SEJA ZELOSO
O primeiro tipo de professor desnecessário à igreja
contemporânea é o leigo-desleixado. Por leigo entendo aquele que não tem
formação pedagógica. Nessa categoria temos milhares de professores nas Escolas
Dominicais atuando sem formação pedagógica formal. Eu mesmo iniciei a prática
da educação cristã como professor leigo.
Ao passar pelos corredores da história da educação
brasileira, ou conferir as estatísticas modernas a respeito da formação do
professor, encontrar-se-á o leigo transitando e atuando na educação infantil e
primária. Da reforma pombalina [1] ao final da Década da Educação [2], a
presença do professor leigo é incontestável.
A proliferação de professores sem qualificação
pedagógica é muito frequente nas áreas excluídas e pobres dos estados
brasileiros, principalmente nas zonas rurais das regiões Norte, Nordeste e
Centro-Oeste. As características mais comuns desses esforçados voluntários da
educação são:
a) ensino fundamental incompleto (muitos estudaram
apenas até a 4ª série); e
b) falta de habilitação técnica [3].
Contudo, fizeram e ainda fazem o que podem para
ensinar o pouco que sabem à criança, ao jovem e adulto esquecidos pelo poder
público. Observe ainda, essa realidade social não é diferente da que
encontramos em muitas escolas dominicais no Brasil.
Para atender a demanda e qualificar esses
voluntários, o Ministério da Educação (MEC), em 1999, criou o Programa de
Formação de Professores em Exercício (PROFORMAÇÃO), que, sendo um curso de
Ensino Médio, procurava habilitar os leigos para o magistério na modalidade EaD
– Ensino à Distância. Os professores assim formados estariam aptos para
trabalharem na Educação Infantil, nos quatro primeiros anos do Ensino
Fundamental, e, consequentemente, na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Mesmo
assim é possível questionar a qualidade dessa formação. Essa realidade torna-se
ainda mais complexa quando observada na perspectiva das creches e casas de
acolhimento, mas essa temática está longe dos objetivos aqui propostos. Por
conseguinte, a realidade verificada na sociedade brasileira não é diferente
daquela que encontramos em nossas igrejas, uma vez que a comunidade cristã está
inserida na sociedade e socialmente a reflete.
Retornando à perspectiva eclesiástica, o crescimento
e fortalecimento das igrejas protestantes no Brasil deve-se, acima de tudo, ao
trabalho do leigo – aquele que não foi ordenado às hierarquias eclesiásticas. O
trabalho realizado pelo leigo foi até mesmo reconhecido e defendido pela cúria
católica romana. Entre nós, pentecostais, não é novidade aquilo que outros
estão descobrindo mais recentemente. Mas a comparação é apenas fugidia e
retórica. Ser leigo ou exercer um dos ministérios laicais entre os católicos
não tem o mesmo significado que atribuímos ao exercício do leigo, por exemplo,
na Assembleia de Deus, ou igrejas pentecostais – que cresceram por meio do
ministério dos leigos. O laicado entre os católicos é organizado e dirigido.
Acontece que leigo para a cúria romana é, correndo o risco de uma simplificação
exacerbada, aquele cristão (ele ou ela) que não é ordenado, e, não significa,
como já observamos, e pretendo afirmar acerca dos pentecostais, um sujeito sem
formação ou qualificação para o exercício do ministério, sem compreender sua
vocação e missão profética no mundo.
A essa altura de nosso artigo, posso correr o risco
de classificar alguns tipos de laicado:
a) leigo, em sentido próprio, isto é, não ordenado;
b) leigo-prático, sem qualificação ou formação, mas
que exerce a função no lugar de um qualificado;
c) leigo-desleixado, o negligente, preguiçoso,
descuidado.
Assim, não vejo qualquer problema em ser leigo em
sentido próprio na igreja. Eu mesmo, repito, iniciei o ministério de ensino
como leigo durante muitos anos (sem ser ordenado ao ministério e sem
qualificação pedagógica formal). Contudo, existe uma diferença entre o leigo
das categorias “a” e “b” com o da categoria “c”, o desleixado.
O primeiro não foi ordenado ao ministério, mas,
potencialmente, é um obreiro. Ele possui ou está em processo de formação e até
mesmo de ordenamento, e mesmo que não seja assim, ele é qualificado para o
exercício docente.
