4ommio próprio aquele que não somente se abstém dos prazeres do corpo, mas alegra-se por poder fazê-lo; ao passo que aquele que se abstém mas se entristece com isso, não tem o domínio próprio». (Aristóteles):
A m etáfora do «despojamento» nos leva de volta a todos os vícios mencionados, não aludindo somente à prática da mentira.
O paralelo a este versículo é a passagem de Efé. 4:25, onde se lê: «Por isso, deixando a m e n tira, fale cada um a verdade com o seu próxim o, porque somos membros uns dos outros». Quando mentimos para os irmãos, ferimos o corpo inteiro de Cristo, distorcendo-o e a leijando os seus membros. O «velho homem» é a «veste antiga», que deve ser, posta de lado.
O velho homem nos impulsionava a ações que nos degradavam, incluindo a mentira.
Antes de falares,
Faz tudo passar diante de três portas de ouro:
As portas estreitas são, a primeira: ‘Ë verdade!’
Em seguida: ‘È necessário?’ Em tua.mente
Fornece uma resposta veraz. E a próxima
É a última e mais difícil: ‘É gentil?’
E se tudo chegar, afinal, aos teus lábios,
Depois de ter passado por essas três portas,
Então poderás relatar o caso, sem temeres
Qual seja o resultado de tuas palavras.
(Beth Day).
A mentira é contrária tanto à lei da verdade como à lei do amor. Ë, ao mesmo tempo, injusta e sem gentileza, e tende, mui naturalmente, por destruir a amizade e a boa fé entre os homens.
«A mentira nos torna semelhantes ao diabo, o pai da mentira, sendo uma das características principais da imagem do diabo em nossas almas». (Matthew Henry, in loc., tecendo comentários sobre o trecho de João 8:44).
Referências e idéias, a mentira:
1. A mentira é proibida (ver Lev. 19:11 e Col. 3:9). 2. Ê abominável a Deus (ver Pro. 6:16-19). 3. Ë uma abominação,contra Deus (ver Pro. 12:22). 4. Ë um obstáculo à oração (ver Isa. 59:2,3). 5. É originada pelo diabo (ver João 8:44).
6. Os santos devem repelir à mentira (ver Sal. 119:29).
7. Devem evitar essa maldade (ver Isa. 63:8).
8. Devem orar para serem preservados da mesma (ver Sal. 119:29).
9. Os hipócritas são dados à mentira (ver Osé. 11:12).
10. Os hipócritas causam a mentira (ver Isa. 57:4).
11. Os ímpios mentem desde a infância (ver Sal. 58:3).
12. Os ímpio»amam à mentira (ver Sal. 52:3).
13. Os ímpios buscam a mentira (ver Sal. 4:2).
14. A mentira é uma das características dos apóstatas (ver I I Tes. 2:9 e I Tim. 4:2).
15. A mentira é um vício que exclui dos céus ao indivíduo (ver Apo. 21:27-22:15).
16. O diabo exemplifica a mentira (ver Gên. 3:4).
CHAMPLIN, Russell Norman, O Novo Testamento Interpretado versículo por versículo. Editora Candeias. Vol. 5. pag. 139.
9. A chamada: Não mintais talvez pareça vir como um anticlímax, mas os efeitos sociais de promessas e compromissos indignos são enormes. Possivelmente este desafio pertença à tradição, que é usada para completar a lista no v. 8. A mesma admoestação ocorre em Efésios 4.25.
A exortação parece estar restrita a uma aplicação dentro da comunidade cristã, de modo que sua seriedade recebe uma referência deliberada. A mentira leva a um rompimento da comunhão cristã, porque engendra a suspeita e a desconfiança, e assim destrói a vida em comum no corpo de Cristo (Rm 12.4) mediante a qual somos “membros uns dos outros.”
A razão para o abandono dos maus caminhos agora é fornecida. Uma vez que vos despistes do velho homem com os seus feitos traduz uma frase que começa com um particípio grego apekdusamenoi (“tendo despido”). É complementado por um particípio correspondente no v. 10 (gr. endusamenoi, “tendo vestido”). Todos os comentaristas concordam que há um tema batismal nestes verbos, tirado da atividade de despir-se para o ato do batismo, quando o novo cristão entrava na água, e de vestir-se depois.