O segundo exerce uma função, no caso a docência,
mesmo sem estar formalmente qualificado. Ele é, como afirma Martins, “professor
prático experimentado-leigo na docência”[4]. Essa classe de professor não
possui a teoria que deve embalar a formação, mas desenvolveu uma prática que o
“qualifica”, pela experiência e conhecimento, ao exercício magisterial, mesmo
que limitado. Embora o leigo-prático não tenha a formação técnica ou acadêmica,
ele se preocupa com sua formação, fazendo aqui e ali, cursos de pequena duração
para o exercício do magistério eclesiástico. É fácil identificá-lo:
(1) sua presença é certa em seminários e congressos
de educação para capacitação e formação de professores da ED;
(2) sempre está presente nas reuniões de
professores;
(3) busca capacitação adequada;
(3) costuma variar os métodos em sala de aula,
conforme a necessidade de seus alunos;
(4) busca formação teológica, seja Básico, seja
Médio, ou Bacharel em Teologia;
(5) reconhece suas limitações e, caso não tenha
completado os estudos, empenha-se em concluí-los para exercer o ministério mais
eficientemente;
(6) não se aparta dos livros de teologia, didática e
formação geral;
(7) tem em grande estima aqueles que, como ele, se
dedicam ao munos docendi (ministério do ensino);
(8) se esforça para aprender e melhorar como pessoa
cada vez mais.
Todavia, o terceiro, o leigo-desleixado, diferente
dos anteriores, não tem qualquer interesse em sua própria formação. Ele é fácil
de identificar, porque, como o próprio termo designa, é indolente, preguiçoso,
relapso e não tem qualquer interesse em ser um docente qualificado. Está mais
interessado no título e na ocupação, que lhe dão status na comunidade, do que
preocupado em exercer o magistério cristão com eficiência. Ele:
(1) falta constantemente aos seminários para
professores;
(2) dificilmente aparece nas reuniões de
professores;
(3) enfada aos alunos pela falta de método e
didática;
(4) não tem qualquer interesse em buscar formação
teológica, na verdade, ele é contra a teologia;
(5) jamais reconhece suas limitações e não tem
qualquer interesse em estudar ou concluir os estudos;
(6) não lê qualquer manual didático, com exceção da
Bíblia a qual não entende apropriadamente;
(7) critica os professores que se dedicam ao
magistério cristão porque entende que o dom é suficiente para o desempenho do
munus docendi;
(8) é desleixado com sua própria formação.
É possível restaurar o sabor do sal depois de
insosso?, pergunta o Mestre dos mestres. Essa última classe de professor não
está qualificada para enfrentar os modernos desafios do ofício docente. A
igreja contemporânea, preocupada com os desafios modernos, externos e internos,
não deve tolerar em suas fileiras magisteriais professores que são entraves ao
crescimento do Corpo de Cristo.
Ora, se o motor do carro entra em pane, o motorista
leva o veículo ao farmacêutico ou açougueiro? É claro que conduz para o
mecânico, aquele que é especializado. Suponhamos que uma pessoa repentinamente
sofra do coração e, ao chegar na sala cirúrgica, vê um indivíduo com um macacão
cinza, todo sujo de graxa, com mãos grandes e grossas, abrindo uma caixa de
ferramenta e retirando uma chave de grife, martelo, alicate, furadeira... O
paciente atônito, com a voz trêmula e olhos esbugalhados, pergunta:
- o senhor é o cirurgião?
Ele, sem confiança, responde:
- É que o cirurgião não está, e o hospital imaginou
que pelo fato de eu consertar motor de carros estou apto para fazer cirurgias
no coração.
Se o paciente não morrer de susto, certamente
morrerá na cirurgia. Se costumamos levar nossos aparelhos aos profissionais
para que possam consertá-los; ou temos o hábito de consultarmos especialistas,
por qual motivo os pais devem levar seus filhos todos os domingos para
assistirem aulas com professores dominicais desqualificados? Os objetos valem
mais do que as pessoas? O ministério de ensino é tão vulgar a ponto de qualquer
um poder exercê-lo?
fonte CPAD
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