A referência em Gálatas 3.27 claramente localiza a experiência como sendo batismal, embora Paulo enfatize igualmente que todos os leitores das suas Epístolas devem saber apreciar significado “interior” do ato exterior (cf. Rm 13.12, 14; cf. Ef 4.24).
O problema postulado por estes particípios aoristos, que denotam um evento passado, é saber se continuam a seqüência das admoestações ou se relembram o batismo como sendo a ocasião quando o crente fez as renúncias da sua vida antiga. No primeiro ponto de vista (declarado por Lohse, pág. 141) Paulo está continuando a linha do seu apelo que começou com a chamada: “Não mintais,” e ressaltando a obrigação que seus leitores devem enfrentar e agir à altura para abrir mão dos hábitos que pertencem à sua velha natureza, despojando 'tudo quanto pertence à sua vida anterior e substituindo-a com um novo modo de viver. Os particípios têm um sentido imperativo, de acordo com o uso rabínico e neotestamentário (veja D. Daube: “Participle and Imperative in I Peter” em E. G. Selwyn: The First Epistle o f St Peter, Londres 1947, págs. 467-88).
O ponto de vista alternativo (compartilhado por Abbott, Masson, C. Maurer em TDNT vi, pág. 644, e defendido especialmente por J. Jervell, Imago Dei, Gõttingen, 1960, pág. 236) deve ser preferido como estando mais de conformidade com o ensino atestado de Paulo. Está chamando os colossenses de volta ao seu batismo, e conclamando-os a lembrar-se do seu efeito dinâmico ao libertá-los do seu antigo modo de vida, como conseqüência da sua união com Cristo pela fé, agora confessada. Passa a conclamá-los, nesta expressão participial, a viver à altura daquela confissão batismal ao ser leal a ela, e a tomar-se na própria realidade — mediante sua renúncia e sua aceitação da sua nova vida, dada a eles enquanto foram ressuscitados com Cristo — aquilo que já foram declaradamente no seu batismo.
Partes anteriores desta carta — para não irmos mais longe no assunto da ética paulina (veja V. P. Furnish: Theology and Ethics in Paul, Nashville, 1968) — confirmam este modo de declarar a intenção de Paulo. Pode referir-se ao passado, à entrada decisiva dos colossenses no reino de Deus, que transformou as suas vidas (1.3) quando compartilharam do ato de Cristo em despir de Si mesmo a tirania dos poderes demoníacos (2.11, 25). Este evento foi seu batismo (2.12, 13, 20) que inaugurou na união com Cristo, o Senhor, a sua posição crista (3.1,3).
Esta interpretação ajuda-nos a apreciar o termo enigmático: velho homem (ou “velho Adão”) e novo homem (ou “novo Adão”). Parece claro que estes não são novos termos de individualidade mas, sim, são expressões corpóreas que denotam uma velha e um nova ordem de existência.
Paulo, portanto, está conclamando seus leitores (como em Rm 6.6-14) a acabar com seu antigo estilo de vida, com seus hábitos, inclinações e alvos, e a viver como aqueles que, no começo da sua nova vida em Cristo, entraram no novo mundo de uma nova humanidade que está viva para Deus. Nem devemos esquecer-nos de que, embora Paulo bem possivelmente esteja utilizando formas tradicionais de expressío (catequética) que eram moeda corrente nas igreja primitivas, haveria relevância especial deste ensino para os homens e as mulheres de Colossos que estavam perplexos no que dizia respeito a diretrizes rivais para o modo de vida dos cristãos, oferecidas em nome dos falsos mestres no seu meio (2.16-23). A resposta de Paulo e seu antídoto é uma declaração simples do senhorio de Cristo e o que significa viver sob aquela regra. Seus leitores (conforme os faz lembrar) eram aqueles que tinham professado lealdade ao Senhor Jesus Cristo na conversão e na renovação (2.13). Que agora ponham em prática aquela profissão, procurando ideais éticos cujo padrão é estabelecido por sua vida no “novo Adão,” o novo segmento da humanidade que obtém sua vida de Cristo Jesus.
Ralph P. Martin. Colossenses. Introdução e Comentário. Editora Vida Nova. pag. 117-118.
fonte www.mauricioberwaldoficial.blogspot.com
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